São Paulo, sábado, 16 de junho de 2007

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Escuta aponta corrupção em subprefeitura

Em gravações, empresário de bingo discute propina para servidores da Subprefeitura da Sé para favorecer casa irregular

Diálogo ocorreu em fevereiro, quando o Sampa Bingo estava lacrado; lacre definitivo só ocorreu em 27 de abril, 77 dias após diálogo

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de descobrir indícios de pagamento de propina a juízes federais e a policiais civis, a Polícia Federal encontrou menção de que funcionários de um órgão da Prefeitura de São Paulo receberam dinheiro para que um bingo irregular continuasse aberto. O órgão citado é a Subprefeitura da Sé, que administra a região central da cidade. Quem dirige a subprefeitura é Andrea Matarazzo, a principal voz do PSDB dentro da administração municipal.
A menção à propina aparece em uma conversa telefônica interceptada pela PF com autorização judicial na Operação Têmis, que investiga a venda de decisões judiciais -Têmis é a deusa grega da Justiça.
O diálogo ocorreu em 9 de fevereiro deste ano, às 15h51, como mostra um dos 14 volumes do inquérito da operação obtido pela Folha.
De um lado da linha está Marco Antonio Tobal, vice-presidente da Associação Brasileira de Bingos e dono de duas casas de jogos na cidade (os bingos Jardins e Tatuapé), que teriam sido vendidos no ano passado, segundo ele.
Do outro lado, Jaques, o intermediário da suposta propina, sobre quem a PF não descobriu mais detalhes até agora.

"Manda vir pegar"
"E o tiule para dar pra esses putos?", pergunta Jaques -tiule é a gíria de cadeia e de travesti para designar dinheiro.
"Ah! Manda vir pegar, né?", responde Tobal. Ele diz que o pagamento era para o despachante Jaques.
Na conversa, Jaques avisa Tobal que um determinado bingo pode voltar a operar -a Folha apurou que se trata do Sampa Bingo, na avenida Ipiranga, área sob a jurisdição da Subprefeitura da Sé: "O que foi conversado foi a nível de subprefeitura. Você derruba as paredes, eles não vão mais te incomodar", conta Jaques.
A parede derrubada era a que havia sido erguida pela subprefeitura em 8 de fevereiro porque o bingo desrespeitara a ordem de fechamento. A conversa gravada pela PF foi no dia seguinte. O lacre definitivo do bingo só ocorreu em 27 de abril, 77 dias depois da conversa.
Logo em seguida, ele cita o preço do negócio: "Ficou 30 cruzeiros!", um valor que policiais acreditam ser R$ 30 mil.
"Puta vida! É muito! Duas de dez eu topo", propõe Tobal. "Eles tinham pedido 50, bicho, nós que quebramos para 30", rebate Jaques.
Tobal quer saber quem autorizaria a abertura: "Reginaldo", responde Jaques.
Há pelo menos três Reginaldos na Subprefeitura da Sé. O mais graduado na hierarquia do órgão é Reginaldo José Fazzion, supervisor de fiscalização.

"Vai lá e pega os valores"
Como não seria recomendável aparecer na subprefeitura, Tobal indica uma pessoa para fechar o negócio -Willian Rossi. "Esteja lá na subprefeitura do centro e aí você vai encontrar com o rapaz, depois você vai com o Willian lá no bingo e pega os valores, tá bom?", ordena. Segundo Tobal, Rossi é o dono daquele bingo.
A Operação Têmis foi desencadeada no dia 20 de abril, depois de sete meses de investigações. Foram realizadas operações de busca e apreensão na casa de juízes federais, advogados e em gabinetes do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
A principal suspeita da PF é que o advogado Luis Roberto Pardo, o Beto, comandasse um grupo que comprava decisões favoráveis a bingos.
Tobal -dono da Villa Country, complexo de 12 mil metros quadrados que imita o velho oeste- não é o único dirigente da associação dos bingos que está sob investigação.
O presidente do conselho da Abrabin, Olavo Sales da Silveira, e a presidente-executiva, a advogada Danielle Chiorino Figueiredo, também são investigados pela polícia.
A PF suspeita que eles arrecadavam recursos dos donos de bingos para pagar propina -o que eles negam.


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