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ANÁLISE
"Bolha" conforta, mas não livra shopping de mazela das ruas
ROSEMERE MAIA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Ilha de segurança, cápsula
de proteção, espaço extraterritorial. Muitas podem ser as
denominações que conferem
ao shopping center o caráter
de ambiente asséptico, imune à violência e ao crime. Os
recentes episódios, entretanto, talvez sirvam para nos fazer refletir sobre a propriedade do discurso que vê eficácia nos mecanismos de segurança em tais equipamentos.
O "olho do poder" apresenta-se nos shoppings como estratégia contemporânea, cada vez mais sofisticada, e não necessariamente
"mantida na clandestinidade" ou camuflada. A bem da
verdade, chega-se a anunciá-la ironicamente, como nos
cartazes com a frase "Sorria,
você está sendo filmado!",
ou nos emblemas usados pelos seguranças onde se lê a
pergunta: "Posso ajudar?"
Essa última estratégia, que
à primeira vista deixa transparecer uma espécie de gentileza, é uma demonstração
do poder do "Big Brother"
que se pretende onipresente,
onisciente e onividente.
Para os frequentadores, o
diferencial é a prevenção,
com inibição de roubos ou
outras ações criminosas. Esses mecanismos, no entanto,
reforçam a segregação espacial e os processos de discriminação e exclusão social.
REDOMA?
É comum nos depararmos
com situações marcadas pelo
constrangimento, sobretudo
em relação àqueles que, pela
aparência, não são identificados como consumidores.
Apesar de todo o esforço
em contrário empreendido
pelos administradores e lojistas -e do desejo de muitos
frequentadores-, os shoppings não estão apartados do
contexto citadino, não podem ser encarados como
uma "redoma de vidro".
Não há como se manterem
imunes às mazelas existentes na cidade, aos conflitos
emanados das relações estabelecidas entre os segmentos
sociais, relações estas pautadas em toda sorte de desigualdade e contradições.
AMBIGUIDADES
A crescente publicização
dos shoppings tem produzido ambiguidade quanto à
sua situação no intermédio
entre o público e o privado.
Muitos tendem a considerá-los como espaços públicos, o
que não significa, necessariamente, percebê-los como
espaços de igualdade dada
sua lógica segregacionista.
Essa publicização também
pode torná-los mais permeáveis ao inusitado, ao imprevisto, ao "descontrolado", ao
violento, posto serem estas
as melhores qualificações
para as ruas.
Contudo, muitos percebem nessas manifestações
de descontrole e violência,
de imprevisibilidade, uma
potencialidade menor do
que as verificadas em outras
áreas da cidade, em razão do
olhar ostensivo exercido por
toda sorte de mecanismos de
segurança.
EXCESSOS
Quanto aos possíveis excessos cometidos pelos seguranças contra os segmentos
indesejáveis, não necessariamente criminosos, são justificados como "violência defensiva" e, o que é pior, encenados de modo a provocar
um sentimento de concordância por parte de outros
frequentadores, como se
houvesse sempre uma grave
ameaça à pessoa, à ordem e
ao patrimônio.
ROSEMERE MAIA é professora da UFRJ,
pesquisadora da FAPERJ e do CNPq
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