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DANUZA LEÃO
Do que se é capaz
Você passa a vida aprendendo, ou melhor: se educando.
No início são as coisas mais elementares: não botar a mão no fogo porque queima, não provocar
o cachorro da vizinha que tem cara de bravo, e por aí vai.
Lembrar do tempo que se perdeu na praia ou pendurada no telefone, no lugar de estudar mais,
só chorando. E o pior é que essa
consciência só vem quando já é
tarde; aliás, se acha que é, porque
nunca é.
Que bom ler os livros, saber das
coisas. Não só ver como saber o
que há por trás delas, ou a razão
pelas quais elas existem.
O prazer da leitura. Com um
bom livro você enfrenta noites de
solidão na Patagônia e vence
qualquer depressão -se conseguir abrir o livro, claro.
Ah, se eles -que têm todo o
tempo do mundo- soubessem
que esse é o grande barato, infinitamente maior do que qualquer
rave de sexta-feira; vão saber um
dia.
Só que não é logo que fazemos a
descoberta de nossos autores prediletos, e por mais genial que um
deles seja, pode chegar na hora errada e não "bater".
Mas sempre existem outros, e
uma infinidade de coisas que se
pode aprender. A educar o ouvido, por exemplo.
É claro que se você crescer ouvindo as ricas melodias funk, vai
ser um adulto infeliz. Mas se tiver
a sorte de ter uma tia de bom gosto, que tenha guardado uns discos
antigos - já ouviu falar em
LP?- com uns belos Lupiscínios,
uns velhos Carlos Galhardo, uns
antigos tangos de Gardel, já vai
dar para sentir que o mundo tem
salvação. Isso para não falar dos
clássicos, coisa mais séria e que
exige tempo e concentração
maiores. Mas será um tempo que
você jamais vai lamentar como
perdido.
E existem os celestiais prazeres
do paladar. Dizem que estes só começam a se desenvolver depois
dos 18 anos -a não ser que você
tenha nascido na França. Lá, sobretudo no interior, uma criança
de cinco anos é capaz de devolver
o prato no restaurante se a carne
não estiver no cozimento certo, e
ainda discutir com o chef sobre de
onde vêm as melhores trufas. E o
vinho, então? Qualquer motorista
de táxi -até mesmo de Paris,
que, como todos sabem, não é
uma cidade conhecida por oferecer as melhores mesas e os melhores vinhos- sabe perfeitamente
se a safra de 68 dos Bourgogne foi
digna de ficar na história ou se é
apenas um artigo para enganar
japoneses.
Uma vez eu vi um programa de
uma hora inteira na televisão
francesa -sem comerciais- só
sobre gastronomia. Até aí, tudo
normal.
Só que os dois únicos convidados para falar sobre esse assunto
transcendental eram o presidente
Jacques Chirac e Helmut Kohl. O
então chanceler alemão, amante
de um bom chucrute e de uma
boa cerveja, terminou dando um
conselho: que os governantes não
devem ser escolhidos por serem de
esquerda ou de direita, mas por
possuírem ou não o gosto pela
boa mesa. Não deixa de ser um
ponto de vista.
Existem também o bom gosto e
as boas maneiras, que podem ser
adquiridos quando se tem a sorte
de conviver com pessoas verdadeiramente elegantes no traje e
sobretudo no trato, o que não tem
nada a ver com a conta no banco.
Quanto mais se sabe, mais se
quer saber, a vida vai ficando cada vez mais rica e nossas possibilidades, se ampliando. Antes de
fazer uma viagem, é preciso ler
sobre o país que se vai conhecer, e
é melhor viajar menos mas aproveitar mais. O mundo é cheio de
tesouros que estão em cada esquina, mas é preciso saber vê-los.
Aprenda, conheça, procure saber
sempre tudo, sobre tudo, mais,
sempre mais. Para isso é preciso
disciplina, o que também se
aprende.
Você pode dominar o mundo,
sabia? Só não vai conseguir, jamais, dominar seu coração.
E ainda bem.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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