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Vínculos afetivos fazem bichos salvarem pessoas
Pastor alemão evitou que bebê de 11 meses caísse em lago no fundo de sua casa
Gato persa "avisou" sobre vazamento de gás que ocorreu durante a madrugada em casa
de comerciante
ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA
Daniely tem apenas um ano e
quatro meses. Fala perfeitamente "mamãe" e "papai", mas
bate a língua nos dentinhos
quando grita o nome da pastor
alemão, Cony, 2. Só sai "Có".
Poucas palavras não têm sido
empecilho para que elas emitam, cada uma a sua maneira,
sinais claros de entendimento.
Um mês antes de completar
um ano, Daniely pulou cedo da
cama. Sem dar um pio, saiu do
quarto, atravessou a cozinha e o
quintal, percurso aproximado
de 15 m, e seguia em direção ao
lago, de 1,5 m de profundidade,
nos fundos da residência -uma
chácara em Cotia-, quando foi
surpreendida por Cony.
A cachorra abocanhou a saia
da garotinha e a derrubou, cuidadosamente. Cony circundou
a criança e impediu que se levantasse. Acuada, começou a
chorar, ao mesmo tempo em
que a cadela não parava de latir.
Em casa, a mãe, Tatiane de
Araújo, 23, nem se deu conta.
Encontrou a filha sentadinha e
chorando. A cachorra formava
uma espécie de barreira a poucos passos do lago. A garota não
tinha um arranhão, apenas sua
saia exibia uns furinhos. O mais
surpreendente é que a cadela é
do vizinho e freqüenta a casa de
Tatiane desde filhote.
Para Mauro Lantzman, professor de psicobiologia da PUC,
especialista em comportamento animal, por existir um vínculo afetivo entre elas, a cadela
agiu para proteger a criança.
A ciência diz que cães são capazes de ler as emoções de seus
donos e responder a eles, num
fenômeno chamado de ressonância afetiva. Segundo o psicólogo César Ades, especialista
em comportamento animal da
USP, esse fenômeno é marcado
por leitura de sinais, construídos ao longo do relacionamento entre donos e bichos.
O comerciante Marcos Eliseu Balles, 60, diz que tem uma
dívida, "impagável", com o seu
gato. "Devo a minha vida e a da
minha mulher a ele."
Sábado frio de 1995, Marcos e
a mulher, Stella, chegavam em
casa por volta da 1h da manhã.
Com uma enxaqueca daquelas,
acentuada por uma sinusite, o
comerciante colocou água no
fogo para fazer inalação. Cansado e sob efeito de um coquetel
de analgésicos, caiu no sono
-Stella estava apagada.
Duas horas e meia mais tarde, Marcos ouviu um ruído na
porta do quarto. Ruivão, persa
mestiço, hoje com 14 anos, pela
primeira vez tentava invadir
território proibido. Até então,
Ruivão tinha sido criado para
permanecer longe dali.
Segundo a veterinária e terapeuta Rubia Burnier, especialista em comportamento animal, o gato tem seus sentidos
muito apurados e isso faz com
que ele tenha uma percepção
aguçada de mudanças ambientais. O cheiro despertou seu
instinto de sobrevivência.
Assim que abriu a porta, Ruivão subiu na cama. Marcos tentou enxotar o bichano, mas
Ruivão não desistiu.
O comerciante se levantou
no momento em que o gato pulou no chão, como se quisesse
mostrar o caminho. Saiu do
quarto e de cara sentiu um
cheiro forte. A água havia fervido, apagado o fogo, e a cozinha
estava tomada pelo vazamento.
Fechou o gás e abriu janelas e
portas, sem acender a luz, o que
poderia ter provocado uma explosão. Antes do episódio, Marcos tinha predileção por cães e
certa resistência a gatos.
Desde aquela noite, Ruivão
conquistou, além de respeito e
simpatia dos donos, um lugar
cativo no pé da cama do casal.
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