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GILBERTO DIMENSTEIN
Dia Internacional da "Popozuda"
Na semana em que se comemorou o Dia Internacional da Mulher, a notícia sobre a
condição feminina que mais chamou a atenção, no Brasil, foi produzida pelos bailes funk.
Assistentes sociais da Secretaria
Municipal da Saúde, no Rio, relataram, que, em áreas reservadas
nos bailes, seria praticado sexo
grupal misturado à dança.
Na chamada "dança das cadeiras", os homens, sentados, são rodeados por meninas. Quando a
música pára, elas se sentam no
colo de quem está à sua frente. O
som volta a funcionar, e a roda
continua até a escolha de um novo parceiro. Para que o jogo erótico funcione, as adolescentes devem estar de saias e sem calcinhas.
O alerta foi disparado quando
adolescentes grávidas contaram
às assistentes sociais que engravidaram na "dança das cadeiras";
uma das grávidas era portadora
do vírus HIV.
Não se tem ainda idéia, segundo autoridades da Secretaria da
Saúde, da extensão da "brincadeira" -a radicalização de uma
dança em que se cruzam o erotismo e a concepção da mulher como objeto.
A extensão da moda funk carioca, porém, dá uma medida cultural da visão que ainda se tem da
mulher, convertida em "popozuda".
É errado, porém, afirmar que a
"popozuda" revela um quadro
geral de discriminação contra a
mulher e de desrespeito para com
a imagem feminina. A "dança
das cadeiras" misturou-se a estudos e estatísticas, divulgados na
semana passada, exibindo a peculiar situação da mulher no Brasil: se existe, de um lado, o culto
ao traseiro, ultrapassando o limite do mau gosto, o cérebro feminino é, de outro, cada vez mais disputado.
Na "dança das cadeiras", desta
vez nas universidades, apenas 9%
dos brasileiros com 21 anos de
idade conseguem concluir uma
faculdade. Para atravessar essa
peneira, a maioria deles não teve
de trabalhar enquanto estudava,
frequentou escolas privadas na
adolescência, obteve noções básicas de informática, aprendeu inglês -e nasceu mulher.
Quem nasce mulher tem mais
chances de ganhar um diploma
de ensino superior sem nunca ter
repetido o ano. Na prática, significa entrar na reduzida lista dos
candidatos naturais aos melhores
empregos.
De acordo com as estatísticas do
Ministério da Educação, dos jovens que completam 21 anos e terminam um curso universitário,
7% são homens e 11%, mulheres.
Se considerada a tendência nos
níveis fundamental e médio de
ensino, a diferença só tende a
alargar-se.
Transformadas em sexo forte
na era do conhecimento, as mulheres estão na dianteira de um
dos mais notáveis movimentos
sociais da sociedade brasileira: a
popularização do sonho de ingresso na faculdade, acalentado
mesmo por quem vive em periferias e até em favelas.
Na batalha contra a discriminação, a mulher avança no mercado
de trabalho, chega aos altos postos e, aos poucos, vai reduzindo a
disparidade salarial com os homens.
O aumento da escolaridade do
brasileiro em geral e do poder das
mulheres está alterando profundamente a feição social do país e
gera consequências que vão do
perfil do consumidor ao do leitor,
passando pelo do eleitor.
No painel singular da condição
feminina, a exploração do corpo
da mulher exibe proporções desconhecidas -mesmo para uma
nação explicitamente sensual como o Brasil.
Impossível andar 50 metros em
qualquer rua sem deixar de ver
uma "popozuda" vendendo alguma coisa. Os níveis de erotização
nas emissoras de televisão, mesmo em horários impróprios, também se disseminaram até os limites da total banalização. O funk
só potencializa à baixaria extrema essa exploração.
Vende-se, por todos os lados, sexo. Mas -e aí um dos sinais inequívocos do descaso- pouco se
ajuda na prevenção da gravidez.
Por isso, se o número de formandas nas faculdades é o melhor indicador do progresso da
mulher, as estatísticas sobre gravidez precoce, que gera um milhão de seres por ano, são o retrato do desrespeito.
É como se milhares de adolescentes diariamente fossem submetidas à "dança das cadeiras".
PS -Já começa a acontecer no
Brasil uma boa notícia comum
nos Estados Unidos. Como a mulher costuma ser mais preocupada com a educação dos filhos, a
crescente influência feminina nas
empresas está provocando a flexibilização de horários para diminuir a distância entre trabalho e
família.
Em empresas brasileiras, já
existem executivas que trabalham em casa, de onde controlam
suas equipes -graças à combinação de feminismo e novas tecnologias de comunicação.
E-mail - gdimen@uol.com.br
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