São Paulo, domingo, 11 de abril de 2010

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TJ desqualifica vítima para manter condenação de réu

Órgão considera que mulher que negou abuso sexual do ex-guarda civil Mauro Queiroz mente

ROGÉRIO PAGNAN
DA REPORTAGEM LOCAL

A história do ex-guarda civil Mauro Henrique Queiroz, um dos mais emblemáticos casos da Justiça de São Paulo, ganhou novo ingrediente de polêmica com a publicação do acórdão do Tribunal de Justiça que explica porque os desembargadores mantiveram a condenação: para eles, a vítima Sônia Brasil, 65, mente para inocentar o réu.
Mauro foi condenado em 1959 por ter passado o pênis no braço de Sônia, dois anos antes (quando ela tinha 11 anos), dentro de um ônibus lotado. Um dos principais alicerces dessa condenação foi, justamente, o depoimento da vítima.
Na época, os magistrados disseram que, apesar de ser um "testemunho infantil", "não seria prudente nem razoável" desprezá-lo. Mauro, foi então, condenado a seis meses de detenção, pena convertida em liberdade vigiada. Agora, os desembargadores dizem que a versão de Sônia para inocentar o guarda Mauro "não possui nenhuma consistência, nem a menor credibilidade".
O pedido para mudar essa condenação é movido pela viúva e dois filhos do ex-guarda.
Mauro, segundo a família, escondeu esse condenação durante cerca de 40 anos e só resolveu contá-la meses antes de morrer. "Estou lutando contra uma coisa que eu não devo. Me condenaram, mas sou inocente", disse ao filho Amauri, 53.
Sete anos após a morte de Mauro, a família conseguiu encontrar Sônia, que disse que tudo tinha sido uma armação e que ela mentiu por determinação da avó. A versão foi repetida à Folha e à Justiça, pela agora, sexagenária dona-de-casa.
Em 2008, o Tribunal chegou a publicar um acórdão absolvendo o ex-guarda. Dias após a publicação pela Folha sobre a história de Mauro, no final de 2009, o Tribunal de Justiça fez uma nova sessão para anular o documento, a pedido do desembargador Damião Cogan.
Segundo o tribunal, houve um erro nessa publicação porque eles queriam na verdade manter a condenação.
Em seu relatório, o desembargador Ricardo Cardozo de Mello Tucunduva chama de "patético desabafo" o fato de Mauro ter contado ao filho sua condenação. Diz, também, que Sônia se comporta como "verdadeira ré" ao chamar o advogado de "defensor constituído".
"Aliás, é triste a sina de Sônia: quando era menina, o juiz do processo, tachando-a de mentirosa, absolveu Mauro. [...] Agora, já velha, Sônia é novamente desacreditada, por 80% dos desembargadores", diz trecho do relatório.
Tucunduva se refere à decisão de juiz de primeira, João Estevam de Siqueira Júnior, instância que, em 1959, inocentou Mauro "sob pena de praticar grave erro judiciário".
No recurso apresentado à Justiça, o advogado Álvaro Nunes Júnior ressalta o fato de que o magistrado da época acreditou na inocência do ex-guarda, assim como o juiz Pedro Luiz Aguirre Menin e a promotora Maria Teresa Godoy acreditaram, em 2005, na versão apresentada por Sônia.
O defensor reclama do fato de o desembargador ter utilizado a manifestação do promotor de 1959 e ter desprezado a de procurador que, em 2005, manifestou-se pela absolvição.


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