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TRANSPORTE
Área equivale a 6,5 vezes o tamanho do município de São Paulo; objetivo era repassá-la ao governo para pagar dívidas
Empresário comprou terra grilada no AM
CHICO DE GOIS
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL
O empresário de ônibus Baltazar José de Souza, investigado pela Polícia Federal sob suspeita de
enviar ilegalmente US$ 12,5 milhões ao exterior entre 1996 e 1997,
adquiriu 970 mil hectares de terras registradas irregularmente no
Amazonas para tentar repassá-las
ao governo federal e amortizar dívidas com a Previdência.
Essa área corresponde a mais de
seis vezes a do município de São
Paulo. Os registros dela em cartório foram anulados pela Justiça
em 2001 por serem considerados
irregulares e alvos de grileiros
-pessoas que se apossam de terras alheias mediante falsas escrituras de propriedade.
Segundo a Promotoria de Justiça da Cidadania, Souza deve mais
de R$ 259,5 milhões ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
A revelação de que a terra foi
comprada para ser repassada à
Previdência é de Jair Dégio da
Cruz, gerente contábil do empresário de ônibus. Mas ele diz que
Souza não sabia que a terra adquirida em 1998 estava irregular.
Segundo Cruz, Souza gastou R$
100 mil -valor insuficiente para a
compra de um ônibus zero-quilômetro- por um lote de 329 mil
hectares (cerca de duas vezes a
área da capital paulista).
A idéia era repassar essa terra ao
INSS por valores bem superiores
aos de compra. Ela foi ofertada
por Souza para ser usada na reforma agrária, mas a transação não
foi aceita e ajudou a desencadear
uma investigação do Incra (Instituto Nacional de Colonização e
Reforma Agrária) para identificar
a grilagem de áreas no Amazonas.
Municípios
Os registros de propriedade de
terra feitos por Souza e anulados
pela Justiça, conforme documentos obtidos pela Folha, estão nos
municípios de Canutama e de Tapauá, no sul do Estado.
Em Canutama, cuja área total é
de 2,4 milhões de hectares, dos
quais 95% pertencem à União, a
Justiça anulou registros irregulares de 10,3 milhões de hectares
-ou seja, quatro vezes a área
existente. Do montante, 406 mil
hectares estavam em nome de 18
empresas ligadas a Souza.
Em Tapauá, cuja área real é de
8,9 milhões de hectares, 7,8 milhões de hectares de terra tiveram
suas escrituras canceladas pela
Justiça -sendo 562 mil hectares
em nome de Souza.
"Essas áreas não têm origem,
não existem. Houve fraude", diz
Euci Simões, juiz da Corregedoria
Geral de Justiça do Amazonas.
O caso foi investigado no Incra e
na CPI da Grilagem instalada na
Câmara dos Deputados em 2001.
Foi descoberta a existência de um
esquema para falsificar as escrituras de terra visando a lavagem de
dinheiro (para justificar uma determinada movimentação financeira), a realização de transações
imobiliárias e a obtenção de empréstimos públicos e privados.
Cruz diz que Souza nunca soube
da grilagem das terras e que, se
elas têm escrituras falsas, ele foi
enganado, já que pagou por elas e
as obteve nos cartórios da região.
Essa situação, porém, é considerada inusitada por técnicos do Incra e da Corregedoria Geral de
Justiça do Amazonas. Para eles,
dificilmente alguém compra 970
mil hectares de terra, cerca de
6.062 parques Ibirapuera, sem
conferir a documentação.
"Principalmente por envolver
empresas, era de se esperar um
mínimo de cuidado", diz Simões.
Os registros de terra de Souza
em Tapauá foram feitos em 1998,
segundo um relatório sobre terras
griladas elaborado pela desembargadora Marinildes Costeira de
Mendonça Lima e anexado ao relatório final da CPI da Grilagem.
A PF identificou as remessas de
dinheiro de duas viações do empresário -a Januária e a Campo
Limpo- ao exterior em 1996 e
1997. O relatório com as transações entre 1998 e 1999 não foi finalizado. As duas empresas citadas
também estão na lista das que registraram as terras no Amazonas.
Elas participaram da aquisição
de um imóvel rural denominado
Pajeú de Flores, em Canutama,
onde a Corregedoria Geral de Justiça identificou 79 registros irregulares. A Campo Limpo tinha
2.086 hectares da propriedade. A
Januária, 788 hectares. Todos os
registros foram cancelados em 9
de maio de 2001.
Na decisão que determinou a
anulação, a desembargadora Lima diz que eles "não têm origem
em título legítimo" ou "[estão]
vinculados a títulos nulos de pleno direito".
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