São Paulo, sábado, 11 de março de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VIOLÊNCIA

Tiroteios entre militares e traficantes se intensificam no morro da Providência; revolta de moradores cresce

Bebê é ferido em casa durante ação militar

Severino Silva/Agência O Dia
Assustadas, moradoras passam por soldado que participa de operação no morro da Providência em busca de armamento roubado


DA SUCURSAL DO RIO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Uma criança de apenas 26 dias e outras três pessoas ficaram feridas no morro da Providência (zona portuária do Rio), que enfrentou na madrugada e manhã de ontem o mais intenso tiroteio entre traficantes e integrantes do Exército em uma semana de operação militar em favelas para recuperar armas roubadas de um quartel, no último dia 3.
Os confrontos começaram por volta das 5h e duraram quase cinco horas, trazendo pânico a moradores, que fizeram novo protesto em frente ao Comando Militar do Leste, para pedir a saída das tropas. Foi o quarto dia consecutivo de embates na Providência.
Alguns moradores chegaram a discutir com militares para reclamar da truculência e por pouco não entraram em confronto com eles. Para apartar a confusão, um integrante do Exército apontou a arma e disparou tiros para o alto, causando grande correria.
A bebê Leílza e sua mãe, Ivaneide dos Santos, 29, estavam em casa no alto do morro quando estilhaços de bala de fuzil as atingiram. A criança ficou ferida no rosto e nas pernas, e a mãe, no braço, peito e rosto. Elas passam bem. Um homem também foi ferido.
Ivaneide disse que passou momentos de desespero com os tiros. "Ouvi um estouro dentro de casa e comecei a gritar. Começou a cair terra em cima de mim e dela. Cai por cima dela e a protegi. Tivemos uma nova vida", disse.
À noite, Genilson dos Santos Batista, 11, também foi vítima de novo tiroteio.
Em meio ao acirramento no confronto na Providência, o Exército desmobilizou ontem as tropas que estavam fazendo barreiras em estradas e deixou duas favelas. O morro do Pinto, vizinho à Providência, foi ocupado.
O Ministério Público Militar informou já ter os nomes de quatro suspeitos de atacarem o quartel, sendo que dois são ex-militares.
À tarde, a polícia prendeu no morro Chapéu Mangueira (Leme, zona norte), Luís Fernando Santos Alves, o Kalunga, acusado de ser o guardador de armas de traficantes da favela de Manguinhos (zona norte), uma das favelas ocupadas pelo Exército.
Ele teria fugido para outro morro após a operação militar em Manguinhos. A Polícia Civil tem informações de que, após serem roubadas, as armas foram levadas para a favela e, dali, distribuídas para outras comunidades controladas pelo Comando Vermelho.
Na ação militar na Providência, quatro suspeitos de tráfico foram presos, entre eles um menor de 18 anos. Foram apreendidas munição, pistola e 10 kg de cocaína.
Um estudante de jornalismo e morador do morro, Márcio Alfredo, 25, foi detido porque estendeu uma faixa com os dizeres: "Voltem para casa ianques alienados".
Moradores voltaram a acusar os militares de truculência. Reclamaram que eles estão revistando mochilas de crianças e que estão invadindo casas com laje para ocupá-las. Afirmaram ainda que só os militares atiraram.
Pelo menos seis escolas- entre elas uma creche- não funcionaram ontem. À tarde, cerca de cem moradores, a maioria crianças, foram para a frente da sede do Comando Militar do Leste (CML) para protestar. Com bexigas brancas, eles gritavam: "Az, az, az, az, a Providência quer paz" ou, então, "Ê, ê, ê, é abuso de poder". O CML nega as acusações.
Eles não foram recebidos pelos militares. O Exército reafirmou ontem que continuará no Rio até localizar as armas.
A Justiça Federal negou ontem pedido de suspensão da operação do Exército feito quinta-feira pelo Ministério Público Federal no Rio. Os procuradores da República alegaram que a intenção era impedir a "continuidade de possíveis arbitrariedades" de militares.
O juiz da 16ª Vara Federal negou o pedido por um aspecto processual, formal, diz o MPF: o fato de considerar que a concessão da medida não seria só preparatória de ação -objetivo da ação cautelar-, mas um fim em si mesmo, já que suspender a operação satisfaria a meta dos procuradores.
Já o Ministério Público Militar defendeu, em nota, a ação. ""O Exército está na função de Polícia Judiciária Militar, portanto, legalmente investido de poder para realizar a operação."


Texto Anterior: Bilhete único: Mais estações do metrô e da CPTM têm integração
Próximo Texto: Exército reduz criminalidade, diz vice-presidente
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.