São Paulo, sexta-feira, 12 de novembro de 2010

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Lobby da indústria afeta SUS, diz Anvisa

Segundo pesquisa da Anvisa, gestores de saúde e médicos são influenciados por meio de propagandistas e brindes

37,7% dos médicos dizem que podem sofrer influência e 67% levam em conta a divulgação na hora da prescrição

CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

A indústria farmacêutica influencia decisões dos gestores e dos médicos das unidades básicas de saúde do SUS (Sistema Único de Saúde). A conclusão é de uma pesquisa da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), financiada pelo FNS (Fundo Nacional de Saúde).
O estudo, obtido com exclusividade pela Folha, envolveu entrevistas com mais de 700 médicos, gestores e responsáveis pelas farmácias dos SUS de 15 capitais brasileiras. Entre os gestores, 75% relataram que recebem visitas mensais de representantes da indústria farmacêutica -só 15% deles são visitados por fabricantes de genéricos.
Em relação à interferência da propaganda na prescrição de drogas, 37,7% dos médicos admitem que podem ser influenciados por ela. Outros 67% afirmam considerar as informações das propagandas na hora da prescrição.
A partir desse retrato, a Anvisa, o Ministério da Saúde e os conselhos de secretários de saúde devem desenvolver ações no sentido de restringir essa influência, mas ainda não há definição de quais serão.
A distribuição de brindes que divulgam o nome de um determinado remédio é a estratégia mais usada pela indústria entre os gestores, o que contraria norma brasileira que permite a oferta de brindes desde que não veiculem propaganda de drogas.

ASSÉDIO
Embora a compra de medicamentos no SUS envolva comissões compostas também por outros profissionais, como secretários de finanças dos municípios, a Anvisa está convencida de que o assédio rende frutos à indústria.
"Se tem esse esforço da indústria [visitas e distribuição de material], é porque tem repercussão favorável a eles. Essa relação próxima confunde todo processo de seleção de medicamento", afirma Maria José Delgado, gerente-geral de monitoramento de propaganda da Anvisa.
Para Nelson Mussolini, do Sindusfarma (Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo), a propaganda é "ética e legítima". "O material promocional é a única forma de divulgar os medicamentos, já que a propaganda na mídia é proibida no país."
Entre os médicos, 41% recebem visitas de propagandistas no trabalho. Dos entrevistados, 64% têm consultório particular.
Para Roberto D'Avila, presidente do Conselho Federal de Medicina, o assédio acontece porque, quando faltam medicamentos no SUS, os pacientes são orientados pelos médicos a comprar fora.
"Na rede privada, estamos cansados de saber que há influência [da indústria]. Só não sabia que o assédio estava tão disseminado na rede pública", diz D'Avila.
Folders, amostras grátis e artigos científicos favoráveis ao remédio são a estratégia preferida com os médicos. Brindes e outras cortesias respondem por 9%.
Em 45,6% das propagandas não aparecem informações sobre efeitos colaterais da droga. "É perigosíssimo. A Anvisa tem que fiscalizar e punir", diz D'Avila.
Mussolini, do Sindusfarma, diz que a Anvisa já pune as indústrias que deixam de lado essas informações "por algum descuido".


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