São Paulo, domingo, 13 de setembro de 1998

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Leonardo Colosso/Folha Imagem
A produtora Flávia Ceccato, que gosta da estética sodomasoquista, mas considera a prática muito pesada


SADOMASOQUISMO
Estilização transforma transtorno em fonte de inspiração para casais, moda e jogos adolescentes na TV
Culto à dor troca pancadaria por fantasia

ANTONINA LEMOS
AURELIANO BIANCARELLI
da Reportagem Local

O couro e o espartilho dos rituais sadomasoquistas estão saindo do escuro dos guetos para a moda das ruas e a cama dos casais. Numa versão mais fantasia e menos pancadaria, correntes, máscaras e chicotes inspiram estilistas e animam jogos sexuais e programas de TV.
O culto à dor e à humilhação, que identifica a prática sadomasoquista, é classificado pelos psiquiatras como "transtorno de preferência" sexual. É um desvio que precisa de tratamento quando vira uma prática exclusiva e obsessiva. Passa a ser patológico quando a dor não traz mais prazer.
No trajeto do gueto para a cama dos casais, o sadomasoquismo virou sigla -S&M-, ocupou espaço na Internet, ganhou coluna de revistas, classificados próprios e ampliou os ganhos e a variedade dos produtos de sex shops.
A figura da dominatrix (leia glossário abaixo), de salto alto, roupa de couro preto e chicote virou quase "família" e chegou ao horário vespertino da televisão.
No programa H, exibido pela TV Bandeirantes, a personagem Tiazinha -com fantasia de dominadora- faz sucesso brincando de torturar os adolescentes que participam do programa.
Na rede de sex shop Ponto G, que tem cinco lojas na cidade de São Paulo, a venda de produtos S&M cresceu cerca de 70% no último ano. A rede vende desde algemas de pelúcia até cintos de castidade importados.
Nos classificados pessoais dos jornais, o sadomasoquismo é o fetiche que tem maior número de anúncios publicados.

Parafernália
Os consumidores, no entanto, não são necessariamente adeptos do sadomasoquismo pesado. Embora não haja pesquisas a respeito, sabe-se que a parafernália S&M é mais empregada nos jogos eróticos, hetero e homossexuais.
Entre os lençóis das pessoas classificadas como normais, a adoção de práticas sadomasoquistas leves pode temperar as relações, lembram alguns especialistas. "É uma forma de não deixar a sexualidade acabar", diz o médico e psicoterapeuta Moacir Costa.
"Atitudes ou fantasias sadomasoquistas permeiam a grande maioria das relações sexuais das pessoas", afirma Carmita Abdo, coordenadora do Prosex, um projeto de sexualidade do Instituto de Psquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Moda
O cenário, os objetos e a fantasia que compõem o sadomasoquismo não poderiam escapar ao olhar dos estilistas de alta costura. Criadores conceituados, como Alexander McQueen e Jean Paul Gaultier associam S&M a glamour em suas coleções.
No Brasil, a moda já conquistou seguidores. É esse o caso da produtora Flávia Ceccato, 26, que adotou no dia-a-dia roupas de borracha, preto e salto muito alto.
"Admiro essa estética, acho bonito, sensual e provocativo", diz Flávia, que compra a maioria de suas peças no exterior. Ela conta que já chegou a frequentar festas sadomasoquistas em Londres, mas que é mais atraída pelo lado fashion do S&M. "A filosofia dos adeptos é muito pesada."
O escritor S., 25, também compra acessórios importados. Só que com outro objetivo. "Gosto de ser dominado, é uma fantasia."
Os acessórios sadomasoquistas podem ser encontrados também na Internet. Sites brasileiros como o ViaSexy vendem pela rede kits S&M, compostos por algema, coleira e tornozeleira, por R$ 98,70.
A moda do sadomasoquismo irrita os adeptos sérios da prática. "Tem muita gente em grupos na Internet que não leva a prática a sério", diz a dominatrix Rainha Laura, que trabalha como dominadora há 11 anos. Laura diz atender sete clientes por semana. A maioria, homens casados.
Os clubes de sadomasoquismo não existem só nos guetos do centro da cidade. Em uma rua movimentada da zona sudoeste de São Paulo, um bar dedica uma noite por semana aos adeptos do S&M.




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