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No chão e em redes, detentos se animam durante sessão
DA SUCURSAL DO RIO
Na última quinta-feira, a Folha acompanhou uma sessão
do "Cine Clube 52ª". Em cartaz,
o documentário "Do Lodo ao
Lótus", produzido pelo cineasta Marcelo Buainain.
Por volta das 19h30, era evidente a excitação do "coletivo"
(como os detentos se referem à
massa carcerária). As vozes ultrapassavam as grades e ecoavam pela delegacia.
As atrações da noite de quinta-feira estavam a postos na sala do delegado à espera de autorização para entrar na carceragem da delegacia: o professor
Hermógenes, 86, introdutor da
ioga no Brasil, o rapper BNegão, Marcelo Yuka e a equipe
com os integrantes da Companhia de Cinema Barato e o
equipamento de projeção.
Os integrantes da facção criminosa TC (Terceiro Comando) foram os primeiros a assistir à trajetória de um criminoso
do Rio Grande do Norte que,
adepto da ioga e do budismo,
deixa o crime. Quando a grade
se abriu, o grupo de mais de 150
internos passou a observar cuidadosamente os convidados
para a sessão de cinema.
Acomodados no chão e em
redes penduradas até o alto do
galpão, eles se misturaram às
imagens de Jesus, fotos da família e de mulheres nuas, varais com roupa, ventiladores,
centenas de garrafas e sacos
plásticos, muitas roupas e mantas empilhadas sob um teto
gradeado sem cobertura.
Quando chove, é estendida
uma lona sobre a cela coletiva.
No chão, dois presos dividem
cerca de 1 m2.
Falavam pouco e baixo uns
com os outros. O máximo que
se ouvia é um "terceirou!" (grito de guerra da facção) quando
o filme começa. Um dos detentos presentes grita: "Bateu respeito, Marcelão", em consideração ao músico Yuka.
Logo nas primeiras cenas, os
internos se entreolharam. É fácil perceber que eles se reconheceram na tela. Imagens do
protagonista encarcerado ao
lado de policiais armados. Em
seguida, concentrados, acompanharam a história que poderia ser a de qualquer um deles.
Ao final, depois do show de
BNegão, a sessão foi transferida para o galpão do CV (Comando Vermelho), facção rival.
Mais velhos e falantes, os internos do pavilhão participaram
ativamente da projeção do documentário exibido no cárcere.
A foto do líder espiritual Sai
Baba provocou comentários:
"Que cabelo [black power] é esse?!" Os movimentos com o abdômen do iogue também impressionaram. O professor
Hermógenes recebeu um elogio dos detentos. "O "coroazinho" é guerreiro mesmo!"
Quando a luz se acende, Yuka comenta: "Eu fui julgado e
condenado, sem previsão [de
ficar em liberdade], por um crime que não cometi. Sou preso
do meu próprio corpo", em referência ao tiro que o deixou
paraplégico, em novembro de
2000, na Tijuca (zona norte).
A rotina logo volta ao normal
após o fim da sessão. Um dos
carcereiros disse que não há
"santo" no local, mas que o
atual tratamento destinado aos
presos pela 52ª DP diminuiu
seu trabalho.
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