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EM NOME DO PAPA
Seguidores das jornadas criadas por João Paulo 2º defendem novo discurso para igreja manter fiéis
"Papaboys" brasileiros pedem igreja mais moderna
ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA
"Gosto de beber uma cervejinha, falo palavrão e não vou deixar de ter amizade com alguém
por ser gay, assim como acredito
que o uso da camisinha é importante para prevenir doenças e até
mesmo a gravidez", diz Érika Augusto da Silva, 20, cabelos avermelhados, quatro furos na orelha.
O depoimento não faria diferença se tivesse sido colhido em
um colégio ou numa rave. Mas o
ambiente de Érika é outro. Única
católica praticante da família, neta
de evangélicos, ela freqüenta um
grupo de jovens católicos há quatro anos e vai à igreja pelo menos
duas vezes por semana. Em agosto, pretende realizar um desejo
antigo: participar de sua primeira
Jornada Mundial da Juventude.
Os encontros que ficaram conhecidos como "Woodstocks católicos" foram a menina dos olhos
de João Paulo 2º. Criadas pelo sumo pontífice em 1986, as marchas
religiosas chegaram a reunir 4 milhões de jovens de todo o mundo
em 95, nas Filipinas. Na penúltima semana, a juventude militante
se pôs em vigília permanente na
praça São Pedro para acompanhar a agonia final do papa. Sem
nenhum acanho, apresentaram-se como papaboys.
No caso dos papaboys brasileiros, eles recusam o rótulo inglês e
nem sempre concordam com as
opiniões de Karol Wojtyla. "Fiquei triste com a morte dele, claro. Mas acho que suas idéias estavam um pouco distantes da realidade que vivemos", diz Érika.
Mas o que faz um jovem ser cativado por preceitos retrógrados
justamente na fase em que costuma romper com o estabelecido?
"Os jovens passaram a adotá-lo
como uma espécie de porto seguro", diz a antropóloga Regina Novaes, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), especialista em religião e juventude.
De pulseira negra no braço esquerdo em sinal de luto pela morte do santo padre, o administrador de empresas Herbert Kawamura, 32, é seguidor do papa desde os 18. Filho de católicos, se tornou militante da Pastoral da Juventude aos 25 e foi um dos jovens brasileiros na Jornada Mundial da Juventude em Roma, em
2002. Ele procurou o encontro para se tornar seminarista, mas acabou se apaixonando por uma garota de Mogi das Cruzes.
A relação durou três meses. Se o
namoro não perdurou, serviu para Kawamura enterrar de vez a
idéia de se ordenar. Hoje, a cada
15 dias, ele se reúne com jovens de
15 a 25 anos na paróquia São Paulo da Cruz, em Pinheiros, para
discutir temas caros à igreja e
também aos seus pares, como sexualidade e fé. "Acho que João
Paulo 2º não permitiu abertura
para a igreja dialogar questões
morais importantes. Ele deveria
ter sido mais flexível", diz.
Mesmo perdendo fiéis, o Brasil
continua sendo o maior país católico do mundo. Pelos números do
Censo 2000, os católicos representam 73,4% da população brasileira (ou 125,5 milhões de pessoas).
Em 1991, eles correspondiam a
83,3%. A igreja ainda não sabe
medir com exatidão qual o efeito
das JMJ sobre o rebanho juvenil.
"Nossa esperança é que o novo
papa abra o diálogo e permita que
os jovens possam discutir temas
fundamentais do seu cotidiano",
diz a publicitária Patrícia Mustafá
Coppio, 30, ligada à Pastoral da
Juventude desde os 15 anos.
Seja qual for o novo papa, entre
os 800 mil jovens que a organização da Jornada Mundial de 2005
pretende reunir em agosto, na
Alemanha, haverá quem busque
outros interesses que passam longe dos apelos religiosos. Segundo
Luciano de Azevedo Farias Ferreira, 30, que coordena a Pastoral
da Juventude na Arquidiocese de
São Paulo, muitos jovens acabam
indo para as jornadas atrás de turismo. "Não é para todos que o
ápice nas jornadas são os encontros com o papa", diz.
Para a antropóloga Regina Novaes, parte do fascínio tem eco na
carência da juventude atual. "Esse
papa acolhia, perdoava e dizia
acreditar no jovem." Resta saber
em quem eles vão acreditar agora.
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