São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Políticas ultrapassadas contribuem para enchentes

CRISTINA MORENO DE CASTRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Imagine um túnel entre o rio Tietê e o porto de Santos só para escoar água. Na década de 1920, políticos imaginaram que esta poderia ser uma solução para o problema das enchentes em São Paulo. Não sabiam o que resultaria disso, mas outras políticas implementadas desde o início do século passado contribuem até hoje para inundar a cidade, segundo arquitetos e urbanistas ouvidos pela Folha.
Quem consolidou os projetos de urbanização da cidade foi Prestes Maia, prefeito entre 1938 e 1945. Ele criou e implementou o "Plano de Avenidas", que promoveu a canalização de córregos e construção de avenidas nos fundos de seus vales.
"Ele não tinha condição de entender que um dia toda essa região ficaria impermeabilizada por causa da pavimentação e dos loteamentos e, portanto, os fundos de vale receberiam a água muito rapidamente", diz o arquiteto e urbanista Jorge Wilheim. "O fundo do vale teria que ter tido parte reservada para absorver a água".
Para Regina Meyer, professora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP), o modelo sobrecarregou os rios Tietê, Pinheiros e Tamanduateí, "porque a canalização faz com que a água dos córregos chegue mais depressa aos grandes rios". Ela acredita que a canalização tenha sido feita de forma "aleatória", sem abranger todos os trechos, empurrando as enchentes para outros pontos. O professor da FAU Candido Malta Campos Filho concorda: "Eliminam as microenchentes e agravam as macroenchentes."
Já o professor de planejamento urbano da Escola Politécnica da USP Witold Zmitrowicz acredita que a canalização não seria um problema se as áreas às margens dos rios não tivessem sido loteadas e habitadas tão rapidamente. Em 1945, São Paulo tinha 1,6 milhão de habitantes, número que dobrou nos 15 anos seguintes. Construções para abrigar essa população impermeabilizaram o solo.
O plano de Prestes Maia de tornar o Tietê mais reto, seus afluentes canalizados e as margens livres para construção de casas encontrou resistência de outro engenheiro, Anhaia Mello. Ambos lecionavam na Escola Politécnica, e Mello acabaria fundando a FAU.
Candido Malta, que foi aluno de Mello, conta que ele defendia a existência de lagoas e parques ao longo dos canais, para reterem a água, a partir de um projeto elaborado por Saturnino de Brito. Chegou a colocar em prática suas ideias quando foi prefeito, por alguns meses (1930-1931). "Era uma disputa entre duas linhas: São Paulo não pode parar e São Paulo deve crescer de forma controlada. Prestes Maia venceu" -e Mello foi tirado do cargo.


Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Danuza Leão: Um mundo mais especial
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.