São Paulo, segunda-feira, 16 de abril de 2007

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Relatório aponta caos em presídio federal

Problemas são resultado da queda-de-braço entre agentes penitenciários e a direção do superpresídio de Catanduvas (PR)

Documento reservado da Polícia Federal aponta agentes com antecedentes criminais, desvio de conduta e falhas na segurança

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CATANDUVAS

Inaugurada em junho de 2006 com estardalhaço pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva, a penitenciária federal de Catanduvas (PR) vive uma situação de caos, motivada por uma queda-de-braço entre os agentes penitenciários e a direção da unidade. Esse quadro é descrito em relatório interno do serviço de inteligência da Polícia Federal, a cuja cópia a Folha teve acesso.
O documento expõe uma unidade bem diferente do superpresídio alardeado pelo governo. Mostra agentes com antecedentes criminais e desvios de conduta, falhas graves de segurança e influência de presos -como o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, o primeiro a ocupar a cadeia.
A disputa interna, aponta o relatório, é motivada pela decisão do Ministério da Justiça de vincular os agentes ao Depen (Departamento Penitenciário Nacional) e colocar homens da Polícia Federal nos dois principais cargos de chefia da cadeia -chefe de segurança e diretor.
O clima de competição entre os órgãos -ambos subordinados ao ministério- se refletiu na insubordinação dos agentes contra o delegado aposentado da PF Ronaldo Urbano, que dirige a unidade.
Em novembro passado, após medidas de Urbano, os agentes exigiram a presença do diretor-geral do Depen, Maurício Kuehne, que revogou os atos -que incluíam o desmonte de uma equipe de trabalho- e enfraqueceu ainda mais a administração do delegado.

Beira-Mar
A falta de normas e o enfraquecimento da chefia fortaleceram os presos, a maioria integrantes de facções criminosas, notadamente o PCC (Primeiro Comando da Capital). Beira-Mar, diz o relatório, já assumiu a condição de chefe dos demais detentos. São 141 presos na unidade -a capacidade é para 208 pessoas.
O traficante carioca tem ajudado presos mais pobres com a contratação de advogados e já alugou dois apartamentos em Catanduvas "para que sirvam de albergue para familiares de presos", cita o documento.
A Folha apurou que Beira-Mar comprou um táxi em Cascavel (PR), cidade a 48 km de Catanduvas, que é usado para levar seus parentes ao presídio. O objetivo seria evitar que a presença de carros de luxo chamasse a atenção.
A Folha apurou que no acordo fechado entre advogados de Beira-Mar e o taxista, o traficante ficou responsável pelo pagamento das prestações mensais de R$ 827 do Siena 0 km, financiado em 60 meses.
Em troca, o taxista tem a obrigação de não deixar sem condução parentes ou advogados de Beira-Mar na região. Segundo taxistas de Catanduvas, "Pé de Boi" faz, em média, quatro viagens mensais entre Cascavel e Catanduvas.
O relatório aponta também que um agente da unidade declarou a colegas ter sido consumidor habitual de cocaína e ter "admiração" pelo traficante.
Segundo o documento, mesmo depois de a direção ser informada do fato, o agente continuou trabalhando na ala de Beira-Mar, "tendo o hábito de "bater papo" com o detento".

Segurança
Ao divulgar a inauguração do presídio, o governo informou que a comunicação entre agentes e presos só seria permitida "em caso de extrema necessidade" e que as conversas seriam gravadas. O relatório da PF informa que parte das câmeras de vigilância e microfones de lapela ainda não entrou em funcionamento.
Entre outras falhas de segurança apontadas, estão a ausência de plano de contingência para rebeliões e incêndios e registro de atendimento de celulares em áreas cuja entrada desses aparelhos é proibida.
O presídio teve falhas já na contratação dos agentes. Os aprovados só passaram por capacitação após a admissão e não tiveram seus passados investigados. Resultado: dos 239 agentes contratados, 11 são réus em inquéritos ou processos criminais. Entre os delitos, há tráfico de drogas, homicídio e atentado violento ao pudor.


Colaborou BRUNO MIRANDA , repórter-fotográfico


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