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VIDA SECA
Brasil tem cerca de 31 milhões de pessoas vivendo em regiões susceptíveis à desertificação; ao todo são 1.482 cidades
Jarbas Oliveira/Folha Imagem
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Crateras provocadas pela desertificação no município de Gilbués, no sul do Piauí, região que possui o pior índice de degradação ambiental do Brasil |
Deserto pode afetar 16% da área do país
KAMILA FERNANDES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM GILBUÉS (PI)
A terra vermelha e quase sem
cobertura vegetal de Gilbués, no
sul do Piauí, parece se desmanchar ao abrir crateras e ondulações que avançam a cada dia sobre a cidade. É o efeito mais visível
de um processo de desertificação,
que consome a área e amplia a miséria da população mais carente.
A região de Gilbués (800 km de
Teresina) é um dos quatro núcleos de desertificação no país
(veja o quadro) onde a degradação ambiental e os resultados socioeconômicos do fenômeno são
considerados mais graves pelo
Ministério do Meio Ambiente.
Na sede de Gilbués, as crateras
já chegaram a um terreno atrás da
igreja central e derrubaram uma
casa no bairro Santo Antônio. Um
trecho da BR-135, a sete quilômetros do centro, teve de ser reforçado na última semana porque uma
cratera ameaçava a estrada.
Toda a região do semi-árido e
das áreas que sofrem os efeitos da
seca são consideradas susceptíveis à desertificação. Esse é um
problema que preocupa o mundo
inteiro e que, no Brasil, pode afetar 1,3 milhão de km2 (16% do total) e 31,6 milhões de pessoas, o
que representa 18% da população
no país, caso nada seja feito.
A erosão causada pelo processo
de desertificação, além de prejudicar o plantio de subsistência em
Gilbués, município com cerca de
10 mil habitantes, ameaça casas de
moradores. Miraci Ribeiro da Silva, 41, usa uma enxada e entulho
de construção para tapar parte
das crateras que se formaram no
quintal da casa onde mora com
cinco filhos e dois netos.
Ela não deixa o local, que é emprestado, porque não tem outro
lugar para ir. Todos da família vivem lá com os R$ 100 por mês que
a mulher ganha de faxinas e dos
benefícios sociais do governo. "Se
eu não tapar, depois da próxima
chuva, a gente não entra em casa."
Contrastes
A cidade é repleta de contrastes
ambientais e socioeconômicos.
Do lado mais pobre predomina o
terreno irregular, que se abre em
"grotas" (como a população chama as crateras e ondulações formadas pela desertificação). Na
parte mais alta e plana, começa
uma corrida por investimentos
em soja, com produtores do Sul
do país se instalando para aproveitar as terras baratas e férteis.
Não há emprego para todos.
"Outro dia, numa dessas fazendas
de soja, fizeram uma seleção para
contratar dois. Quando cheguei,
já havia mais de 15 na minha frente", afirma Arivaldo Rodrigues
Alves, 37. Quando chove, ele planta uma roça, mas, na maior parte
do ano, busca no garimpo de diamantes algum meio para a sobrevivência. "Faz quatro meses que
não acho nada."
A riqueza do diamante na cidade teve seu auge entre as décadas
de 40 e 50 e deixou marcas que até
hoje têm conseqüências.
A cada chuva, os buracos esquecidos se abrem ainda mais, formando enormes crateras. "Teve
muita gente que morreu soterrada por aqui", diz Ivete Oliveira,
que preside a ONG SOS Gilbués.
Entre os que insistem no garimpo está Juraci Barbosa da Cunha,
50. "Faço isso desde menino, assim como meu pai."
O garimpo não é a única causa
das deformações na terra de Gilbués. Em boa parte da área atingida nunca houve extração mineral.
"Entre os fatores que interferiram
está o mau uso do solo, tanto na
agricultura como na pecuária",
disse o professor Luiz Gonzaga
Carneiro, da UFPI (Universidade
Federal do Piauí).
Carneiro desenvolve em Gilbués, com a Fundação Agente e
apoios governamentais, um núcleo de pesquisas para recuperar o
solo, usando técnicas para o plantio, como curvas de nível e a criação de pequenas barragens.
A experiência começou no ano
passado, em uma área bastante
degradada. Desde então, algumas
mudas de leguminosas e de capim
plantadas estão se desenvolvendo. "Uma prova de que a terra é
fértil e pode ser recuperada."
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