São Paulo, domingo, 11 de julho de 2010

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Prédios novos se isolam dentro de favela

Moradores agora incluídos no sistema habitacional formal recorrem a muros, grades e esquemas de segurança

Fenômeno, comum há décadas em áreas de classes média e alta, faz prefeitura reavaliar projetos de intervenção


VINÍCIUS QUEIROZ GALVÃO
DE SÃO PAULO

Primeiro foram muros. Depois grades, cadeados e a fechadura. Na entrada do prédio, um aviso aos moradores: "Mantenham o portão fechado para nossa segurança".
A cena, comum em condomínios de classes média e alta, surge agora em Heliópolis, maior favela paulistana, e em outras regiões periféricas.
Um vez incluídos no sistema habitacional formal, os moradores também acabam optando pela segregação.
O fenômeno já levou a prefeitura a reavaliar os projetos de intervenção em favelas.
Muros de um lado, cortiço do outro. Não demorou para que a divisão passasse a ser usada de parede para a construção de novos barracos.
"As pessoas repetem o modelo que conhecem. Muro não é seguro, não é solução. É uma coisa cultural brasileira", afirma Elisabete França, superintendente de habitação popular da prefeitura.
"O fechamento é uma dificuldade na hora de fazer os projetos e uma reivindicação constante dos moradores", diz o urbanista Marcos Boldarini, arquiteto de projetos de intervenção em favela.
Os moradores também usam o fundo de caixa do condomínio em portaria, guarita e portão com fechamento por controle remoto.

ESPAÇO PÚBLICO
Com os muros, muitos conjuntos fecham as quadras esportivas e o playground, construídos pela prefeitura para uso da vizinhança.
A prefeitura chegou a criar um curso para formar síndicos de moradias populares a fim de orientar o gerenciamento de áreas comuns.
"Os portões eram abertos, o conjunto servia de passagem para quem morava na favela. Decidimos fechar há dois anos", diz José Lázaro, síndico de um conjunto de quatro blocos em Heliópolis.
"Espaço de convivência é de todo mundo. Quanto menos muros, melhor", diz Antônia Cleide, presidente da Unas, que une associações de moradores de Heliópolis.
A solução encontrada pela prefeitura foi fazer um fechamento mais transparente, com grades vazadas e baixas.
A maioria dos conjuntos entregues agora, como os da Nova Jaguaré, zona oeste, são cercados. Em Itaquera, do outro lado da cidade, além de muros, os moradores instalaram portões com controle remoto para os carros.
Era uma favela, transformada num conjunto habitacional de 296 apartamentos, ainda rodeado de pobreza.
Por iniciativa própria, os vizinhos fecharam a entrada da garagem e criaram um pátio interno com fundo de caixa do rateio do condomínio.

INTIMIDADOR
O fechamento veio depois do roubo de carros. "Nunca mais aconteceu, os ladrões se intimidam", diz o morador e ex-síndico José Nogueira.
"Há um espelhamento na classe média, que de 20 anos para cá ficou cercada. A comunidade tem de entender a urbanização. É preciso conversar com esses moradores para retirar esses fechos", diz o arquiteto Ruy Ohtake, autor de um dos projetos de intervenção em Heliópolis, este sem muros, cercas ou grades.


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