São Paulo, quarta-feira, 12 de março de 2008

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Segurança Pública omite parte das mortes por PMs

Índices da secretaria paulista não incluem, por exemplo, casos em que um policial mata uma pessoa em briga de bar

Entre 2005 e 2007, a pasta deixou de apontar em seus registros pelo menos 287 mortes cometidas por PMs, uma diferença de 19,33%

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Manoel de Oliveira com foto do filho morto, por engano, por um PM

ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

O número de pessoas mortas por policiais militares no Estado de São Paulo em 2005, 2006 e 2007 é 19,33% maior do que o revelado pelo governo paulista nos balanços sobre a violência divulgados trimestralmente pela Secretaria da Segurança Pública. Nesse período, a pasta deixou de incluir em seus índices pelo menos 287 mortes cometidas por PMs.
A constatação de que esses 287 homicídios cometidos por PMs, nos últimos três anos, são omitidos pela Segurança Pública foi possível porque a Folha realizou levantamento nos balanços mensais (dos últimos 36 meses) sobre a letalidade policial feitos pela Corregedoria da Polícia Militar, responsável por investigar crimes cometidos por policiais.
Após ser questionada pela Folha sobre a diferença entre os dados, a Segurança Pública admitiu a omissão de parte dessas informações. A diferença ocorre, segundo a secretaria, porque a pasta não contabiliza homicídios cometidos fora das chamadas "resistências seguidas de morte". São casos de PMs que, na folga ou em serviço, matam alguém em uma briga de trânsito, por exemplo.
De acordo com a secretaria, a medida é baseada em uma lei , a de n.º 9.155, de 1995, que regulamenta a divulgação de índices de criminalidade.
No site da Segurança Pública (www.ssp.sp.gov.br/estatisticas) constam apenas duas classificações para apontar os mortos por PMs: "Pessoas mortas em confronto com a PM em serviço" e "pessoas mortas por PMs de folga" [mas em situação de confronto, como uma tentativa de roubo].
Os outros casos de homicídio cometidos por PMs, mesmo que com o uso de armas da corporação, vão para a classificação geral dos homicídios dolosos, sem constar como cometidos pelos agentes de segurança.
Assim, assassinatos como o de Ricardo Manoel de Oliveira, em 2006, ficam foram dessa classificação e contribuem para que os índices da violência policial pareçam mais baixos. O rapaz foi morto, por engano, após um PM ter brigado em um bar (leia texto ao lado).
Já os dados da Corregedoria da PM apresentam todos os casos em que policiais matam. A cada mês, o órgão publica no "Diário Oficial" do Estado os números de pessoas mortas por PMs, mas essa base de dados não é a revelada pela Segurança Pública.
"As pessoas usam os números que lhes são mais convenientes", afirma Cláudio Beato, doutor em sociologia e coordenador do Crisp (Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública, da Universidade Federal de Minas Gerais).
Os índices de letalidade policial, diz, são um assunto que "queima na mão de quem gerencia segurança pública no Brasil, seja em qual Estado for".
"E a falta de padronização nacional para classificação da violência contribui para que os investimentos nessa área não sejam direcionados corretamente. O número de mortos por PMs é parâmetro para saber quando, como e em que circunstância a tropa mata mais."
A Segurança Pública admitiu mudar a divulgação dos números e passar a informar que apresenta apenas "um recorte" dos mortos por policiais militares. Esse recorte é o das "resistências seguidas de mortes".
Pela lei, "resistência seguida de morte" (quando o morto aparece como indiciado no boletim de ocorrência e o policial, autor do homicídio, figura como vítima) não existe -há apenas o homicídio.
Nos dados da Corregedoria da PM a subdivisão é: "Resistência seguida de morte em serviço", "resistência fora de serviço" -a exemplo da Secretaria da Segurança Pública-, além de "homicídio doloso [intencional] em serviço" e "homicídio doloso fora de serviço".


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