São Paulo, segunda-feira, 11 de junho de 2007

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"Nunca vi tanta gente feia", dizem habitués

Freqüentadores reclamam do ecletismo do evento

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Nunca vi tanta gente feia!", diz o estudante bombado, descamisado e depilado Victor Prado, 19, saindo da Parada Gay. A frase foi ouvida muitas vezes pela reportagem, em diferentes grupos do evento. A maioria dos queixosos é representante da ala masculina.
De acordo com os correligionários de Prado, desde a primeira edição, 11 anos atrás, a Parada do Orgulho GLTB se popularizou demais e "hoje é freqüentada por pessoas que nem são gays".
O maior movimento brasileiro de defesa da diversidade sexual e das minorias, quem diria, ficou muito eclético.
"Isso aqui está irreconhecível, olha só quanto mano", aponta para um grupo de jovens de bermudão e skates o administrador Ricardo Sá, 29.
Apesar de manter o fundamento militante, o movimento agora recebe a adesão de pessoas que, para Sá e os cinco amigos que o acompanham, o descaracterizaram.
"Acontece que isso aqui é um evento aberto, não precisa pagar nada. Então, não dá para controlar a freqüência", diz o professor Emanuel Via.
O preconceito parece contagioso. Esquecido da essência suprapartidária da parada, o fotógrafo carioca Mauro Scur, 32, diz: "Como vocês dizem aqui em SP, só tem periferia. Lá no Rio, a gente diria suburbano".
Isso diz respeito aos gays também. De acordo com o maquiador Marcos Costa, 32, "as "bonitas" são preconceituosas, não vêm mais. Então, a parada tomou outro rumo".
Mas, se os próprios homossexuais gostam de dizer que são mais cuidadosos com a aparência, o número de feios causa estranhamento. Como explicar?
O stylist Ronaldo Gomes, 30, responde sem rodeios. "O problema é o baixo poder aquisitivo da maioria. Nem sempre aqui as pessoas são exatamente feias; às vezes são apenas mal tratadas. Presta atenção nos cabelos, nas peles..."
Para o gerente comercial na área de moda Edson (ele não diz o sobrenome), 28, óculos de sol grande estilo máscara, camiseta regata preta e calça comprida cáqui, "o problema é que tem muita gente, e o número de feios é sempre maior. Aumenta na mesma proporção".
Numa tentativa de explicar matematicamente o fenômeno do "enfeamento da parada", o namorado de Edson, o cubano Carlos, arrisca um número: "No máximo, 10% são bonitos".
"Quem são eles para dizer alguma coisa?", pergunta o bailarino Roberto Oliveira, idade não revelada, olhando na direção do casal.

"Mais gay que eu"
Numa nítida apropriação da militância alheia, dois rapagões héteros dizem gracinhas nos ouvidos de três meninas que dançam com quatro amigos gays. "É um evento para todo mundo, véio. Tamos aí para ajudar os gays", diz, debochadamente, o estudante de engenharia Tiago Lima, 22.
Como no poema, Lima e seus amigos querem as meninas, que querem os gays, que querem Tiago e seus amigos etc.
""Isso aí" é mais gay que eu. É uma questão de tempo", acha o radiologista Mateus Aguiar, 26, denunciando a atitude do grupo de Lima, composto por rapazes de peitão depilado etc.
Ali ao lado, com um grupo de quatro amigos, o professor de educação física gay Bruno,1,84 m, 84 kg, 110 cm de peitoral liso e um dos manifestantes mais paquerados do pedaço, defende a diversidade.
"A parada é pra todo mundo, gente feia, bonita..." Uma menina bêbada passa e aplica um beijo na boca de Bruno. Ele então acrescenta um "esquisita" a sua lista de possibilidades.


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