São Paulo, terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

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carnaval 2010

Samba lateral

Escolas de samba da Bahia e de Pernambuco tentam sobreviver em meio a Carnavais regados a axé e frevo

FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

MATHEUS MAGENTA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SALVADOR

São Paulo pode ser o túmulo do samba, como dizia Vinicius de Moraes, mas difícil mesmo é esquentar o pandeiro nos Carnavais da Bahia e de Pernambuco, berços do axé e do frevo.
O ritmo resiste a duras penas nas capitais dos dois Estados.
Em Recife, agremiações com baterias, alas e porta-bandeiras até desfilam em concursos. Dependem, no entanto, do dinheiro de "vaquinhas", bingos e festas para colocar o bloco na rua.
Em Salvador, a situação é muito pior. Única escola de samba em atividade por lá, a Lira Imperial não tem nem sambódromo para se apresentar.
Os 80 integrantes da bateria baiana acabam em outros blocos, e o presidente da escola, Alaor Macedo, sai às ruas como folião-pipoca, que brinca fora dos blocos ou dos camarotes.
Os outros sambistas da cidade foram incorporados ao típico Carnaval do Estado e sobem em trios elétricos para participar da festa. Quem fica no chão, como a Lira, fica sem palco.
Fundada em 2006, a agremiação tem barracão, bateria, mestre-sala, bandeira nas cores laranja, verde e branca e até samba-enredo. Mas ainda busca meios para se manter.
"O dinheiro deve vir da iniciativa privada", diz Macedo. "Precisamos pensar o samba como empresários, como fizeram com o axé, mas o governo tem outras prioridades, como saúde e educação", afirma.
O sambista sonha em resgatar a fase áurea das escolas de samba baianas das décadas de 1960 e 1970, quando a folia chegava a reunir 14 escolas em dois grupos. O último desfile na capital baiana foi em 1976 - dez anos antes da ascensão do Axé.
Macedo atribui a decadência à falta de estrutura das escolas de samba da época, que não conseguiram criar um modelo econômico de sucesso, como os atuais blocos de trio elétrico.
Percussionistas e passistas migraram para os blocos afros e afoxés, como Ilê Aiyê e Filhos de Gandhy. Macedo acredita num caminho inverso e enxerga nele o ressurgimento das escolas de samba na Bahia.
"Blocos como o Muzenza já estão saindo com alas, carros alegóricos e temas. Além da busca pelo sustento financeiro, só falta um passo: é só acelerar o ritmo e mudar a batida que o samba está de volta", disse.
Em Pernambuco, apesar de as escolas de samba terem surgido ainda na época da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), até hoje elas não conseguiram rivalizar com os ritmos e manifestações tradicionais do Estado, como o frevo e o maracatu.
Em Recife, existem cerca de 20 agremiações, divididas em três grupos. Elas desfilam nas noites da segunda de Carnaval, em uma avenida na região central, de graça para o público.

Padrão
O modelo adotado no concurso pernambucano segue o padrão consagrado no Rio e em São Paulo. As agremiações desfilam, uma comissão julgadora avalia e, na quinta pós-cinzas, anuncia-se os vencedores.
A maior escola de Pernambuco é a Gigantes do Samba. Com 1.500 integrantes, ostenta 44 títulos em 67 anos de existência. Mas esse currículo não a tornou conhecida por turistas.
"Nossa luta é grande, porque Pernambuco é a terra do frevo, e o samba fica em terceiro plano", lamenta o presidente da agremiação, o policial civil Rivaldo Figueiredo Lacerda, 51.
Este ano, afirmou, para realizar o seu desfile, a Gigantes recebeu da prefeitura R$ 12 mil. A escola gastou R$ 90 mil. "Tivemos que fazer churrasco, bingo, festa, e pedir ajuda no comércio para arrumar todo o dinheiro."
Lacerda diz que perdeu dez kg em 45 dias. "Estou com a pressão alta, fiquei depressivo, e não dei atenção para a família para ver a escola sair", disse.
Nos últimos anos, os sambistas acharam um meio de se infiltrar no roteiro do frevo. Com uma pequena bateria, desfilam no centro histórico de Olinda, arrastando foliões pelas ladeiras, como fazem os maracatus.


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