São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 2009

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Perícia nega gravidez e sugere automutilação

Legista da polícia suíça diz que dois exames comprovaram "a inexistência" da gravidez alegada por advogada brasileira

Embora a possibilidade de agressão não tenha sido descartada, polícia deixou claro que o principal eixo da investigação é automutilação

Blog do Noblat
Marcas feitas com estilete nas pernas de Paula Oliveira

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A ZURIQUE

A polícia suíça afirmou ontem que a advogada pernambucana Paula Oliveira não estava grávida no dia da agressão que afirma ter sofrido e que provavelmente ela mesma provocou os cortes em seu corpo. O legista responsável pelo laudo disse que dois exames comprovaram "a inexistência" da gravidez alegada por Paula, e que há indícios de automutilação.
Segundo a versão apresentada por Paula, ela foi agredida por três homens brancos de cabeça raspada na segunda-feira, quando saía de uma estação de trem num subúrbio de Zurique.
Após espancá-la, os agressores, um deles com uma suástica tatuada na nuca, teriam feito cortes por todo o seu corpo, onde marcaram com uma navalha a sigla do partido ultranacionalista suíço SVP (Partido do Povo Suíço), o maior da Suíça. Paula contou ainda que estava grávida de três meses de gêmeos e que, por conta dos chutes que levou, ela sofreu um aborto no banheiro da estação.
Mas numa concorrida entrevista coletiva concedida ontem, a polícia de Zurique expressou sérias dúvidas sobre a versão de Paula, uma advogada de 26 anos nascida em Recife, que trabalha e vive em situação legal na Suíça há dois anos. Embora a possibilidade de agressão não tenha sido descartada, a polícia deixou claro que o principal eixo da investigação é o da automutilação.
Três homens chegaram a ser detidos na noite de segunda, mas foram liberados por falta de provas. Paula continua internada em Zurique e, embora não sofra nenhum problema grave de saúde, "está muito nervosa", disse ontem a cônsul do Brasil na cidade, Vitoria Cleaver. Segundo a diplomata, ontem à noite Paula ainda não havia sido informada do resultado dos exames da polícia.
Especialista do Instituto de Medicina Forense da Universidade de Zurique, o legista Walter Bär disse na entrevista coletiva ter poucas dúvidas de que os cortes sofridos por Paula foram feitos por ela mesma.
Segundo ele, a investigação continua, mas algumas características dos ferimentos levam a crer que eles foram de autoria da própria advogada, como a simetria dos cortes e o fato de estarem em áreas do corpo ao alcance das mãos de Paula.
Para Bär, esses e outros detalhes qualificam o caso de Paula como um "exemplo clássico" de automutilação. "Essa é uma conclusão provisória, mas segunda a longa experiência dos médicos, é possível colocar em primeiro plano a possibilidade de automutilação", afirmou. "Mas há a possibilidade de que outros fatores venham a contradizer [esses fatos]".
Questionado pela Folha se era capaz de afirmar com 100% de certeza que Paula fez os cortes em seu próprio corpo, Bär disse que não, mas acrescentou: "Ficarei muito surpreso se estiver errado".
Em relação à gravidez, porém, ele diz não ter dúvidas. "Com base nos exames, não havia gravidez no momento do suposto acontecimento", disse Bär. Um segundo exame comprovou a "a inexistência da gravidez no momento do acontecimento", acrescentou.
Após passar o dia no Hospital Universitário de Zurique, onde Paula está internada, a cônsul Vitoria Clever admitiu ter se surpreendido com o resultado dos exames, mas ressaltou que a investigação não está concluída. Ela disse confiar nas autoridades suíças.
"Neste momento não há razão que leve o Consulado a crer que a polícia esteja agindo de má fé. Mas eles não têm uma posição conclusiva sobre a agressão", disse ela, que também pediu um "voto de confiança" para a brasileira. "Precisamos dar um tempo para a Paula ter as ideias mais claras".
A divulgação do caso mobilizou o governo brasileiro. Na quinta, o chanceler Celso Amorim afirmou que havia claras evidências de xenofobia no caso e chegou a dizer que levaria o caso à ONU.
Segundo o comandante da polícia de Zurique, Philipp Hotzenkocherle, se ficar comprovado que Paula mentiu, ela poderá sofrer ações legais por "falsa denúncia e engano de autoridades judiciais".


Leia a íntegra da nota oficial da polícia suíça
www.folha.com.br/090446

Colaborou Malu Delgado




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