São Paulo, sexta-feira, 16 de março de 2007

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Abandonada, escola faz rodízio de alunos

Escola municipal de SP sofre com falta de funcionários e seis salas de aula interditadas; alunos perdem até metade das aulas

Cerca de 140 estudantes já pediram transferência; outras escolas públicas do bairro estão superlotadas, diz conselho tutelar

Moacyr Lopes Júnior/Folha Imagem
Muro quebrado na escola municipal Flávio Augusto Rosa, no bairro do Itaim Paulista; pais de alunos reclamam das más condições

EVANDRO SPINELLI
FÁBIO TAKAHASHI
DA REPORTAGEM LOCAL

Salas de aula interditadas por falta de condições de uso. Alunos obrigados a estudar em "rodízio". Pais limpando banheiros e distribuindo merendas. Lixo acumulado no pátio.
A descrição acima retrata a situação da escola municipal Flávio Augusto Rosa, no Itaim Paulista, extremo leste de São Paulo, um símbolo da crise do ensino público paulistano evidenciada pelos péssimos resultados que os colégios municipais e estaduais da cidade obtiveram nas recentes avaliações de desempenho no país.
A condição da escola, que pertence à administração Gilberto Kassab (PFL), é de quase completo abandono. O colégio até anteontem não tinha nem diretor -o novo assumiu ontem, após dois meses.
Localizada num dos bairros mais pobres da periferia de São Paulo, a escola fica ao lado do rio Tietê, na divisa com Guarulhos e Itaquaquecetuba.
Um buraco no muro da quadra de esportes serve de abrigo para moradores de uma favela vizinha quando chove na região e o rio Tietê enche.
A situação da Flávio Augusto Rosa é tão ruim que muitos pais tiraram seus filhos da unidade a fim de matriculá-los em outros colégios públicos da região que, conseqüentemente, acabaram superlotados -com até 40 alunos por sala. Só neste ano houve pelo menos 140 transferências -a escola tem 1.475 alunos.
A precariedade do colégio se refletiu na Prova Brasil, exame que avalia o grau de aprendizado dos alunos de 4ª e 8ª séries. Os alunos do colégio obtiveram notas inferiores à média das demais escolas municipais.

Rodízio
O fim do terceiro turno na escola, o chamado "turno da fome", porque era na hora do almoço, das 11h às 15h, foi um desastre, segundo pais que se reuniram anteontem na porta da unidade para relatar os problemas à Folha.
Até o ano passado, os alunos assistiam aulas em três períodos de quatro horas cada um. Para este ano, a prefeitura anunciou o fim do terceiro turno em toda a rede. Com isso, os estudantes ficariam cinco horas por dia na escola.
Só que a interdição de 6 das 20 salas não deixou que isso ocorresse. Em vez de três, a escola tem agora quatro turnos.
O horário de aulas, no período da manhã, vai das 7h às 12h. Para os alunos de 5ª a 8ª séries, quem entra às 7h sai às 9h30 para a entrada da outra metade. À tarde, a situação se repete. Perde-se metade das aulas todos os dias.
De 1ª a 4ª séries, todos os dias uma turma é levada para outras atividades para que uma outra possa usar a mesma sala. Cada turma perde 2h30min de aula por semana.
A escola sofre também com falta de funcionários, segundo os pais, que fazem a limpeza e ajudam a cuidar dos alunos.
Nivalda Francisca da Silva Pereira, 45, tem um filho na 7ª série e vai todos os dias ajudar na limpeza. Sirléia Aparecida da Costa todos os dias limpa a sala de aula de sua filha, que está na 2ª série.
A manicure Ingrid Roberta de Andrade, 23, mãe de um aluno da 2ª série, e a dona-de-casa Leila Patrícia Fontes de Carvalho, 28, com um filho na 3ª série, fazem o papel de inspetoras de ensino e organizam a distribuição da merenda.
"Como é que nós, mães, temos de deixar a nossa casa para limpar a escola sendo que a prefeitura tem verba para isso?", disse Nivalda.
Da segurança, ninguém cuida. A escola é aberta -entra e sai quem quer, na hora que quer. A Folha constatou isso nas duas visitas à escola.
Também há reclamação com relação à merenda. Nesta semana, a merenda foi distribuída normalmente, mas o peixe servido na terça-feira só foi temperado porque uma das mães providenciou.
No ano passado, disse Sirléia, os alunos comeram apenas o biscoito doce "goiabinha" durante quase todo o ano.
O secretário municipal da Educação, Alexandre Schneider, deve ir hoje à escola para conversar com pais, professores e funcionários. Ele promete resolver todos os problemas.
O conselho tutelar da região investiga o caso. "Estamos cobrando a transformação da escola", disse o conselheiro tutelar Adenilson Lima Souza.


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