São Paulo, domingo, 15 de fevereiro de 2004

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ENTREVISTA

Encontro em SP discute a relação entre o estresse e a pressão alta

AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Costuma-se atribuir ou relacionar ao estresse excessivo boa parte dos males modernos. A pressão alta é um deles. Um dos temas do 20º Encontro da Sociedade Internacional de Hipertensão, que começa hoje em São Paulo, é justamente a relação entre o estresse e a pressão alta.
Décio Mion Jr, diretor da Liga de Hipertensão do Hospital das Clínicas e tesoureiro do congresso, diz que essa relação existe e já é conhecida. O que não se sabe é se o aumento da pressão ocorre apenas no período de estresse ou se poderia ser responsável por uma hipertensão crônica. O que poderia levar a uma confusão entre o estresse e a hipertensão.
Um dos conferencistas, o canadense Otto Kuchel, defenderá a tese de que a hipertensão provocada pelo estresse é conseqüência da falta do hormônio dopamina.
A professora Maria Teresa Zanella, titular de endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explica que o estresse libera um hormônio constritor (a adrenalina) que elevaria a pressão arterial. Em indivíduos não propensos à hipertensão, o organismo liberaria um segundo hormônio, um vasodilatador, a dopamina, impedindo que a pressão se mantenha alta.
Segundo ele, a tese de Otto é que em indivíduos hipertensos pode haver uma falha na produção da dopamina. A professora, que pertence à Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, lembra que, além do estresse, o histórico familiar, o acesso à medicação e à informação interferem no nível de pressão.
Décio Mion cita pesquisa feita entre os médicos hipertensos do Hospital das Clínicas: só 40% disseram tomar remédio.
Abaixo, entrevista concedida pela professora Maria Zanella:

 

Folha - Já foram feitos estudos no Brasil relacionando a hipertensão e o estresse?
Maria Teresa Zanella -
Sim, pelo menos dois grandes estudos foram feitos em São Paulo. Um deles é o da psicóloga Geni Furquim Leite, que defendeu tese no Hospital do Rim e da Hipertensão da Unifesp. Havia uma relação clara entre os dois fatores. No nosso ambulatório, na Unifesp, nós constatamos que 77% dos pacientes não tinham a pressão controlada e fomos buscar os motivos. Um deles era a não aderência ao tratamento, por falta de conhecimento ou de acesso ao medicamento. A outra causa era psicológica. Cerca de 80% dos pacientes eram mulheres com idade média de 56 anos. Em 34% deles encontramos sintomas de depressão e associações com a síndrome do pânico e a ansiedade gerada por estresse.

Folha - Quais eram os sintomas?
Zanella -
Taquicardia, sensação de morte iminente, de desmaio, suor frio, esfriamento das extremidades. Verificamos também que esses sintomas eram mais freqüentes nos pacientes de bairros que eles consideravam violentos -56% achavam os seus bairros violentos. Aqueles que já tinham sofrido alguma violência, ou tiveram parentes vítimas de violência, apresentavam um nível de pressão mais alta ainda.

Folha - E o segundo trabalho?
Zanella -
Este é da década de 80 e relaciona as profissões com a prevalência de hipertensão. Foram estudados cerca de 5.000 pacientes. A profissão com mais freqüência de pressão alta é a de jornalista, seguida dos profissionais de transportes, metalúrgicos e corretores de companhia de seguros. Vale lembrar novamente que o estresse é um fator facilitador, que desencadeia o processo.
Uma pessoa geneticamente predisposta a desenvolver hipertensão, se submetida a constante estresse, poderá manifestar a pressão alta anos antes. A tese do professor Otto Kuchel é a de que os organismos com falha na produção da dopamina têm mais facilidade para serem hipertensos.



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