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Fraternidade separa líderes dos perdedores nos EUA
Universitário de Harvard relata quais códigos de aceitação (e rejeição) regem as associações estudantis nos Estados Unidos
Grupos expressam diferenças entre os sistemas de educação dos EUA e do Brasil
MATTHEW BLUMENTHAL
ESPECIAL PARA A FOLHA
Algumas destas instituições
são mais velhas que o Brasil independente. Outras têm grandes mansões e fundos de milhões de dólares.
As fraternidades (em inglês,
"fraternities" ou "frats") expressam diferenças básicas entre os sistemas de educação dos
EUA e do Brasil: a relevância da
moradia como parte fundamental da experiência universitária nos EUA e a necessidade
dos jovens de se organizar em
grupos, separando a vida universitária em dois times: "popular" e "zé-ninguém".
Uma fraternidade é constituída por pessoas que moram
juntas e criam regras, organizam festas, guardam rituais secretos -e bebem muito. São supervisionadas por grupos de
formados que fazem questão de
manter vínculos com a universidade em que estudaram.
As fraternidades sempre atiçaram a imaginação dos americanos. A comédia "Clube dos
Cafajestes" (1978), de John
Landis, foi um ícone cultural
para a geração dos pais dos alunos de hoje, baseada na barulhenta Casa Delta, uma fraternidade da faculdade Dartmouth, em New Hampshire.
Nesta temporada, o canal ABC
transmite, apenas para os EUA,
a série "Greek", sobre alunos e
"perigos" das fraternidades.
Mas por que esse sistema é
tão popular? Uma das respostas é a tradição, que data do século 18. A Flat Hat Club (em inglês, clube do chapéu plano) é
considerada a primeira fraternidade de uma universidade
americana. Foi fundada em
1750, na Faculdade de William
e Mary, em Virgínia.
Naquele período, a idéia das
fraternidades havia sido importada de associações secretas
européias, como os maçons e as
organizações estudantis da
Alemanha. Clubes sociais similares, como Whig e Chliosophic
(1760), em Princeton, e o Clube
Porcellian (1791), em Harvard,
vieram logo em seguida.
Depois da Guerra Civil (1861-1865), as "frats" cresceram rapidamente nos EUA. "O fato de
termos uma sociedade que organiza muitos grupos de voluntários ajudou na proliferação
das fraternidades", diz Theda
Skocpol, socióloga de Harvard.
"Em matéria de residência
no campus, pertencer a uma
fraternidade é um sinal de distinção social. As fraternidades
são espaços de sociabilidade,
mas, acima de tudo, ampliam o
capital social do estudante por
meio de redes de contato com
colegas de outras universidades e ex-alunos", explica Arabela Campos Oliven, professora de sociologia da educação da
Universidade Federal do Rio
Grande do Sul e autora de um
estudo comparativo entre os
"colleges" americanos e as universidades brasileiras.
Fraternidades e seus membros são importantes não somente na organização de festas
-sua imagem mais popular, especialmente no cinema-, mas
também em outras atividades
do campus. Segundo Joseph
Richey, presidente da Sigma
Alfa Epsilon, da Universidade
Estadual da Pensilvânia, os
membros das fraternidades representam 11% dos alunos da
faculdade e ocupam 80% das
posições de liderança no campus -sem esquecer das festas.
"Costumamos fazer grandes
festas temáticas na casa [sede]
ou num bar", diz Scott Lappin,
membro da Phi Psi, da Universidade de Miami em Ohio.
"Também tenho ido a jogos de
beisebol com 80 amigos ou feito camping com mais de 150
pessoas. Há dois anos, falei que
voltaria para casa, por um fim
de semana, e disse a 35 homens
que eram bem-vindos. Trinta
foram, e desde então tem sido
uma tradição", explica.
No Brasil não "pegou"
A vida social da faculdade no
Brasil não é tão organizada assim. "Eu diria que 60% dos alunos da USP saem regularmente. Mas saem na hora, sem fazer
planos", diz Renata Gukovas,
organizadora de baladas da
FEA (Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade), da USP, no ano passado.
"Para nós, os "gerentes", a vida
social é organizada; para os alunos, em geral, não é."
Para Arabela, "o caráter profissional e elitista da educação
superior no Brasil, durante
muito tempo, assegurou a seus
graduados uma inserção privilegiada no mercado de trabalho, dispensando a formação de
uma rede mais organizada de
contatos, como o modelo das
fraternidades."
As faculdades brasileiras têm
características diferentes das
americanas. Com 80.000 alunos, por exemplo, a USP tem
quase o dobro do número de estudantes das maiores universidades dos EUA. Há mais mistura de faixas etárias nas faculdades brasileiras e a maioria dos
alunos não mora no campus.
Scott Godwin, da Sigma Alfa
Epsilon, é franco sobre as razões pelas quais se associou.
"São excelentes para sair e conhecer um monte de gente.
Não existe um minuto de tédio
quando se está morando com
seus melhores amigos sem nenhuma figura de autoridade."
Violência fraterna
Mas é exatamente esse excesso de autonomia que pode
trazer problemas. Bebedeiras,
"hazings" (os trotes violentos)
e acusações de discriminação
racial passaram a fazer parte do
currículo das associações.
A morte de Scott Krueger, do
MIT (Instituto de Tecnologia
de Massachusetts), teve ampla
repercussão nos EUA, em 1997.
Ele se afogou no próprio vômito após uma bebedeira forçada
na iniciação de uma fraternidade e morreu três dias depois.
Hoje, 44 Estados dos EUA têm
leis contra trotes desse tipo.
Joseph Richey, presidente da
fraternidade SAE, da Universidade Estadual da Pensilvânia,
diz que esses problemas não representam a rotina das fraternidades. "O resto de nós trabalha todos os dias para lutar contra esses estereótipos", diz.
Alguns não concordam. "O
"hazing" sempre vai acontecer",
falou, sem querer se identificar,
o líder de uma fraternidade da
Universidade de Miami, em
Ohio. "Pode ser cruel, desnecessário e perigoso. Você tem
de entrar sabendo quem é -e o
que você tolerará- para que
possa ir embora se for preciso."
Para os "irmãos" entrevistados, a fraternidade fornece sentido também após a faculdade.
Scott Godwin, por exemplo, diz
ter certeza de seus planos: "Vou
ser amigo dos rapazes pelo resto da minha vida".
Matthew Blumenthal, 21, é aluno do curso de história e literatura americana, em Harvard
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