São Paulo, domingo, 15 de abril de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Aeronáutica culpa controlador por crise

Brigadeiro garante a Lula não ser necessário apressar atualização do sistema nem mais recursos para comprar equipamentos

Presidente decidiu, após análise de comandante, adiar desmilitarização do controle do espaço aéreo por prazo indeterminado

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

Apesar de cristalizada a sensação de que o sistema de controle do espaço aéreo é ultrapassado, os equipamentos são obsoletos e os controladores têm baixos salários e más condições de trabalho, o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, afiançou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que não há nada disso e atribuiu toda a crise a um único fator: os controladores.
Com base nessa avaliação, Lula decidiu adiar qualquer processo de desmilitarização do controle do espaço aéreo por prazo indeterminado, enquanto não houver garantias de que está afastada a hipótese de novos apagões aéreos que paralisem os aeroportos, como ocorreu em 30 de março.
As condições objetivas para que eles ocorram continuam, mas o governo considera que, agora, tem como intervir imediatamente e neutralizar os efeitos. O que há é um "teste de força" dos dois lados, o dos controladores e o da Aeronáutica.
Conforme a Folha apurou, Saito assumiu um compromisso com o presidente Lula: o de, em caso de novo motim, manter 40% do fluxo aéreo no primeiro dia e de chegar a 80% em quatro dias.
O temor do governo agora está concentrado nos jogos Pan-americanos de julho, no Rio. Depois da ousadia do dia 30, a Aeronáutica imagina que algo ainda maior só poderia acontecer num evento como esse, com repercussões internacionais de grandes proporções. Essa hipótese, porém, é considerada bastante improvável.
O presidente deu ao comandante todo o aval para agir de acordo com as normas militares, com dureza, em caso de novos motins dos sargentos controladores de vôo.
Saito e o Alto Comando da Aeronáutica, formado pelos tenentes-brigadeiros da ativa, maior patente da Força, concluíram que não há meio-termo: não será atendida nenhuma reivindicação já e, se houver novo motim, os líderes serão presos em flagrante.
Essa forma é considerada importante para que sejam enquadrados por crime de motim e não haja duplicidade com o inquérito que já está em andamento numa outra instância, o Ministério Público Militar.
O Código Penal Militar prevê pena de quatro a oito anos para amotinados, com agravamento para os líderes, sem contar a impossibilidade de voltar a qualquer setor do serviço público. Esse é um fator tido como fundamental para controlar eventuais ímpetos grevistas na categoria. Na avaliação da Aeronáutica, o "núcleo duro" do movimento em 30 de março não chega a 120 controladores.
No total, há em torno de 2.200 controladores, e está sendo feito um trabalho praticamente de corpo-a-corpo para dissuadir a massa de controladores a não acompanhar os líderes. Além do inquérito militar, o principal argumento é de que os sargentos controladores, além de receberem em torno de R$ 2.400,00 iniciais (soldo da patente mais 20% pelo tipo de função), têm imóvel, um dos melhores planos de saúde do setor público e aposentadoria diferenciada.
A intenção, portanto, é isolar e prender os líderes e dissuadir o restante, já com um contingente pronto para cobrir eventuais falhas, arregimentado entre os da reserva, os que atuam na área de defesa aérea e entre áreas de menor fluxo -que podem, inclusive, ser "fechadas" durante o pico da crise.
Os alvos para remanejamento são, por exemplo, as bases de Anápolis (GO) e Santa Maria (RS) e as torres de aeroportos pequenos, como o de Aracaju.
Conforme a Folha apurou, Saito também relatou ao presidente as providências para multiplicar os quadros de controle de vôo e garantiu que não há necessidade nem de mais recursos para compra e manutenção de equipamentos nem de apressar significativamente a atualização do sistema.
Lula não se cansa de repetir que se sentiu enganado pelo comandante anterior, brigadeiro Luiz Carlos Bueno, que traçava cenários excessivamente róseos e não se preparou para um apagão grave -e previsível- como o de 30 de março. Por isso, exigiu clareza e objetividade de Saito. Não disse explicitamente, mas o recado está dado: a Aeronáutica recuperou o comando da situação, mas também a responsabilidade sobre qualquer coisa que dê errado.


Texto Anterior: Há 50 anos
Próximo Texto: Casal quer dar ao filho nome de elfo de filme
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.