São Paulo, sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Próximo Texto | Índice

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

Após 40 anos, Assembléia derruba a "lei da mordaça"

Projeto extingue dispositivo que pune servidores de SP que criticarem autoridades

Proposta depende da sanção do governador; presidente do sindicato dos professores compara lei a uma ameaça velada

JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Assembléia Legislativa de São Paulo aprovou anteontem à noite projeto que extinguiu a "lei da mordaça", criada há 40 anos, durante o regime militar (1964-1985), que pune os servidores públicos que concederem entrevistas ou criticarem autoridades ou seus atos.
O projeto, do líder do PT, Roberto Felício, agora segue para o governador José Serra (PSDB) -ele pode sancionar ou vetar a mudança, que extingue item do Estatuto do Servidor, de outubro de 1968.
Desde a abertura democrática, em 1985, o Estado já teve como governadores Franco Montoro, Orestes Quércia, Luiz Antonio Fleury Filho (todos eleitos pelo PMDB), Mário Covas, Geraldo Alckmin (ambos do PSDB), Claudio Lembo (DEM) e agora Serra, sem que a "lei da mordaça" fosse removida.
Embora não haja notícia recente de aplicação da lei, o instrumento é usado para constranger servidores, como professores e diretores de escola, a não criticar as condições de ensino. No caso em que alunos depredaram a escola Amadeu Amaral, em novembro, professores disseram à Folha que não falariam por temer punições.
Segundo Felício, o dispositivo intimida o funcionalismo. "É uma forma de censura à livre manifestação", diz ele.
Em janeiro, a ONG Artigo 19 entregou ao relator especial da ONU em direito à educação, Vernor Muñoz, abaixo-assinado com 1,5 mil adesões de acadêmicos e juristas contra o Estatuto do Servidor de SP.
O presidente da Apeoesp (sindicato dos professores), Carlos Ramiro de Castro, comparou a lei a uma ameaça velada. "É como um chicote que o pai deixava na porta para o filho ver e, se aprontasse...."
Na semana passada, a secretária da Educação, Maria Helena de Castro, disse em audiência na Assembléia ser contra a lei. "Fiquei chocada, quando entrei na secretaria, ao descobrir que esse instrumento da época da ditadura militar ainda estava em vigor."
O secretário da Casa Civil, Aloysio Nunes Ferreira, disse por assessores que o governador só vai decidir sobre o projeto quando receber o texto. O governo também diz que a lei não foi usada na gestão Serra.
O artigo 242 do estatuto diz: é proibido ao servidor "referir-se depreciativamente, em informação, parecer ou despacho, ou pela imprensa, ou qualquer meio de divulgação, às autoridades constituídas e aos atos da administração, podendo, porém, em trabalho devidamente assinado, apreciá-los sob o aspecto doutrinário e da organização e eficiência do serviço." Caso infrinja a legislação, o funcionário fica sujeito a penas de repreensão, suspensão, multa e até mesmo demissão.
O procurador federal Carlos André Magalhães, especialista em direito administrativo e público, diz que a lei não deve ser nem tão restritiva nem permitir excessos. Ele cita o caso de um procurador de prefeitura que se manifesta contra a cobrança de um imposto. "Isso abre caminho para que o contribuinte passe a questionar o tributo, o que contraria o interesse da administração".
Por outro lado, atos como a elaboração do Orçamento "podem e devem ser questionados", diz Magalhães, por trata-se de opinião. "É o posicionamento do cidadão."


Próximo Texto: Deputados aprovam bônus para educação
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.