São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2008

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Câmara derruba projeto que legaliza aborto

Consideradas inconstitucionais por comissão, duas propostas serão arquivadas, exceto se houver recurso assinado por 52 deputados

Pelos projetos, deixaria de ser crime aborto feito em gestações de até 90 dias; hospitais públicos teriam de realizar o procedimento

Ricardo Marques/Folha Imagem
O deputado Carlos Willian protesta em reunião que discutiu aborto

JOHANNA NUBLAT
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Dois projetos que descriminalizam o aborto foram rejeitados ontem pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados, que os considerou inconstitucionais.
Pelas propostas, deixaria de ser crime o aborto feito em gestações de até 90 dias e os hospitais públicos ficariam obrigados a realizar o procedimento.
Agora, os projetos serão arquivados, a não ser que um recurso assinado por um décimo dos deputados (52) peça o encaminhamento das propostas ao plenário -o deputado José Genoino (PT-SP) deve encabeçar uma coleta de assinaturas.
Em meio a um debate acalorado, apenas quatro dos deputados presentes votaram favoráveis aos projetos: Regis de Oliveira (PSC-SP), José Eduardo Cardozo (PT-SP), Eduardo Valverde (PT-RO) e Genoino. Os demais seguiram o voto do relator, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pela inconstitucionalidade dos projetos.
"Não se pode admitir normas que transgridam o direito à vida para salvaguardar bens jurídicos de equivalência inferior, como, por exemplo, a liberdade e a autonomia da mulher", diz o voto do relator. Dos 61 deputados da CCJ, cerca de 40 estavam na sessão de ontem, mas a presença não foi registrada.
Durante quase três horas, os projetos 1.135, de 1991, e 176, de 1995, foram objeto de discursos pró e contra que misturaram direito e convicções religiosas.
O momento mais polêmico foi quando o deputado evangélico Carlos Willian (PTC-MG) tirou de uma caixa duas bonecas e um caixão de criança e gritou para a platéia: "Vocês querem matar essas crianças?".
Antes da cena, Willian comparou o abortamento com recentes crimes ocorridos contra crianças no país -Isabella Nardoni, jogada da janela, e João Roberto Amorim, baleado no domingo no Rio, em crime atribuído a policiais militares.
Os dois projetos tratam da descriminalização do aborto e tramitam juntos. O 1.135, de autoria dos ex-deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, retira apenas o artigo 124 do código, que trata da criminalização da mulher que pratica o aborto ou deixa que nela o pratiquem.
A proposta não mexe nos outros artigos, que dizem que pratica crime quem faz o aborto. Esses artigos, no entanto, são informalmente suprimidos pelo outro projeto, de autoria do deputado José Genoino (PT-SP). Por essa proposta, o aborto é legal quando feito na gestação de até 90 dias.
"Aquele que teme a Deus e ama ao próximo não tem que se limitar a um debate jurídico." A frase, do deputado Jorginho Maluly (DEM-SP), foi uma das que deram o tom religioso.
"A Constituição é nossa crença, ela é objetiva", disse o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), ao defender a constitucionalidade dos projetos.
O debate foi encerrado sob protesto de 14 mulheres, favoráveis aos projetos, que amarraram lenços roxos na boca.
A maior parte das pessoas presentes, no entanto, era contrária às proposições. Havia quem rezasse o terço e distribuísse revistas católicas.
Além desses dois projetos, há pelo menos outros 15 sobre o tema em tramitação no Congresso Nacional.


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