São Paulo, domingo, 11 de abril de 2010

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ANÁLISE

Jovens se tornam presas fáceis com acessórios

CARMITA ABDO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O fascínio que situações de risco exercem sobre púberes e adolescentes é característico dessa fase e pode explicar, ao menos em parte, a "febre" das pulseirinhas coloridas, mensageiras de uma perigosa licenciosidade. O perigo não está no sexo em si, mas na péssima parceria para a atividade, deflagrada, no caso, mais pelo desafio que pelo desejo, mais por atrevimento que por atração.
Desafio e atrevimento que tem deixado sequelas em alguns jovens. E do que têm se aproveitado sociopatas, oportunistas sexuais, abusadores. As pulseiras sinalizam uma disponibilidade sexual aparentemente fácil, mas difícil de se assumir e absurda, mesmo entre adultos bem resolvidos. No pulso desses jovens, tornam-se uma auto-ameaça à integridade física, psíquica e moral.
As mensagens que aos enfeites transmitem, cobradas às últimas consequências por aqueles que não perdoam a ingenuidade da ousadia juvenil, merecem nossa reflexão. Vetar o comércio e o uso não atinge o âmago da questão, apesar de ser uma tentativa honesta de debelar o mal pela raiz. Porém, pode até estimular o uso camuflada ou gerar polêmica. Se os sociopatas não deixaram passar essa oportunidade -fazendo dela uma licença para violência- pais, educadores e a sociedade não podem se furtar à necessidade de análise que a gravidade da situação exige.
A análise que se impõe diz respeito à formação que estamos oferecendo às nossas crianças, as quais -antes que atinemos- tornam-se adolescentes e deliberadamente se opõem à autopreservação e à autoestima, arriscando sua própria integridade.
Estariam os jovens se insurgindo contra o excesso de cuidados parentais? Ou dando sequência à condição de abandono afetivo a que foram submetidos na infância? Abandono esse exercido por uma sociedade que cada vez mais banaliza o sexo e o dissocia do amor.
Essa sociedade negligencia, quando contempla atônita e não decodifica que as pulseiras algemam, tornando os jovens presas fáceis de um modismo insensato, um comportamento de grupo autodestrutivo. Modismos e comportamentos esses infiltrados e disseminados por adultos que se apropriam da fragilidade de uma geração que legitimamente almeja se afirmar, mas para isso não mede consequências. Não atina para o desatino.

CARMITA ABDO é psiquiatra e professora do Departamento de Psiquiatria da USP



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