São Paulo, segunda, 14 de julho de 1997.



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OPINIÃO
Saída para fracasso escolar

MARIA ALICE SETÚBAL

No Brasil, todos aqueles que se preocupam em debater um projeto de desenvolvimento para o país, tocam, em maior ou menor medida, no problema da enorme desigualdade que caracteriza a estrutura socioeconômica brasileira até os dias de hoje.
As transformações na economia mundial demonstram como o atual processo de globalização está assentado no uso intensivo do conhecimento científico e tecnológico. O Brasil hoje busca respostas concretas e visíveis para resolução de problemas sociais estruturais a curto prazo, para não se situar definitivamente fora do cenário principal da história mundial.
Para alcançar verdadeiramente esse objetivo, temos uma longa caminhada, que nos leva inevitavelmente para projetos de base, muitas vezes sem o charme de inovações tecnológicas ou dos teóricos da moda, mas que, de fato, são capazes de enfrentar problemas cruciais como o fracasso escolar traduzido pela persistência, ainda hoje, de elevadas taxas de repetência e evasão escolar. É dentro desse contexto que a Secretaria de Estado da Educação de São Paulo desencadeou a partir de 1995 uma série de ações, dentre as quais o Projeto de Reorganização da Trajetória Escolar no Ensino Fundamental: Classes de Aceleração.
O objetivo é corrigir o fluxo escolar, eliminando a defasagem idade/série, criando condições para que alunos multirrepetentes possam, em um ou dois anos, retomar com sucesso o percurso regular, frequentando a série prevista para seu grupo etário. Iniciado em fevereiro de 1996, o projeto envolveu nesse primeiro ano, 450 professores e 11.000 crianças e jovens. Em 1997 sua ampliação alcança 2.000 professores e 44.000 alunos.
Coube à equipe do Cenpec a capacitação dos professores envolvidos nesse projeto e a elaboração de material de apoio para alunos e professores, em consonância com a proposta pedagógica, que parte dos princípios de que todo aluno é capaz de aprender e de que a interação é fator fundamental na construção do conhecimento.
Mais que isso, na verdade as classes de aceleração visam recuperar a confiança perdida dos alunos em sua capacidade de aprender, oferecendo condições básicas para continuidade de seus estudos com chances de sucesso, e dos professores em sua competência para ensinar bem a todos.
O Cenpec está desenvolvendo trabalho semelhante para a Secretaria de Estado de Educação do Paraná, no Projeto de Correção do Fluxo Escolar da 5ª à 8ª série.
Projetos como esses não resolverão por si mesmos todos os problemas educacionais e sociais que o Brasil enfrenta hoje, mas se constituem, sem dúvida, em exemplos de ações norteadas pelo princípio da equidade social e apontam, ainda, para a importância da articulação entre Estado e sociedade civil na realização de políticas públicas mais justas e adequadas à consolidação da democracia brasileira.
Finalmente, é também na implementação com eficácia de projetos como esses que poderemos dar respostas concretas para os jovens que hoje não acreditam em uma utopia de um mundo melhor, de uma sociedade mais justa.


Maria Alice Setúbal, 46, é socióloga, doutora em psicologia da educação, diretora-presidente do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária) e consultora de educação do Unicef para América Latina e Caribe.



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