São Paulo, quinta-feira, 10 de novembro de 2011

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PASQUALE CIPRO NETO

Conversa (?!) com um/a teleatendente


Tudo isso resulta de uma imensa desfaçatez, que não é exclusividade dos/das teleatendentes ou das empresas


No fim do mês passado, recebi a consueta cobrança do serviço de TV a cabo. Como discordei do valor, liguei para a empresa. O/A teleatendente tentou me convencer de que... Bem, o fato é que eu insisti em que o tal pacto não fora pactuado. Diante da minha renitência, o/a teleatendente me disse que, em no máximo cinco dias, eu receberia um telefonema de alguém do departamento comercial para tratar da pendência.
Passaram-se mais de cinco dias e nada, até que no dia do vencimento (1/11) resolvi telefonar novamente para a gloriosíssima empresa. Depois de alguma espera, fui atendido por um/a teleatendente, que me disse que o tal telefonema não foi feito porque meu caso foi analisado, e, como minha discordância era infundada, a questão tinha sido encerrada.
Aí começou a batalha verbal. Perguntei ao/à teleatendente se é essa a ética da empresa, isto é, se a promessa de um telefonema se anula automaticamente com a (insuspeitíssima) constatação da prestadora de que o cliente não tem razão. O/A teleatendente não respondeu ao meu questionamento e fez o que 101% deles/as fazem: repetiu o que já dissera.
Como sou chato, megachato, disse ao/à teleatendente que dispensava a repetição do blábláblá e que queria uma resposta à minha pergunta. O que ouvi? A repetição do blábláblá (algo parecido com "Como nós constatamos que a sua queixa é infundada, vimos que não seria necessário telefonar").
Se o que acabo de relatar fosse retrato de um caso excepcional, decerto eu não ocuparia este espaço com essa questão. O fato é que o que relatei reflete a regra, e não a exceção, e disso se podem tirar algumas conclusões. Bem, antes de passar a essas conclusões, vou avisando aos que por acaso julguem que o assunto está fora da minha alçada ("O senhor tem de escrever sobre a língua!") que é da minha alçada, sim, analisar o que está por trás dos discursos, das respostas, das leituras que se fazem de certas situações etc. Em última análise, tudo isso diz respeito à compreensão e à interpretação dos textos.
A primeira conclusão é que esse/a teleatendente faz parte de um numeroso exército de pessoas que saem das nossas escolas, públicas e privadas, incapazes de preparar seres humanos habilitados a raciocinar logicamente, a entender as entrelinhas etc. Não nos esqueçamos da parcela de culpa desses seres humanos, que, muitas vezes, preferem atividades que em nada lhes aumentam ou desenvolvem a capacidade de pensar.
A segunda conclusão é que esse comportamento dos/das teleatendentes é parte integrante da pilantragem das empresas, que embutem na relação desses/dessas invisíveis teleatendentes com os clientes a dificultação ou impossibilidade da solução dos problemas. Aí entra em cena o poder público do país, que, absolutamente alienado, não age como deveria agir (lembra-se do episódio com o ex-ministro Tarso Genro, que só agiu depois que sentiu na pele a dificuldade para resolver um problema com uma operadora de telefonia?).
Por fim, conclui-se que tudo isso resulta de uma imensa desfaçatez, que não é exclusividade dos/das teleatendentes ou das empresas. Sabe aquilo que você combinou com alguém e (unilateralmente) descombinou, sentiu-se no direito de descombinar e pronto, sem nem ao menos aceitar uma reprimenda por essa atitude? Se você se enquadra nesse perfil, não reclame quando passar horas com um/a teleatendente para não resolver coisa alguma. Você merece. É isso.


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