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Palácio da Justiça vira capela para missa de juízes
Presidida pelo arcebispo de SP, celebração da 56ª Páscoa da Família Forense reuniu cerca de 250 pessoas
ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA
Revestido em mármore
chiampo, com piso das escadarias em carrara e balaústres em
bronze, o hall de acesso às dependências do Palácio da Justiça transformou-se numa majestosa capela, ontem de manhã, no centro de São Paulo. O
"Salão dos Passos Perdidos",
assim denominado porque era
onde o público lá permanecia à
espera de julgamentos, recebeu
tapete vermelho, cadeiras douradas, flores, velas, altar e crucifixo para celebrar uma missa,
a 56ª Páscoa da Família Forense, com cerca de 250 pessoas,
entre desembargadores, juízes,
autoridades e familiares.
A cerimônia foi presidida pelo cardeal arcebispo de São
Paulo, dom Odilo Scherer, e durou cerca de uma hora e meia.
"Nossa manifestação de fé
pode ajudar a gente a desempenhar nosso papel melhor", disse ele na missa. "A fé e o respeito ao Estado, que é laico, mas
aceita e protege as opções religiosas dos cidadãos."
Pai de 11 filhos, católico "desde que nasceu", o desembargador José Geraldo Barreto Fonseca, 66, acha que o Estado não
pode ser laico. "Se tirar Deus
como fonte, você cai no autoritarismo", disse. "Toda vez que o
homem se fez como referência,
grandes tragédias ocorreram."
Fonseca condena, como as
religiões cristãs, temas como o
aborto, o casamento gay, a pena
de morte e as pesquisas com células-tronco. Devoto de Nossa
Senhora e de São José, ele diz
que o Judiciário, como a sociedade, é pluralista. Questionado
se aceitaria o uso de cartas psicografadas nos tribunais, como
defendem membros da recém-criada Associação Jurídico-Espírita de SP, o desembargador
disse que não descarta nenhum
tipo de prova. "Como não sou
espírita, não acredito na reencarnação. A carta, a priori, poderia ser um fenômeno parapsicológico", afirmou.
Público x privado
À frente da comissão organizadora da missa, o desembargador Munhoz Soares, 67, explicou que a celebração segue uma tradição de ocorrer no segundo
ou no terceiro domingo de junho, mês que antecede as férias
do Judiciário. Filiado à União
dos Juristas Católicos, ele disse
que a maioria do Judiciário é
católica. "Os juízes decidem de
acordo com a lei e com a sua
consciência. A fé é o veículo."
Nem todos os juízes enxergam com bons olhos a presença
da religião no Judiciário. "O
juiz não pode ter limitações. A
Constituição garante liberdade
de crença, mas é necessário separar o público da esfera privada", diz a juíza Kenarik Boujikian Felippe, presidente da Federação Latino-americana de
Juízes para a Democracia.
O ex-governador Cláudio
Lembo, fiel participante da
missa, disse que o Brasil é um
país multicultural e multirreligioso. "O Estado laico pode receber qualquer religião. Deus
nos livre de fundamentalistas."
Representando o governador
José Serra (PSDB), o secretário
estadual da Justiça, Luiz Antonio Marrey, lembrou que o fundamental é garantir que o Estado não assuma religião nem
que decisões sejam baseadas na
fé. "Não podemos esquecer que
até hoje o Supremo Tribunal
Federal mantém o crucifixo
nos tribunais."
No fim, foi servido um café da
manhã. Havia salgadinhos, sucos, doces e pães, além de chá,
café e leite. A entrada era controlada por policiais militares e
por um esquema de segurança
da organização e do cerimonial
do Tribunal de Justiça. O evento foi pago pelos juízes, disse a
organização. Os convidados
contaram que ofícios foram enviados aos juízes por meio da
estrutura do Judiciário, solicitando, inclusive, a indicação de
funcionários para a missa.
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