São Paulo, terça-feira, 16 de maio de 2006

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GUERRA URBANA/ GOVERNO

Enquanto secretário da Segurança, delegado e coronel defendem linha-dura, secretário da Administração Penitenciária pede moderação

Divergência de autoridades retarda reação

DA REPORTAGEM LOCAL

Os quatro homens que hoje comandam a reação do governo estadual aos ataques do PCC estão divididos. Não há um consenso nem sobre a melhor forma de reagir nem sobre até que ponto a polícia deve endurecer.
No comando deles, está o governador Cláudio Lembo (PFL), 71, que assumiu o cargo em março deste ano e tem pouca experiência no gerenciamento de crises.
Os homens da cúpula do governo paulista são os secretários Nagashi Furukawa (Administração Penitenciária) e Saulo de Castro Abreu Filho (Segurança Pública), o delegado Godofredo Bittencourt Filho, diretor do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), e o coronel Elizeu Eclair Teixeira Borges, comandante-geral da Polícia Militar.
A principal divergência está na postura de cada um diante do problema da criminalidade. Enquanto Saulo, Bittencourt e Borges defendem uma resposta dura e implacável aos criminosos, e não descartam a possibilidade de os criminosos serem mortos, Nagashi tem uma visão mais moderada e defende uma reação forte do Estado, porém ponderada.
A discordância entre eles mina uma tomada de decisão definitiva por parte do governo estadual, que mantém o discurso oficial de que a situação está sob controle, apesar dos novos ataques ocorridos ontem.

Histórico
As diferenças entre Nagashi e a polícia ficaram explícitas em 2001, quando houve rebeliões simultâneas em 29 penitenciárias do Estado de São Paulo, que deixaram um saldo de 16 detentos mortos. À época, o secretário foi acusado de ter negociado o fim da crise diretamente com os criminosos -o que ele nega.
Foi o coronel Elizeu Eclair Teixeira Borges, que acumula uma maior experiência de campo entre os quatro, que acabou negociando a retomada dos presídios.
Quando veio a questão da desativação do Carandiru, surgiu uma nova polêmica. Nagashi, defensor dos minipresídios -segundo ele, mais fáceis de controlar-, colidiu com Saulo, para quem não tinha cabimento destruir um presídio diante do grande número de prisões feitas no Estado.
O Carandiru acabou sendo desativado no ano passado.
Nagashi, apesar de defender uma posição não compartilhada pelos colegas, tem o respaldo do ex-governador Geraldo Alckmin. O secretário, que já foi advogado, delegado, promotor de Justiça e se aposentou como juiz, após 20 anos de trabalho, é ligado a grupos de direitos humanos e defende o tratamento digno dos presos.
Criador da Apac (Associação de Proteção e Assistência Carcerária), que tinha como objetivo integrar a sociedade na administração penitenciária, Nagashi visita cadeias e conversa diretamente com os presos.
Para ele, se endurecer de forma exagerada, o governo estaria expondo a sociedade a novas ações terroristas.
Não é o que pensa Saulo, que se afastou do Ministério Público em 1995, quando foi convidado pelo então governador Mário Covas a assumir a Corregedoria Geral da administração paulista. Em 2001, presidiu a Febem e, em 2002, assumiu a secretaria, quando chegou a ser cotado como um dos candidatos a sucessão de Alckmin no governo.
No cargo, foi pivô de situações polêmicas. Brigou no trânsito com uma idosa, chamou a polícia para desbloquear uma rua perto do restaurante em que iria e foi denunciado pelo "caso Castelinho" -quando 12 supostos membros do PCC (Primeiro Comando da Capital) foram mortos em um ônibus na região de Sorocaba (100 km de SP). O inquérito foi arquivado.
Ao contrário de Nagashi, é um secretário mais de gabinete. Comparece em entrevistas coletivas, mas não tem o costume de visitar presídios. A eventual candidatura dele ao governo foi esquecida, e Saulo foi isolado no governo.
O secretário da Segurança é crítico feroz dos grupos de direitos humanos. Costuma usar palavrões quando se refere aos criminosos e prega uma reação dura do governo do Estado.
O diretor do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), Godofredo Bittencourt Filho, por sua vez, é adepto das frases de efeito.
O delegado disse ter chorado na sexta-feira, quando soube dos ataques contra policiais feitos pelo PCC. O mesmo PCC que, em 2001, ele chamou de "organização falida e desmantelada".
Aliás, as frases de efeito são o forte de Bittencourt. Ainda em 2001, disse: "Se o PCC tinha uma boca cheia de dentes, agora tem um dentinho ali e outro lá".
No gabinete, Bittencourt ostenta com orgulho uma placa de identificação em que se lê: "Doutor Fudêncio", numa menção ao caráter duro e intransigente do ocupante do cargo. Com 42 anos de carreira, o delegado tem uma filha que é seccional de polícia.
Em entrevista anteontem, Bittencourt criticou duramente a sociedade que, segundo ele, não apóia e respeita o policial.
Dos quatro, o mais operacional é o coronel Elizeu Eclair Teixeira Borges, comandante-geral da Polícia Militar de São Paulo desde dezembro de 2004. Ele é também o mais emocional. Na noite de anteontem, participou da entrevista coletiva com lágrimas nos olhos.
De perfil discreto, Borges também prega uma reação forte dos policiais contra os criminosos. Ele acredita que o Estado só sairá vitorioso se conseguir demonstrar sua força ao reprimir as ações criminosas.


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