São Paulo, segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

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Infectologista defende vacina obrigatória

Para Vicente Amato Neto, o governo deveria exigir certificado de vacinação contra febre amarela a quem for a regiões endêmicas

"Ninguém pode dizer que não existe risco [de febre amarela urbana] quando doentes vêm de áreas silvestres para lugares com "Aedes"

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O médico Vicente Amato Neto, 80, um dos infectologistas mais renomados do país, defende que o governo federal exija o certificado de vacinação a quem for a trabalho ou a passeio em regiões endêmicas de febre amarela como forma de evitar a proliferação da doença.
De acordo com o Ministério da Saúde, entre 1996 e 2007, o país registrou 349 casos de febre amarela em pessoas que entraram nas matas e não tinham sido previamente imunizadas.
Professor aposentado pela USP e pesquisador do Instituto de Medicina Tropical da mesma universidade, ele diz que o momento é de preocupação porque a infestação do mosquito "Aedes aegypti" (que transmite dengue e febre amarela) é alta em áreas urbanas do país, o que pode facilitar o aparecimento da doença na cidade. "Rezemos para que isso não aconteça." A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha.

FOLHA - Não falta uma divulgação maior sobre a necessidade de vacinação contra a febre amarela para quem vai a regiões endêmicas ou mesmo uma exigência das autoridades de saúde?
VICENTE AMATO NETO
- Para ir para o exterior é obrigatório. Se não estiver vacinado, não viaja. Aqui não é obrigatório. Evidentemente que nós sabemos que tem que ser assim: viajou para áreas endêmicas e de transição, tem que vacinar, mas isso não é respeitado. Os casos estão aí. É um perigo, uma preocupação, que os casos de febre amarela silvestre estejam acontecendo dessa maneira.

FOLHA - O país não deveria tornar obrigatória a vacina para quem vai a áreas endêmicas e de transição?
AMATO NETO
- Essa é uma atitude que precisa ser revista, mas eu penso que a exigência deva existir. É um problema que está em foco hoje. Proibir ou não, é o governo que, diante do que está acontecendo, vai tentar considerar essa questão como prioritária. De qualquer forma, sem dúvida é preciso intensificar a divulgação da necessidade da vacina para quem vai para essas regiões endêmicas.

FOLHA - O sr. acredita na possibilidade de uma epidemia urbana da doença, causada pelo "Aedes"?
AMATO NETO
- Pois é, de repente vemos uma situação como essa, que sempre foi motivo de preocupação. Temos "Aedes" sobrando no Brasil, uma disseminação enorme. É um temor que sempre tivemos, pacientes que adquiriram a doença em lugares silvestres, que viessem a ser tratados em uma área urbana onde existe o "Aedes". Temos esse caso em São Paulo. Deve haver um isolamento muito rigoroso da paciente. Vamos almejar que esse caso fique por aí. Mas não podemos dizer que esse risco [febre amarela urbana] não exista. Ninguém pode dizer que não existe risco [de febre amarela urbana] em uma situação em que doentes vêm de áreas silvestres e vão para lugares com "Aedes". Rezemos para que isso não aconteça.

FOLHA - Com esse aumento de casos, não é preciso voltar à discussão sobre a vacinação em massa?
AMATO NETO
- É um assunto que deve entrar em cogitação agora. O ministro da Saúde, com toda cautela, diz que não há motivo para temor. Tudo bem que essa é a posição dele para não causar alarde. É algo que precisa ser considerado agora. Mas será necessária uma porção de coisas, como por exemplo, uma maior produção de vacinas. Temos que esperar um pouquinho mais para ver, como fica a situação atual, se tem evolução.

FOLHA - O que tem que ser feito para evitar mais casos da doença?
AMATO NETO
- Combater mosquitos em área silvestre é impossível. Por isso é fundamental o diagnóstico precoce. Começou a morrer macacos, é importante fazer o diagnóstico de febre amarela bem depressa. Tenho visto um pouco de demora nos diagnósticos. O que tem que fazer é brecar a entrada em áreas silvestres sem proteção. Na área urbana, também é muito difícil a erradicação do "Aedes", quase impossível.

FOLHA - A rede de saúde brasileira está preparada para atender a doença, cuja letalidade é de 50%?
AMATO NETO
- Os médicos precisam estar muito bem alertados para o diagnóstico bem rápido de febre amarela. É preciso saber tratar de verdade porque é uma doença muito grave. Os que são salvos, em geral, o são porque há uma assistência adequada. O Ministério da Saúde divulga como deve ser feito o tratamento, mas, infelizmente, há regiões em que isso não acontece. Nos hospitais é absolutamente necessário que existam sistemas de isolamentos rigorosos. Essa é uma deficiência no país. Quando há necessidade de isolar pacientes, em um grande número de hospitais, há uma improvisação.


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