São Paulo, domingo, 14 de abril de 2002

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EDUCAÇÃO

Gabriel Chalita diz que gastará R$ 10 milhões para tentar afastar a violência das escolas e atender pedido de Alckmin

Em São Paulo, novo secretário prioriza a segurança

ARMANDO PEREIRA FILHO
DA REPORTAGEM LOCAL

O aumento no aparato de segurança nas escolas estaduais de São Paulo -câmeras de vídeo, alarmes, zeladorias- é determinação direta do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), que pediu empenho a todos os seus secretários para cuidarem desse aspecto em suas pastas.
A revelação é do novo secretário estadual da Educação, Gabriel Chalita, 32, que assumiu o cargo na semana passada. Uma de suas três prioridades anunciadas, nos 8,5 meses que terá até o fim do governo atual, será justamente o combate à violência, ponto considerado importante para a imagem do governador, que vai disputar a reeleição. "Olha, há um pedido do governador para todas as secretarias nesse sentido mesmo [reforçar o cuidado com a segurança]. E isso acho que não tem a ver com o período eleitoral."
Chalita, responsável pela política para 6 milhões de alunos da rede pública, diz ser preferível ensinar valores sociais a disciplinas tradicionais. "Se [o aluno] sair da escola e não souber algumas coisas de matemática, de química, de física, mas se souber desenvolver seu senso crítico, ele vai ser muito melhor para a sociedade do que se tiver decorado essas coisas e não souber o essencial."
O secretário usa o argumento para defender a polêmica progressão continuada, o método das escolas estaduais de São Paulo, que dispensa provas anuais e só faz um teste no final de um ciclo (na 4ª e 8ª séries, por exemplo).
Ele diz que o desinteresse dos estudantes é causado por um jeito de dar aula que considera antiquado. "O aluno precisa ser mais seduzido para a educação."
Leia trechos de entrevista concedida na quinta-feira, na Secretaria da Educação (centro de SP).

Folha - Pais e professores duvidam da eficácia do sistema educacional do Estado; um terço dos alunos de 4ª e 8ª séries não conseguiu ser aprovado em 2001; o sindicato docente reclama de salários e diz que a infra-estrutura nas escolas é precária; a violência e as drogas cercam os colégios. O senhor tem 8,5 meses até o fim do governo Alckmin. O que dá para fazer diante de um quadro desses?
Gabriel Chalita -
O grande desafio de qualquer governo sério é um investimento profundo em educação. O orçamento da Secretaria da Educação de São Paulo é gigantesco [R$ 7,5 bilhões neste ano]. Por outro lado, temos 6 milhões de alunos, 6.000 escolas. Todos os problemas são grandiosos.
Acho que o governo do Estado vem acertando muito na sua política educacional. A progressão continuada eu não acho que seja ruim, muito pelo contrário. Numa visão mais contemporânea da educação, a gente precisa educar o aluno de forma heterogênea. E a educação continuada leva isso em consideração. Cada aluno é único.
Não dá para avaliar esse aluno como se ele fosse uma massa. Então, a progressão continuada leva o professor a fazer uma reflexão dele mesmo com relação à importância que tem em ajudar o aluno a se desenvolver, a aprender. É um processo que temos um ciclo todo para ir refletindo a respeito de onde estão as dificuldades de aprendizagem desse aluno.

Folha - Quais são as prioridades de sua gestão?
Chalita -
A gente está colocando três grandes metas:
1) Valorização do professor. O professor é a alma da escola. O ganho salarial da categoria neste governo é inegável.
2) Educação com aprendizagem significativa. A educação se preocupou por muito tempo com a habilidade cognitiva, o conhecimento memorizado. A preocupação de que o aluno saiba português, matemática, química, física, biologia, o que é legítimo. Acho que esse conhecimento não pode ser negligenciado, mas acima de tudo é preciso trabalhar o aluno no seu conceito de cidadão. A formação do cidadão vai ajudar no problema da violência, da corrupção, da agressividade, das drogas.
A escola tem preocupação tão grande com aquela matéria que o aluno está decorando e ela esquece que ele é um ser humano, ele precisa ser formado para isso. Se ele sair da escola e não souber algumas coisas de matemática, de química, de física, mas se souber desenvolver seu senso crítico, se tiver habilidades, ele vai ser muito melhor para a sociedade do que se ele tiver decorado essas coisas e não souber o essencial.
3) Segurança nas escolas. A gente sente de pesquisas realizadas com pais de alunos essa preocupação enorme que tem a família com relação à escola. Então, a gente quer ter algumas medidas para que se minimize esse problema. Ronda escolar, presença mais forte da polícia em algumas escolas mais vulneráveis, a instalação de câmeras de vídeo, que já aconteceu em quase todas as escolas mais problemáticas do Estado [estão implantadas em 1.970 escolas do Estado; 970 na Grande SP; a meta é chegar a 2.000 até maio], a construção de zeladorias. A escola também precisa ser uma luz na comunidade a que está ligada.
Essa consciência de que a escola e a família precisam trabalhar juntas é fundamental, porque hoje um dos grandes problemas da escola é receber filhos de famílias desestruturadas.
Oito meses e meio é bastante tempo para que essas medidas sejam implementadas.

Folha - A prioridade para a segurança é um pedido do governador Alckmin durante um ano eleitoral?
Chalita -
Há um pedido do governador para todas as secretarias nesse sentido mesmo. E isso acho que não tem a ver com eleição. É uma questão da responsabilidade que ele tem como governante de um Estado como São Paulo.

Folha - Quanto a Secretaria da Educação vai gastar com estrutura física para segurança (câmeras, alarmes, zeladorias)?
Chalita -
R$ 10 milhões.

Folha - A concentração de esforços em segurança não pode comprometer investimentos em questões educacionais?
Chalita -
Acho que não. Os gastos da secretaria são monstruosos. A questão financeira não é um problema para o Estado com relação à educação. É uma prioridade mesmo. O governo não tem economizado com relação à educação. Então, pegar R$ 10 milhões e colocar na segurança das escolas é alguma coisa que tranquiliza pais, professores, diretores. É dinheiro bem gasto.

Folha - A Apeoesp [sindicato dos professores] diz que a progressão continuada é só uma aprovação automática. O sr. vai mudar algo na forma em que ela funciona?
Chalita -
Se há necessidade de evolução, é com relação ao professor. Antigamente, você separava por nível os melhores alunos dos piores alunos. Hoje, a progressão continuada leva o professor a considerar esse aspecto: eu tenho de educar cada aluno individualmente.
O que falta para essa evolução é que o professor esteja cada vez mais bem preparado, para que trabalhe alunos tão diferentes.
O que faz a progressão continuada? Eu tenho 30 alunos e preciso conhecer a história de cada um deles, preciso ajudar os mais frágeis. Dou a mesma coisa para todos os alunos e avalio: quem é bom passa, quem é ruim fica.
"Ah, mas, se eu passar todos eles, todos eles vão ter problema. Então, vou ter gente analfabeta." Vai mesmo. Vai haver gente que chega à faculdade com problemas de alfabetização. E isso não é de hoje. Sou professor universitário e fico assustado com alguns alunos que chegam à faculdade. Tem gente que sai da faculdade ainda com os mesmos problemas.

Folha - O sr. afirma que um dos pilares da progressão continuada é a avaliação individual. A Apeoesp diz que justamente o sistema não funciona por questões estruturais. As salas teriam de 45 a 50 alunos, quando o ideal seria de 25 a 35.
Chalita -
Vou pedir que a Apeoesp aponte essas salas superlotadas. O mapeamento que temos revela que não há superlotação [a média seria de 33,1 alunos por classe na 1ª à 4ª séries e de 39,2 alunos no ensino médio". O sindicato diz que há superlotação, mas não aponta as escolas.

Folha - O sr. acha que o professor precisa mudar de mentalidade?
Chalita -
Acho que o professor precisa ser mais valorizado, ele se valorizar, ele se cobrar um pouco mais como educador. Ninguém pode se acomodar. Há professor que tem prática há dez anos, e os alunos não estão aprendendo há dez anos. O professor, quando coloca a culpa no aluno, não evolui.

Folha - Como tornar o aluno mais interessado em aprender?
Chalita -
O aluno precisa ser mais seduzido para a educação. De repente, tudo foi evoluindo demais no mundo, e a forma de educar é inflexível. Eu posso educar no parque Hopi Hari. A gente vai fazer uma parceria com o projeto Aprendiz e o Hopi Hari. Vamos ter 100 mil ingressos para levar professores e alunos para ver formas de aprendizagem lúdica. Aprender física na montanha-russa, aprender história e geografia em museus dentro do parque.


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