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São Paulo tem pelo menos mil crianças fora da escola
Maioria das famílias pediu vaga para filhos entre os meses de dezembro e janeiro
Lista dos conselhos tutelares relaciona 1.027 nomes, de nove regiões, e será enviada à Promotoria para propor abertura de ação na Justiça
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL
Passados dois meses do início do ano letivo, mais de mil
crianças estão sem vagas no ensino fundamental em São Paulo, aponta levantamento dos
conselhos tutelares da cidade.
Conselheiros, Defensoria
Pública Estadual e ONGs apontam déficit nas escolas municipais e estaduais, principalmente por conta da diminuição do
número de colégios com o "turno da fome" (período das 11h às
15h, uma hora a menos que o
normal das aulas, para abrigar
mais alunos na escola). Não
houve, afirmam, construção de
unidades de forma compatível.
A razão para a fila, porém,
não é clara. A prefeitura diz que
houve aumento de procura pelas suas escolas neste ano e que
trabalha com o Estado para encontrar lugares. A responsabilidade de oferta na cidade é dividida pelas redes do prefeito Gilberto Kassab (DEM) e do governador José Serra (PSDB).
A prefeitura nega, contudo,
que faltem vagas. O governo estadual informou que tem lugares em todas regiões que foram
apontadas como deficitárias.
Segundo a Folha apurou, o
sistema integrado de distribuição de matrículas da prefeitura
e do Estado ficou dois meses
quase parado, por conta de desentendimentos entre as gestões (voltou em março). Ambas
as instâncias buscam diminuir
o número de alunos por sala.
O ensino fundamental é a
única etapa obrigatória do ensino no país, segundo a Constituição. O descumprimento da
obrigação pode levar ao afastamento dos gestores públicos
(governador, prefeito e secretários de Educação).
Levantamento
Devido às reclamações sobre
falta de vagas neste ano, os conselhos tutelares fizeram uma
lista única com os nomes das
famílias que foram ao órgão.
A relação foi fechada na quarta-feira, com 1.027 nomes, de
nove regiões, e será enviada ao
Ministério Público. Eles pedirão abertura de ação para atendimento às requisições.
A maioria das famílias pediu
vaga entre dezembro e janeiro.
As regiões que mais apresentaram demanda foram Cidade
Ademar (300) e Grajaú (191).
Especialistas que acompanham a oferta de vagas dizem
que não havia registro de déficit no ensino fundamental desde o início desta década. O problema estava restrito às creches e pré-escolas.
"Reduziram o "turno da fome" sem se preocupar em construir escolas de forma proporcional", disse a coordenadora
da comissão de educação dos
conselhos tutelares da cidade,
Maria da Conceição Barbosa
Brito. "Estamos em abril e a situação não foi resolvida. Os alunos podem perder o ano."
Pressionados politicamente
a acabar com o turno intermediário, prefeitura e Estado intensificaram a diminuição do
modelo. Só na rede municipal,
o número de unidades com o
"turno da fome" caiu de 329
(em 2005) para 69 (neste ano).
O fim do período foi uma promessa de campanha de Kassab.
"Passamos a receber muitas
reclamações de falta de vagas
no fundamental, etapa em que
os governos dizem não haver
déficit", disse o defensor público Flávio Frasseto, que abriu
procedimento investigatório.
"Quando a vaga aparece, o
aluno é colocado longe de casa,
o que é ilegal", disse Frasseto.
Ele cita lei federal do ano passado que obriga o poder público a
matricular a criança na escola
mais próxima de sua casa.
Bruna dos Santos Lopes de
Souza, 13, de Americanópolis
(zona sul), busca vaga desde dezembro. "Não sabemos mais o
que fazer", afirmou a ajudante
de produção Gleide da Silva, 37,
tia da jovem. O pedido de matrícula foi feito na escola municipal Cacilda Becker.
Após três meses de espera,
Gleide conta que foi oferecida
uma vaga em uma escola estadual a 4 km de sua casa. "Não
tem transporte escolar, a mãe
dela não pode pagar condução e
demora muito para chegar. Não
tem condição de aceitar", disse.
Por isso, Bruna segue na fila.
"Faltou planejamento para o
fim do terceiro turno", disse Salomão Ximenes, da ONG Ação
Educativa. "O período intermediário é prejudicial, porque os
alunos estudam menos horas.
Mas não se pode acabar sem a
respectiva oferta de vagas."
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