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REVISTA
Matemáticos, esotéricos e donos de casas lotéricas estão
faturando com o sonho dos brasileiros de virar milionários
A turma do "já ganhei"
Mariana Sgarioni
da Revista
"Jalucrei" -assim mesmo, escrito tudo junto e sem acento-,
nome de uma rede de lotéricas de
São Paulo, poderia batizar também um grupo de profissionais
que faturou alto nas últimas semanas, com o prêmio acumulado
da Mega Sena.
São matemáticos, esotéricos, camelôs e donos de casas lotéricas,
que, ao contrário dos 50 milhões
de brasileiros que fizeram sua "fezinha", torcem para que ninguém
seja premiado de novo.
"Em 215 anos de história das loterias no Brasil, esta semana foi a
de maior arrecadação", diz Antonio Speranzoni Junior, um dos
donos da Jalucrei. Ele estima que
sejam feitos até hoje 400 mil jogos,
em suas seis lojas -o dobro da
média normal. Seu faturamento
será, no mínimo, de R$ 400 mil.
Algumas apostas estão batendo
recordes. "Um empresário apostou R$ 10 mil." Nas últimas dez
semanas, Junior contabilizou
mais de um milhão de apostas.
José Petrizzo, dono da lotérica
Alfa, na Vila Maria (região norte
de SP), conta que um grupo de 20
empresários confiou a seus computadores uma aposta de R$ 40
mil.
Cada um apostou R$ 2.000. "Pelas combinações que fizemos, já
garantimos a quadra e, se sair o
número 10, levamos a quina",
acredita o empresário Jaconias
Dantas de Andrade. Líder do grupo, ele já chegou a ganhar R$ 9 mil
em um de seus "bolões".
"Se acumular de novo, será ótimo. Funciona assim: o sujeito joga, o resultado sai. Ele não ganha
nada e desanima. Agora, se acumular de novo, ele quer jogar,
pois acha que pode ser sua grande
chance", explica Petrizzo, que reforçou a segurança da lotérica nas
últimas semanas. A casa, que normalmente recebe 300 clientes por
dia, chegou a ter movimento três
vezes maior desde segunda.
Apesar do aumento no faturamento, os dois donos de casas lotéricas dizem que essa atividade
"não deixa ninguém milionário".
"Ficamos apenas com 9% do total arrecadado. É um negócio estável, com picos de melhora em
épocas de acumuladas", afirma
Junior, que também é diretor da
Fenal (Federação Nacional dos
Empresários Lotéricos). Para não
ter prejuízo fora da acumulada,
Petrizzo oferece serviços como resultados via fax e e-mail.
A indústria da aposta é uma das
poucas que não foram afetadas
pela crise. O faturamento global
de loterias vem crescendo 20% ao
ano desde 1996, segundo dados da
Fenal e do Sindicato das Casas Lotéricas de São Paulo.
Para abrir uma casa lotérica é
preciso uma concessão, cedida
pela Caixa Econômica Federal
mediante licitação. Em São Paulo,
há cerca de oito candidatos concorrendo para cada loja oferecida
pela CEF.
"Os candidatos devem apresentar um plano de marketing e de
faturamento", diz José Maria Nardeli Pinto, gerente da área de loterias da CEF.
A CEF fica com 3% de comissão
do total arrecadado pela loteria, e
o governo federal, com outros
41%, usados em crédito educativo, previdência e fundo penitenciário, entre outros programas.
Afogando em números
Na tentativa de aumentar as
chances de acertar os seis números sorteados -1 em 50 milhões
para apostas de seis dezenas-,
apostadores estão apelando para
o além e enchendo os bolsos dos
esotéricos. "Nessa época, o retorno pra gente é muito bom", diz
Roberto Machado, presidente-fundador da Abran (Associação
Brasileira de Numerologia). Ele
explica que o trabalho da associação consiste em fazer um mapa
numerológico natal da pessoa,
que mostra a "área de potencial"
que cada um tem. "Quando as
pessoas desenvolverem suas
potencialidades,
terão facilidade
para ganhar dinheiro, obter
conquistas materiais. Isso pode vir por meio
do trabalho, por
algum investimento, sorteio
ou jogos." Para
desenvolver as
tais potencialidades das pessoas, Machado
cobra R$ 120
por mapa.
O número de
clientes que procura a associação
de numerólogos subiu de 150 por
semana para 500, nas últimas semanas. Desses, cerca de 60%são
atendidos por Machado. Seu faturamento em uma semana de Mega Sena acumulada chega, portanto, a R$ 36 mil.
O empresário Jaconias, organizador do "bolão" da Vila Maria, é
um dos que pedem ajuda aos astros. "Eu não aposto sem consultar antes uma pessoa da minha
confiança, que joga búzios para
apontar a sorte e os meus números favoritos do dia.".
Do lado da ciência, o engenheiro civil Oswald de Souza, 54, não
consegue prever resultados, mas
indica quais as chances de o prêmio sair e quantas pessoas provavelmente se tornarão milionárias.
Oswald conta que, no começo
da década de 70, se divertia acertando quantos ganhadores sairiam na loteria esportiva da semana. Apostava com amigos e, como
sempre acertava, ganhava "umas
cervejas".
"Em novembro de 1972, fiz a
primeira previsão, para a TV Rio,
de que sairiam um ou dois ganhadores da loteria esportiva." Durante os 19 anos que passou no
programa "Fantástico", o engenheiro fez mais de mil cálculos,
obtendo mais de 90% de acerto.
Hoje é colunista em 19 jornais,
sempre escrevendo sobre loterias.
Foi ele quem criou o sorteio da
Quina da loto para a CEF, há 19
anos, que já teve mais de mil concursos. O engenheiro hoje é dono
da única firma brasileira especializada em projetos de jogos, sorteios e loterias, a Oswald de Souza
Consultoria Ltda. A empresa elabora planos de sorteios para clientes como a Coca-Cola e a rede
Ponto Frio/Bonzão, além de projetos de jogos, como para o "Domingão do Faustão".
Apesar de já ter acertado 15 vezes na loteria esportiva, sua especialidade, Oswald nega que tenha
ficado rico. "Meu ganha-pão vem
da minha firma, que fatura entre
R$ 10 mil e R$ 15 mil por mês."
Para o sorteio de hoje, o matemático afirma que há apenas 3%
de chance de que a Mega Sena
acumule de novo.
Bicos
O mercado informal também
está tirando proveito da situação.
É o caso da vendedora ambulante
Rosângela Aparecida Correia
Malvão, 36, que trabalha há 15
anos nas ruas vendendo bilhetes
de loteria. Em semanas normais,
ela fatura em torno de R$ 100.
Nesta semana, Rosângela espera
faturar pelo menos R$ 300.
Pelas vias cibernéticas, o engenheiro mineiro Ronaldo Costa,
38, deu um jeito de lucrar especulando o resultado das lotecas. Ele
criou um site na Internet em que
oferece dois programas de loterias: um faz combinações e gerencia as apostas; outro mostra estatísticas de outras loterias.
Cada programa custa R$ 100 e,
desde 1998, ele conseguiu vender
40 unidades -dois só nesta semana. "Fiz o programa pra mim,
mas, quando vi, tinha um monte
de gente interessada."
Engenheiro mecânico de uma
empresa mineira, ele diz que faturar com a loteria é apenas um
hobby. "Mas se o negócio der certo, não descarto a possibilidade de
me dedicar só aos programas de
loteria", diz.
Quem não for premiado hoje à
noite sabe, pelo menos, para onde
foi o dinheiro da aposta. Pode ser
um pequeno consolo...
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