São Paulo, sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

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Novo tremor não assusta milícia que protege vilarejo

Armados, seis homens passaram a noite em Caraíbas para evitar saques às casas

À 0h11, ruído semelhante ao de um pequeno trovão assustou animais; ex-morador da comunidade diz que "isso acontece todo dia"

JOÃO WAINER
REPÓRTER-FOTOGRÁFICO

O relógio marcava 0h11 quando um ruído semelhante ao de um pequeno trovão interrompeu o silêncio do vilarejo-fantasma de Caraíbas. A terra vibrava, sutil como a passagem do metrô pelo subsolo. Cães, galinhas e porcos se assustaram -era um novo tremor, um dos pequenos abalos que ocorreram no local após o fenômeno do último domingo.
"Isso acontece todo dia. Esse foi dos mais fracos", afirmou Raimundo Campos Pinheiro, 49, que aparentava tranqüilidade. Ele era um dos seis ex-moradores dali que resolveram passar a noite de ontem na comunidade para proteger o que sobrou do seu patrimônio. A Folha acompanhou o grupo.
"Como a gente pode morar num lugar assim?", lamentava o lavrador Donato Moreira, 54.
Os estrondos, dizem, são sempre no final da noite. "O primeiro "terremoto", em maio, foi meio-dia, mas, depois desse, quase sempre perto da meia-noite a gente ouve esse estrondo, uns mais fortes e outros mais fracos", disse o lavrador Juarez da Silva Mota, 40, ao redor de uma fogueira diante da sua antiga casa.
Mota é o líder da milícia improvisada em Caraíbas. O medo do grupo não é que a terra trema novamente -eles temem saques à comunidade, abandonada. Na segunda, um dia após o tremor mais forte, os moradores relataram furtos de roupas, telhas e animais.

Rifles e revólver
Foi então que o lavrador pensou em reunir os antigos vizinhos. Ontem, eles contavam com dois rifles e um revólver calibre 38 para se defender -a primeira noite em claro no local foi de segunda para terça.
"Fizemos uma reunião entre os moradores, e eles disseram que ninguém tinha coragem de vir pra cá. Então, decidi juntar esse povo e vir cuidar do que é nosso." Eles querem ficar enquanto houver luz em Caraíbas -a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) deve desligar a eletricidade do local nos próximos dias.

Preocupação
Além dos saques, os ex-moradores têm outra preocupação: uma possível invasão dos índios Xakriabá, moradores de uma cidade vizinha e antigos rivais da população local.
"Ninguém lá é índio mesmo, eles só têm carteira de índio, mas são iguais a nós. Nós sabíamos que eles estavam se armando pra invadir aqui, e estávamos preparados pra lutar contra eles. Agora, depois do tremor, não sei como vai ficar essa briga, mas temos que estar com os olhos abertos", disse à reportagem Mauricio dos Santos, 19. A vigília de ontem terminou sem saques e invasões.


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