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PASQUALE CIPRO NETO
Quem não lê até o fim...
Na última prova da Fuvest, realizada há quase um
mês, os candidatos tiveram de
responder à seguinte questão:
"Dos verbos assinalados, só está
corretamente empregado o que
aparece na frase:
a) A atual administração quer
crescer a arrecadação em 40%;
b) A economia latino-americana se modernizou sem que a estrutura de renda da região acompanhou as transformações;
c) Se fazer previsões sobre a situação econômica já era difícil
antes das eleições, agora ficou
ainda mais complicado;
d) A indústria ficará satisfeita
quando vender metade do estoque e transpor o obstáculo dos juros;
e) Por mais que os leitores se
apropriam de um livro, no final,
livro e leitor tornam-se uma só
coisa".
Qual é o seu voto, caro leitor? Se
ficou em dúvida logo na primeira
frase, é bom saber que pelo menos
três dicionários (o "Aurélio", o
"Houaiss" e o de Francisco Fernandes) registram "crescer" com
o sentido de "fazer crescer", "aumentar" e "fazer aumentar". O
"Aurélio" dá este exemplo: "O espetáculo tenebroso crescia o seu
pavor". O "Houaiss" dá estes: "O
talento da atriz há de crescer sua
beleza"; "O desprezo da namorada cresceu o ciúme do rapaz".
O "Dicionário de Verbos e Regimes", de Francisco Fernandes, dá
três exemplos eruditos desse emprego de "crescer". Um dos exemplos de Fernandes é de Vieira.
Consideradas as informações
dos três dicionários, a primeira
frase seria boa, já que nela o verbo "crescer" tem justamente o significado de "fazer crescer", "aumentar", "fazer aumentar".
Bem, vamos à segunda frase.
Nela, a locução "sem que" exige
que a correlação com "modernizou" se faça com "acompanhasse" ou "tivesse acompanhado":
"A economia latino-americana se
modernizou sem que a estrutura
de renda acompanhasse (ou "tivesse acompanhado') ...".
Chegamos à terceira frase, que
a Fuvest dá como correta -e é inquestionavelmente correta. Paga
pela pressa quem lê o começo e logo pára, supondo que seja incorreta a sequência "Se fazer previsões...". Não é o caso de empregar
o futuro do subjuntivo ("fizer"). A
forma "fazer", do infinitivo, faz
parte da oração que funciona como sujeito de "era" (o ato de fazer
previsões era difícil).
A disposição dos termos em outra ordem deixa claro o correto
emprego de "fazer": "Se antes das
eleições já era difícil fazer previsões sobre a situação econômica...". Percebeu? Experimente colocar "fizer" no lugar de "fazer".
Que tal? Não funciona. A lição
desse caso parece clara: quem não
lê até o fim sempre corre riscos.
Na quarta frase, temos uma velha conhecida: a família do verbo
"pôr", representada, no caso, por
"transpor". Os dois verbos introduzidos pela conjunção "quando" devem ser conjugados no futuro do subjuntivo: "...quando
vender o estoque e (quando)
transpuser os obstáculos dos juros". Todos os verbos terminados
em "por" devem seguir a conjugação do verbo "pôr".
Por fim, na quinta frase a forma
"apropriam", do indicativo, deve
ser substituída por "apropriem",
do subjuntivo, modo que põe o
verbo no plano da hipótese, possibilidade, suposição etc. É isso.
Pasquale Cipro Neto escreve nesta coluna às quintas-feiras.
E-mail - inculta@uol.com.br
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