São Paulo, quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Próximo Texto | Índice

Nestlé pede, e Kassab reduz carne em sopa

Por solicitação da Nestlé, que queria participar de licitação, Prefeitura de São Paulo piorou a qualidade nutricional do alimento

Nutricionistas haviam previsto 7 kg de carne a cada 100 kg de sopa; com a mudança, administração passou a exigir só 0,5 kg

JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

A pedido da Nestlé, a Prefeitura de São Paulo decidiu reduzir a qualidade nutricional da sopa que pretende distribuir em um programa que irá reunir pais e alunos aos sábados nas escolas e creches municipais.
A gestão Gilberto Kassab (DEM) diminuiu a quantidade de carne, frango e verdura exigida na sopa depois de um apelo feito pela multinacional durante uma consulta pública para a compra do produto.
A previsão das nutricionistas do município era que uma das sopas tivesse 7 kg de carne, 2 kg de cenoura e 3 kg de "outras" hortaliças (por 100 kg de sopa desidratada a ser distribuída).
Com a mudança feita diante da manifestação da Nestlé, a mesma sopa deverá ter só 0,5 kg de carne, 0,8 kg de cenoura e 1 kg de "outras" hortaliças.
A redução na quantidade de carne, frango e verdura exigida na sopa é condenada pela presidente da Associação Brasileira de Nutrição, Andrea Galante, que também contesta a escolha desse alimento para ser distribuído nas escolas municipais.
"Baixar a quantidade de verduras e hortaliças vai contra aquilo que preconiza a OMS [Organização Mundial da Saúde]. Uma maçã tem os mesmos nutrientes que uma porção dessa sopa, que ainda será servida em uma época de calor."
O edital prevê a compra de 750 toneladas de sopa desidratada por mês. O Sábado na Escola está previsto para começar no final de semana.
O TCM (Tribunal de Contas do Município), no entanto, determinou ontem a suspensão do pregão que ocorreria hoje para definir a fornecedora.
Um dos motivos contestados pelo tribunal foi a exigência de que a entrega da sopa, com embalagem personalizada, começasse no dia 15, três dias depois do anúncio do resultado.
O TCM avaliou que a condição só poderia ser atendida por alguém que já tivesse pronta toda a infra-estrutura para distribuição, algo que abriria margem para direcionamento.

R$ 46 milhões
O TCM também considerou que a prefeitura precisa explicar a razão para a contratação de um único fornecedor do programa. Empresas menores alegam que apenas as grandes do segmento teriam condições de entregar a quantidade exigida.
A Nestlé atualmente mantém contrato com a prefeitura para a distribuição de leite nas escolas, tendo pronta sua estrutura logística de entrega.
Tanto a multinacional como a gestão Kassab não quiseram se pronunciar ontem.
O valor total do contrato para a compra da sopa não foi informado pela prefeitura. Só na semana passada, Kassab destinou R$ 46 milhões ao programa.
A prefeitura também atendeu a outro apelo da Nestlé: a inclusão de pimenta na sopa com carne, que é produzida pela multinacional.
A liberação foi considerada "estranha" pela Pink Alimentos, uma das concorrentes da licitação. Em quase quatro décadas fornecendo merenda escolar no país, a empresa afirma desconhecer outros casos de inclusão do produto.
Nutricionistas consultadas pela Folha também disseram que a pimenta não agrega nenhum valor nutritivo à sopa.
Na sua solicitação para alteração do edital de compra da sopa, a Nestlé alegou que a redução dos componentes permitiria a participação na licitação dos maiores fabricantes do setor, que costumam trabalhar com menor proporção dos referidos nutrientes. Sugeriu, dessa forma, uma formulação mais próxima dos produtos vendidos por ela no varejo.
A Secretaria de Gestão, em resposta à solicitação da empresa, acata a sugestão "a fim de possibilitar a participação do maior número de participantes na licitação", conforme ata obtida pela reportagem.


Próximo Texto: Saiba mais: Programa pretende atender 130 escolas aos finais de semana
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.