São Paulo, segunda, 12 de janeiro de 1998.



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Corte emperra programa

AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

O salto quádruplo no crescimento dos casos de dengue no país acontece no momento em que o país poderia estar comemorando o início da erradicação da doença.
"A decisão de erradicar a dengue era uma proposta de governo do presidente Fernando Henrique", disse ontem o ex-ministro Adib Jatene. O compromisso, segundo Jatene, foi assumido numa reunião em meados de 1996 com a participação de nove outros ministros. No encontro foi constituída uma comissão executiva para a erradicação da dengue.
Em março de 1997, cerca de 2.000 municípios deveriam estar se integrando numa ampla campanha preparada nos dois anos anteriores.
A saída de Jatene e os cortes nas verbas da Saúde emperraram o projeto. Até agosto do ano passado, apenas R$ 25,9 milhões de um total orçado de R$ 206 milhões tinham sido gastos nos programas de combate à dengue em 1997.
"Sem uma fonte de fluxo contínuo, era mesmo impossível levar um programa que previa grandes investimentos em saneamento", diz Jatene, que deixou o ministério em novembro de 1996.
A proposta de erradicar a doença reduziu-se então a um simples controle. "O que tenho visto é uma ação de bombeiro, um simples combate ao mosquito a cada vez que aparece", diz a médica sanitarista Fabíola Aguiar Nunes. Em dois anos como coordenadora do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fabíola conseguiu que o Brasil assumisse uma proposta de erradicação e que a mesma política fosse adotada pela Organização Panamericana da Saúde (Opas) para todo o continente. "Conseguimos o que até então parecia impossível", diz a médica. "O que me revolta é que o Brasil deixou de lado um programa quando tinha as condições de executá-lo e de se colocar como líder."
Segundo Jatene, o Brasil, "que saiu na frente como modelo para o continente, está com a ação comprometida."
Ele afirma que a dengue estava entre as três preocupações que o levaram a pedir a criação da CPMF (Contribuição Financeira sobre Movimentação Financeira). As outras eram a mortalidade infantil e a malária. "A mortalidade infantil continua caindo e o controle da malária vem dando resultados", diz. "Mas a dengue precisava de um volume de recursos que acabou não vindo."
Segundo Jatene, em valores reais, a Saúde recebeu em 97 menos do que 95, apesar da receita da CPMF.
Mario Cesar Scheffer, do Conselho Nacional de Saúde, diz que o programa de combate à dengue sofreu mais com a paralisia das instituições do que com a falta de dinheiro. "O dinheiro estava disponível, mas não se criou mecanismos para repassá-lo aos Estados e municípios", afirma.
Outro problema -segundo Scheffer- foram as mudanças ocorridas no próprio ministério. "O programa, que antes gozava de status especial dentro do ministério, foi igualado a outros dentro da Secretaria de Programas Especiais. Também ocorreu a saída de técnicos importantes na área de combate ao dengue."




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