São Paulo, sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

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Para chanceler, há evidências de xenofobia

Celso Amorim pediu rapidez à Suíça na investigação do caso da brasileira que sofreu cerca de 100 cortes por canivete

A advogada, que mora legalmente no país, estava grávida de gêmeos, no terceiro mês de gestação; ela perdeu os bebês

Patrick B. Kraemer/AP Photo
A estação de Stettbach, próxima a Zurique, na Suíça, onde a polícia local encontrou a brasileira

SOFIA FERNANDES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
MALU DELGADO
ENVIADA ESPECIAL A ZURIQUE

O chanceler Celso Amorim disse ontem que há claras evidências de xenofobia na agressão contra a advogada brasileira Paula Oliveira, 26, na Suíça.
"A moça não foi assaltada, aparentemente não houve estupro. Não que essas outras coisas diminuíssem o caso, apenas denotam outra motivação."
O ministro das Relações Exteriores telefonou para a cônsul-geral do Brasil na Suíça, Vitória Cleaver, pedindo que exija rapidez na investigação -nos meios diplomáticos, isso só ocorre em casos excepcionais.
Paula diz ter sido espancada e cortada com canivetes na segunda à noite em Dübendorf por três rapazes carecas, que ostentavam suásticas tatuadas.
A advogada, que mora legalmente no país, estava grávida de gêmeos, no terceiro mês de gestação. Ela perdeu os bebês e agora carrega cerca de cem marcas pelo corpo, de acordo com o pai da vítima, o assessor parlamentar Paulo Oliveira.
Nas pernas, os cortes formam a sigla SVP, iniciais em alemão do Partido Popular Suíço, de direita, contrário à presença de imigrantes no país.
Nos últimos anos, o SVP promoveu uma série de propagandas racistas. Em uma delas, ovelhas brancas chutavam para fora do mapa da Suíça ovelhas negras. Em outra, o partido afirma que o aumento da criminalidade na Suíça ocorreu por causa da imigração.

Grave e chocante
Amorim, que considerou o crime "grave" e "chocante", disse que, caso fique provado que a agressão teve motivação xenofóbica, o crime ganha proporções muito mais graves.
Constatada a xenofobia, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos pode entrar no caso, no sentido de pressionar a Suíça a endurecer a repressão a esse tipo de ato. "É preciso que fique claro que haverá uma investigação em todos os aspectos", afirmou.
Vitória Cleaver afirmou que autoridades policiais que conduzem as investigações do caso disseram ontem que já há uma lista de "testemunhas indiretas" que serão ouvidas, pois Paula estava sozinha na estação de trem no momento em que foi abordada. "A polícia tem cooperado. A conversa inicial não foi muito satisfatória. Mas hoje o nível da conversa foi elevado", disse à Folha. A polícia suíça, relatou Vitória, enfatizou que conduzirá o caso com extremo sigilo, sobretudo para proteção de Paula e seus familiares. No entanto mostra-se disposta a concluir as investigações, disse a cônsul. "Vamos insistir exaustivamente nisso", reiterou ela.
O encarregado de negócios da Embaixada da Suíça, Claude Crottaz, disse, antes mesmo de ser questionado sobre a motivação da agressão, que o país condena todo tipo de racismo.
Segundo ele, as investigações estão sendo conduzidas e ainda não há nenhuma conclusão, mas, caso seja constatado racismo, o episódio "não deve ser julgado de forma leve". "Isso é muito grave", disse Crottaz, que aceitou ontem o convite do Itamaraty para conversar sobre o caso.
O presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, deputado Marcondes Gadelha (PSB-PB), entregou pessoalmente ontem um protesto à embaixada.
O deputado se diz muito surpreso com o comportamento da polícia suíça e do pouco caso que a imprensa europeia tem dado ao assunto.
Crottaz, que está substituindo o embaixador enquanto este faz uma viagem, pediu ao deputado que não enxergue o país como xenofóbico, já que 25% (cerca de 1,5 milhão) da sua população é de imigrantes.
Não negou, contudo, a ação preocupante de grupos neonazistas, e disse que até os suíços partidários de uma maior abertura do país a imigrantes sofrem agressões.
"Não vamos deixar essa coisa barato", disse o deputado, dizendo estar receoso de que a Europa passe a tratar esses casos como corriqueiros.
Gadelha aproveitou a visita à embaixada para pedir que o Partido Popular, que ocupa 40% do parlamento suíço, se pronuncie sobre o caso.


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