São Paulo, terça-feira, 10 de outubro de 2006

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VÔO 1907/INDENIZAÇÃO

Advogado procura parente até em enterro

Profissionais chegaram a ficar hospedados no mesmo hotel de familiares e a colocar currículos por baixo da porta dos quartos

Indenizações pagas em caso de mortes em acidentes aéreos podem ultrapassar a casa dos US$ 2 milhões, ou R$ 4,4 milhões

LETÍCIA SANDER
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

LAURA CAPRIGLIONE DA REPORTAGEM LOCAL

A professora Luciana Siqueira, irmã de Plínio Siqueira, presidente da Bombardier de Campinas, uma das vítimas do acidente com o Boeing da Gol, estava enterrando o irmão no cemitério de Parque Flamboyant por volta das 12h30 do último sábado, quando foi abordada por um advogado, oferecendo serviços. "O advogado era de São Paulo. Ele disse que era amigo, mas ficou claro que ele estava ali como profissional. Ele até nos sugeriu que citássemos o nome dele em entrevistas à imprensa. Isso nos chateou demais", disse Luciana.
De olho nas polpudas indenizações que se pagam em casos de acidentes aéreos (que podem ultrapassar a casa dos US$ 2 milhões, ou R$ 4,4 milhões), escritórios de advocacia têm usado métodos agressivos para conquistar clientes entre os familiares dos 154 mortos do vôo 1907. Parentes de vítimas que foram alojados pela Gol em três hotéis de Brasília disseram que representantes de escritórios se hospedaram nos mesmos hotéis a fim de se aproximar de seus potenciais clientes.
Entre os expedientes para estabelecer contato, um dos mais freqüentes foi o da "panfletagem". Funcionou assim: durante a noite, quando percebiam a cessação de movimento nos quartos, esses advogados enfiavam cartões de visitas e até currículos embaixo das portas dos apartamentos que sabiam ocupados por parentes de vítimas. Uma família conta ter recebido mais de 20 desses "ataques".
Outro método foi o da abordagem direta. "A gente estava em um estado de aflição enorme para encontrar as nossas vítimas e esses advogados ficavam rondando o saguão do hotel, pedindo para fazer reunião. Eles deixaram muitos familiares constrangidos. Achei até que podia dar briga", disse a parente de uma vítima.

Todas as armas
Segundo Leonardo Amarante, advogado que representa os familiares de André Fontoura, morto aos 31 anos no acidente, "é tão compreensível o assédio dos advogados quanto é compreensível que os parentes exijam respeito à sua sensibilidade, ao seu luto".
Amarante, que se apresenta com a frase "onde há uma tragédia eu estou", conta entre os clientes de seu escritório com um grupo de 300 hemofílicos do Rio de Janeiro contaminados com o vírus HIV por um fator sangüíneo importado, ex-moradores do Palace 2, vítimas do Penha Shopping e do Bateau Mouche, todos casos de repercussão pelo grande número de pessoas atingidas.
Ele está em Brasília para acompanhar dois advogados americanos do escritório Lieff Cabraser Heinann & Bernstein, que vieram se oferecer para defender os direitos dos familiares diante dos tribunais americanos, onde "estão indenizações muito mais vultosas". As aspas são da advogada Lexi Hazam, sócia do escritório e desde ontem em Brasília.
Hoje, deve chegar outro sócio, Robert Lieff, além do perito em colisões aéreas, o suíço Hans-Peter Graf.
Segundo Amarante, que hoje pela manhã reúne-se com cinco famílias, o objetivo das visitas dos estrangeiros "é, antes de mais nada, mostrar aos parentes das vítimas todas as armas de que dispomos para defender seus interesses".


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