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Sem ônibus, folga à força e atraso em vestibular
DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Sem conseguir ônibus, Eliza
Misawa, 17, se atrasou para o
vestibular e viu seu sonho de
entrar na faculdade ser adiado.
Culpa do PCC. Sem funcionários no escritório nem escolinha para os filhos, o casal Patrícia e Adriano Grilo perdeu um
dia de trabalho. Culpa do PCC.
Sem compradores na rua 25 de
Março, a Dra. Havanir, deputada estadual do PSDB, não teve a
quem entregar seus santinhos.
Tudo culpa do PCC.
Os moradores da capital viveram ontem um dia atípico:
menos trânsito até o fim da tarde, mais policiais, nenhuma superlotação nos centros de compras. Não tinham o medo de
sair de casa vivido nos atentados de maio, mas, sem ônibus,
precisaram adaptar a rotina.
O telefone do casal Grilo tocou antes das 7h: era a escola
dos filhos avisando que as professoras não conseguiram chegar ao trabalho. Pouco depois,
foi a vez da secretária ligar para
dizer que não havia condução
para ir ao escritório. "Em vez de
ficar estressado, resolvi tirar
um folga forçado pelo PCC e
passear", dizia Adriano, que
tem uma fábrica de chocolate,
curtindo a tarde no parque Ibirapuera com Caio, 1, e Carol, 3.
"Amanhã [hoje] coloco o trabalho em dia. Não vou nem pensar no prejuízo."
Prejuízo maior tiveram os
comerciantes que viram os
clientes desaparecer de ruas de
compras tradicionais. Na 25 de
março, poucos ambulantes e
muito espaço para quem resolveu ir às lojas. "Vim de lotação
de Santo Amaro e não vendi nada ainda", contava Dalva Luz,
39, em um banca de bijuterias.
"Esse PCC só atrasa a vida da
gente, que precisa trabalhar."
Elegante em um tailleur vermelho, na outra calçada, Havanir Nimitz também tentava
atrair "clientes" e distribuir
adesivos. "A gente não pode parar nunca. Infelizmente chegamos a essa situação, mas não
devemos nos intimidar."
Eliza, a vestibulanda de física
médica, não se intimidou. Saiu
de casa em Itaquera, zona leste,
antes das 12h e andou mais de
40 minutos até chegar ao metrô, já que não havia ônibus. O
esforço não deu certo. Ela chegou ao local de prova da Unesp,
na zona oeste, às 14h10, dez minutos após o fechamento dos
portões. "Graças ao PCC vou
ter que esperar mais seis meses
para tentar entrar na faculdade. Não é justo para quem leva a
vida a sério." A Unesp informou
que a prova será mantida.
Se para Eliza o PCC atrapalhou a vida, para o auxiliar de
engenharia Renan Aguiar, 20, o
dia foi de festa. Liberado do serviço, ele foi ao Anime Friends
(um festival que mistura concurso de fantasias, shows e jogos de RPG), na zona norte,
com sua fantasia a tiracolo. "Se
saísse de casa com ela, seria
morto com certeza." Explica-se: Renan passou a tarde de
guerrilheiro, com uma touca na
cabeça e um fuzil de plástico
nas mãos. "Em época de atentado, a roupa fica perigosa."
Nenhum perigo nas roupas
do São Paulo Fashion Week, na
zona sul. Por lá, os ataques
eram assuntos de poucas rodinhas. A maioria falava do mundo fashion, mesmo. Cristiane
Rios, 24, que trabalha com
eventos, conta que até ficou insegura ao sair de casa. "Mas foi
só chegar aqui para esquecer o
que está acontecendo lá fora.
Não dá para São Paulo parar só
porque os criminosos querem."
Da mesma opinião é o cantor
Supla. Do outro lado da cidade,
na zona norte, ele comemorava
o Dia do Rock em um festival
que durou mais de dez horas.
"Tem que ficar esperto, mas a
vida continua." Para garantir a
segurança, só entrava no evento quem apresentasse documento, que era escaneado de
ambos os lados, e deixasse sua
foto registrada no computador.
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