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SAÚDE
Mato Grosso enfrenta crise de leitos; 80 pacientes, entre eles as vítimas, já tiveram de recorrer à Justiça para garantir internação
Em três meses, 13 morrem por falta de UTI
HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
Desde 20 de junho, a Justiça em
Cuiabá (MT) mandou os gestores
dos SUS (Sistema Único de Saúde) internar em UTIs (Unidades
de Terapia Intensiva) 80 pacientes. Desses, 13 morreram à espera
de uma vaga para internação,
apesar de terem obtido a ordem
judicial. Duas mortes ocorreram
anteontem, e outra, no domingo.
Devido à falta de leitos, os 80
doentes recorreram à Justiça para
conseguir vaga nas UTIs. Dos 148
leitos disponíveis no Estado, pelo
menos 108 estão em Cuiabá. Faltam vagas principalmente no interior de Mato Grosso.
Procurado pelos familiares dos
pacientes, o defensor público Valtenir Luiz Pereira, 31, afirma que
entrou com as ações na Justiça
contra o governo do Estado e contra a Prefeitura de Cuiabá, que são
os gestores dos SUS.
Pereira disse ontem que ainda
estuda uma forma de responsabilizar os culpados pelo descumprimento das liminares, o que resultou nas 13 mortes.
Segundo ele, devido ao volume
de liminares (decisões judiciais de
caráter provisório) fica difícil saber quem recebeu primeiro a notificação e a descumpriu. Nos últimos dez dias, foram 15 liminares,
afirmou Pereira, que reconhece o
governo do Estado como o principal gestor do SUS.
R$ 30 mil por uma vaga
Após sofrer um acidente de moto no sábado passado, Edivaldo
Ramos dos Santos, 36, que trabalhava como vendedor autônomo,
foi internado no Pronto Socorro
Municipal de Várzea Grande
(município vizinho a Cuiabá) por
volta das 8h.
A família conseguiu uma liminar da Justiça no domingo, mas
não obteve a internação na UTI.
A mulher de Santos, Vanderléia
Dias de Oliveira, 34, afirmou que
o hospital Jardim Cuiabá (instituição particular) propôs cobrar
R$ 30 mil pela internação.
A Defensoria Pública tentou sequestrar o dinheiro nas contas do
Estado para pagar as despesas,
mas o Tribunal de Justiça impediu. A direção do hospital nega
negligência.
Santos deixou quatro filhos e a
mulher, que está desempregada.
Vítima de uma parada cardíaca
em razão de hipertensão, o funcionário público aposentado Ronaldo Nunes de Souza, 49, morreu anteontem, seis horas após ter
conseguido liminar da Justiça para internação na UTI em um hospital em Cáceres (localizado a 250
km de Cuiabá).
Souza estava internado em Barra de Bugres (169 km de Campo
Grande). Segundo o funcionário
público Genivaldo José Nunes de
Arruda, 38, sobrinho de Souza, a
família não conseguiu arrumar
uma UTI móvel para transportá-lo até Cáceres.
"Os médicos disseram que haveria esperança, se tivesse uma
UTI", afirmou Arruda.
Progressão geométrica
Desde que começou a entrar na
Justiça para obter liminares favoráveis à internação de pacientes,
Pereira afirma que o número de
casos cresce em "progressão geométrica" em Mato Grosso.
Em agosto, foram 29 liminares.
Nos primeiros 11 dias de setembro, as decisões chegaram a 15.
Sem vagas pelo SUS, a Defensoria Pública tenta obter internação
em hospitais particulares. Como
essas instituições reclamam que o
SUS não paga os gastos, Pereira
entrou na Justiça para sequestrar
dinheiro do Estado. No domingo,
conseguiu um sequestro de R$ 20
mil -suspenso horas depois.
Antes disso, a aposentada Colmira Lopes dos Santos, 69, vítima
de acidente vascular, conseguiu a
internação no hospital Santa Rosa, que é particular. A filha dela, a
vendedora Maria de Lurdes, 37,
conta que passou a madrugada e
o dia de domingo atrás da vaga.
A direção do hospital Santa Rosa informou à Agência Folha, em
julho, que a situação da falta de
UTIs do SUS "pode inviabilizar a
rede privada, que tem 200 mil
usuários de convênio particulares
para atender no Estado".
Para a Defensoria Pública, o número de mortes por falta de UTIs
do SUS pode ser maior. "Registramos 13 casos, mas eram pessoas
que conseguiram liminares. Existem os que não entraram na Justiça", disse Pereira.
Em maio, o Sindicato dos Médicos de Cuiabá divulgou que 150
pacientes morreram no Estado
por falta de leitos nas UTIs, de outubro de 2002 a março de 2003. O
Ministério Público Estadual está
acompanhando a situação e abriu
inquérito para apurar se procede
a informação do sindicato.
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