São Paulo, domingo, 14 de março de 2004

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CIDADANIA

Decisão da Justiça gaúcha permite a cônjuge francês de gaúcho pedir visto permanente e comprar bens em conjunto

Casal gay desfruta vantagens da união civil

LÉO GERCHMANN
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PORTO ALEGRE

O agente de turismo Farid Ait-El-Haidi, 27, e o aviador Paulo Ricardo Garcia Carneiro, 29, unidos formalmente como casal por registro em cartório desde o último dia 5, pretendem, nesta semana, passar do sentimento de "quase felizes" para o de "completamente felizes". As conseqüências práticas da união civil já sacramentada começarão a aparecer.
A partir de amanhã, com o famoso "papel passado", Farid, que é francês e conta com um precário visto brasileiro de turista, poderá pleitear o permanente e adquirir bens em conjunto com seu companheiro. Ou seja, os dois já se sentem habilitados a fazer planos como qualquer outro cidadão.
O que mudou a vida de pelo menos dez casais homossexuais que já se uniram em cartório em pouco mais de uma semana foi o parecer da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, do último dia 4, que orienta os cartórios gaúchos a registrar uniões de casais do mesmo sexo. Na prática, o registro em cartório funciona como uma declaração de união afetiva e duradoura, com o casal registrando suas vontades.
Amanhã, quando Carneiro retorna de um vôo a Porto Alegre, os dois vão tratar dos seguintes projetos: dependência de Farid no plano de saúde de Carneiro, Previdência e casa própria. Mais: Farid buscará, na nova condição, seu visto permanente.
"Pronto, poderemos nos sentir mais seguros e tocar nossa vida como qualquer outro casal", diz Farid, no apartamento de um dormitório que eles alugam em um bairro periférico de Porto Alegre, o Intercap.
Atualmente, como tem visto de turista, Farid viaja trimestralmente para o exterior (Uruguai, Argentina, Paraguai ou França) só para voltar e renová-lo.
"Por enquanto, sinto-me inseguro. Em Paris, eu era agente de viagem. Aqui, cuido da casa. Quero poder trabalhar fora. Até agora, se o Paulo resolvesse dizer para eu deixar o apartamento, eu ficaria absolutamente sem nada. Desde o dia 5, temos tudo o que há no apartamento e o carro dividido em 50%. É claro que não penso em uma crise conjugal, mas estou nas mãos do Paulo", afirma.
O casal está há cinco anos e quatro meses juntos. Farid mora há sete no Brasil. A união civil de Farid e Carneiro teve até direito a festa no último dia 5.
Os dois se reuniram com os amigos Adolfo Bondan, 45, e Marcos Rezende, 44, estouraram uma champanhe e cortaram bolo. Bondan, que é professor, e Rezende, que é aeronauta, também sacramentaram sua união, após 20 anos compartilhando a vida em comum, vivendo como casal.
Nem todos os casais de homossexuais, porém, já fazem planos a curto ou médio prazo.
Muitos preferem ter cautela, como qualquer casal heterossexual, e prolongar a fase do namoro antes de tomar uma decisão.
"Nós não pensamos para já em união civil porque namoramos há pouco tempo. Mas vibramos com a novidade. É uma maravilha termos essa perspectiva. Nosso envolvimento é de apenas um ano e dois meses. A união é coisa séria", afirma o ator Fernando Tecoits, 30, que namora o também ator Alex Konze, 23.
São a mesma situação, circunstância e discurso do casal Rodolfo Mello, 26 (comerciante e produtor de eventos), e David Pereira, 20 (cabeleireiro). Eles namoram há nove meses e querem se conhecer melhor. "Não é porque temos uma novidade dessas que vamos agir prematuramente. Todo o casal, para se unir, tem de pensar bem antes", diz Mello.



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