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carnaval 2010
Quero ser carioca
Com pacotes que
custam € 1.200,
estrangeiros vêm
ao Rio para visitar
escolas da terceira
divisão, ficar em
casas do subúrbio
e sambar em ruas
de terra batida, longe dos hotéis de luxo da zona sul e da elite do
Carnaval carioca
FÁBIO GRELLET
DA SUCURSAL DO RIO
Visitar o Cristo Redentor, conhecer o Pão de Açúcar, sambar sob ar-condicionado na
quadra do Salgueiro e assistir
de camarote aos desfiles na Sapucaí? Nada disso.
No projeto Sabor de Carnaval, as atrações são os ensaios
da escola de samba União do
Parque pelas ruas de terra de
Curicica (bairro da zona oeste a
57 quilômetros da badalada
Ipanema), as aulas de dança e
percussão na favela Parque
Dois Irmãos, a feijoada da dona
Geralda e o convite para ver o
desfile na Sapucaí a partir do
setor 1, arquibancada popular
de onde não se vê muito além
da concentração e cujos ingressos são distribuídos de graça
pelas escolas. Tudo por 1.200.
"Aqui não tem aquela história de sair do hotel cinco estrelas, entrar na van com ar-condicionado, acompanhar o ensaio ou o desfile e voltar pro hotel cheio de mordomias. É um
mergulho na rotina da comunidade que faz o samba, para o
gringo sentir o clima do Carnaval", conta Marco Antônio
Dias, 44, o Marquinho da Dona
Geralda, criador do projeto e filho da responsável pelo cardápio oferecido aos estrangeiros.
Ex-integrante do Oba Oba,
grupo de samba liderado por
Osvaldo Sargentelli, Marquinho mora na Dinamarca e faz
shows pela Europa, mas vem
ao Brasil às vésperas do Carnaval. Ele criou o projeto após ouvir reclamações de estrangeiros que haviam passado o Carnaval no Rio. "Eles elogiaram,
mas queriam ter conhecido
mais a rotina dos sambistas."
O projeto foi lançado em
1999, quando o sambista criou
um roteiro de três semanas que
também inclui visita a terreiro
de candomblé e a fábrica de
instrumentos de percussão. Os
gringos se hospedam em Curicica -numa chácara alugada
ou na própria casa da mãe de
Marquinho, conforme o número de interessados.
Mulheres
Neste ano, cinco pessoas
-todas mulheres- compraram o pacote, de 28 de janeiro a
18 de fevereiro: a dinamarquesa
Nina Fantoft, 24, a sueca Annika Johansson, 28, a inglesa Clare Jullings, 24, e as francesas
Kristel Bris e Sandrine Sinagna, ambas de 28 anos.
"Quando viajo, gosto de fazer
coisas que não estão no programa dos turistas", afirma a sueca
Annika, que é médica e está
grávida de quatro meses. "Fiquei surpresa, não imaginava
que aqui fosse tão calmo."
"Vim em 2009, adorei e decidi voltar", diz a florista Clare,
que por conta própria decidiu
ampliar sua estada no Rio de
três semanas para três meses.
Se ainda falta samba no pé e
desenvoltura para entender a
letra do samba-enredo, sobra
animação. As cinco estrangeiras compraram, por R$ 100 cada, fantasias para desfilar nesta
terça-feira na ala das fadas da
escola de Curicica, integrante
da terceira divisão do samba carioca. "Vamos dar show no
sambódromo", prevê Annika.
"Já cheguei a trazer 30 gringos, mas tive dor de cabeça. Os
franceses e os ingleses começaram a se estranhar", diz.
"Em 2002, um inglês saiu à
noite e desapareceu. De madrugada, me ligaram da Mangueira dizendo que havia um
gringo perdido lá. Ele estava
loucão", conta Marquinho, que
distribui um crachá de identificação para cada cliente.
"Eu oriento todo mundo sobre os lugares aonde eles podem ir e onde devem evitar, e
ofereço programas seguros",
diz. "Até hoje nenhum participante do projeto foi assaltado."
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