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Debate Folha
Educadores divergem sobre bônus a professor do Estado
Defendida pela secretária da Educação, premiação em dinheiro foi alvo de polêmica entre especialistas
PRESTES A SER IMPLANTADA
na rede estadual de ensino de
São Paulo, a política de premiar em dinheiro professores e funcionários de escolas que atingirem metas de qualidade foi alvo de polêmica no debate promovido pela Folha
anteontem.
Segundo a secretária da Educação
do governo Serra (PSDB), Maria Helena Guimarães de Castro, a intenção é
valorizar os que mais se dedicam.
Professor do Ibmec-SP, Eduardo
Andrade concordou com o princípio,
mas disse que o governo também deveria aplicar punições. Ele usa como
base a experiência dos EUA, onde fez
doutorado (Universidade de Chicago).
O presidente da Apeoesp (sindicato
dos professores), Carlos Ramiro de
Castro, e o docente da USP José Marcelino de Rezende Pinto (ex-diretor
do instituto de pesquisas do MEC) criticaram o bônus. Leia o resumo do debate, mediado pelo colunista da Folha
Gilberto Dimenstein.
(FÁBIO TAKAHASHI)
O BÔNUS
MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO (secretária estadual da Educação)
- Vamos valorizar os bons
profissionais, que são a maioria. Hoje, não há como premiar
o bom professor e a boa escola.
O bônus, existente desde
2000, contabiliza basicamente
a assiduidade dos professores.
Vamos ampliá-lo, contando
também o desempenho dos
alunos no Saresp, a taxa de reprovação, evasão e a fixação dos
professores na escola.
Quanto mais ela se esforçar,
mais a equipe será beneficiada,
com incentivos concretos. Nossa política tem por princípio o
direito de o aluno aprender.
Mas não vamos comparar
uma escola com outra. Avaliaremos a escola a partir do seu
ponto de partida, pois não queremos colocar um professor em
disputa com o outro. A nossa
ênfase é no trabalho coletivo.
CARLOS RAMIRO DE CASTRO (presidente da Apeoesp, sindicato dos professores) - A política de bônus,
de "meritocracia", não vai dar
certo, como não deram outras
ações semelhantes. O prêmio
será pago a poucos profissionais. O restante ficará apenas
com o seu mísero salário.
Não somos contra a avaliação. Mas precisa haver critérios
transparentes, cujos resultados
sirvam para evolução na carreira, na perspectiva de um salário
melhor, e não para receber um
prêmio, que será para poucos.
EDUARDO ANDRADE (pesquisador do
Ibmec-SP) - A proposta da secretaria parte de princípios muito
interessantes. O primeiro é a
necessidade de uma gestão
mais profissional nas escolas,
com metas definidas e um sistema de incentivo adequado. A
idéia fundamental é responsabilizar diretores e professores
pela qualidade de ensino.
Outra questão positiva é a
ênfase no bom professor, que é
capaz de reverter até as dificuldades socioeconômicas dos estudantes. Os bons educadores
têm de ser estimulados. Por isso, [o bônus] não pode ser pago
para todo mundo, porque nem
todo mundo é bom professor.
A política de São Paulo está
no caminho certo, mas faltam
coisas para que efetivamente o
resultado seja bem-sucedido.
Uma delas é que o projeto só
envolve bonificação e não há
punições.
JOSÉ MARCELINO DE REZENDE PINTO
(pesquisador da USP de Ribeirão Preto)
- Sou contrário à política de
bônus. Um dos problemas é
que a medida traz um pressuposto implícito de que o professor não ensina porque não
quer. Isso não é verdade.
O professor tem muita dificuldade para ensinar, foi formado em uma lógica de que o
bom professor é aquele que reprova e que, se o aluno não
aprende, é culpa dele. Assim, se
o docente não sabe ensinar, não
adianta triplicar o salário.
Uma das coisas que de fato
deveriam ser analisadas é a alta
rotatividade dos professores.
Como vou fazer uma política
focada na escola se eu não sei
qual profissional estará lá?
SALÁRIOS
MARIA HELENA - A bonificação
por mérito não substitui o salário, só o completa. O salário e a
carreira são fundamentais. Por
isso, analisaremos uma reestruturação da carreira.
Mas o reajuste salarial não é
definido pelo secretário de
Educação, e sim pela Gestão,
Fazenda e Planejamento. A reivindicação salarial é justa, mas
é um tema que envolve lei de
responsabilidade fiscal, disponibilidade [de recursos].
Agora, eu não acho que a isonomia [igualdade] salarial, sozinha, vai resolver qualquer
problema do Estado brasileiro.
Precisamos de uma política que
seja capaz de distinguir aqueles
que são mais dedicados.
RAMIRO - Quando você assume
um compromisso, você assume
com base no seu salário e não
na expectativa de ganhar uma
possível bonificação. Se o salário é insuficiente, o professor
dobra a jornada de trabalho. Aí,
adoece, falta às aulas.
O que de fato vai melhorar a
qualidade de ensino é o reajuste e um bom plano de carreira.
E não bonificações. No Estado
mais rico do país, estamos há
três anos sem reajuste.
MARCELINO - Para atrair bons
profissionais, precisa pagar
bem. Uma escola de qualidade
tem um custo, que não é pouco.
Costuma-se dizer que o Brasil
gasta cerca de 4% do PIB [em
educação], que não é muito diferente dos 5% nos EUA. Mas
os PIBs são muito diferentes.
Os 5% nos EUA representam
US$ 7 mil [cerca de R$ 12 mil]
por ano [por aluno]. No Brasil,
são R$ 1.000. Qualquer estudante de escola particular média no país recebe um investimento três vezes maior que a
pública. Fica evidente que dinheiro e salário [dos professores] fazem diferença, senão a
classe média seria burra por
gastar tanto com mensalidades.
ANDRADE - Concordo que para
atrair profissionais de melhor
qualidade é fundamental aumentar o salário. Mas se o professor se mostrar de baixa qualidade para a função, ele precisa
ser retirado do processo. Pagar
melhores salários para todos é
injusto com os bons.
PENAS E COMPETIÇÃO
ANDRADE - O projeto da secretaria envolve apenas bonificação -e não punição. A experiência americana, de onde a
secretaria se inspirou, mostra
que os Estados que não adotaram um sistema de punição não
obtiveram êxito. Eles tiveram
desempenhos semelhantes aos
Estados que apenas implementaram um sistema de metas e
de avaliação -semelhante ao
Saresp-, mas sem incentivos.
Só os que definiram punições
tiveram resultados objetivos.
E o que são as punições?
Aquele que não atinge as metas,
primeiro, tem de se explicar. E
se não conseguir melhorar a
qualidade de ensino, a escola
pode ser fechada, e os estudantes têm o direito de escolher
um outro colégio, que pode ser
público ou privado. Esse é o
efetivo direito de o aluno receber uma educação de qualidade. Outra falha do projeto de
São Paulo é premiar toda a
equipe da escola. Ou seja, aqueles que realizaram um trabalho
muito bom vão ganhar o mesmo que aqueles que não se empenharam tanto. A proposta
não separa o joio do trigo.
MARCELINO - A escola é um trabalho coletivo. É como um time
de futebol, não adianta só colocar 11 craques em campo.
RAMIRO - Fechar escolas? É o
que tem sido feito até hoje. Já
reduzimos o que podíamos.
MARIA HELENA - Sobre o fechamento das escolas, não acho
positivo. A nossa proposta é dar
um apoio maior àquelas que tiverem resultados piores no Saresp. Mandaremos, por exemplo, uma equipe para verificar o
plano pedagógico.
Nem todas as escolas particulares são boas. Na escola pública, também há unidades
muito boas, outras nem tanto.
É com essa diversidade que vamos conviver. Mas, claro, precisamos buscar qualidade para
todas as escolas.
Tenho discordâncias também quanto a colocar uma
competição dentro da escola.
Prefiro valorizar o trabalho de
todo conjunto. Se a equipe não
estiver integrada no projeto pedagógico, fica difícil melhorar.
NEGOCIAÇÃO
MARCELINO - Para melhorar a
educação, precisamos de um
pacto. A progressão continuada, por exemplo, foi imposta de
cima para baixo. Propostas que
até são boas, se não contarem
com o envolvimento dos profissionais que irão aplicá-la, têm
grandes chances de falharem.
É o caso do bônus. Ela não
pode ser apresentada apenas
como uma proposta a ser implementada. Até porque ela
ainda vai ter de passar pela Assembléia Legislativa.
ANDRADE - As políticas educacionais no Brasil são de governo e não de Estado [ou seja, não
têm continuidade]. Entra um
governo, até do mesmo partido,
como é o caso do PSDB em São
Paulo, e as mudanças são gritantes. A política do governo
Alckmin, por exemplo, era fortemente contrária à colocação
de metas para as escolas. Agora,
entra um novo governo, que
implanta tal medida.
O mesmo ocorreu com o PT.
A cada troca de ministro no governo federal, houve mudanças
significativas nas políticas.
A sociedade começa a desacreditar nos governos. As pessoas não se engajam, porque sabem que daqui a dois, três anos
tudo vai mudar de novo. É um
risco que a política de bonificação em São Paulo corre.
MARIA HELENA - Concordo que a
política de educação tem de ser
de Estado, permanente. Mas a
proposta que trouxemos para
São Paulo está ancorada em
uma estratégia de longo prazo,
articulada às políticas que estão
sendo implementadas nacionalmente, como o Plano de Desenvolvimento da Educação [o
chamado PAC da Educação], do
governo federal, e com o Todos
pela Educação, da sociedade civil. Por isso, acredito que independentemente das trocas de
governo, ficará mais fácil uma
"pactuação" pela educação.
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