|
Próximo Texto | Índice
Polícia do Rio mata 41 civis para cada policial morto
Proporção registrada na gestão Cabral é quatro vezes maior que a média internacional
Para especialistas, mortes demonstram uso excessivo de força e revelam fortes indícios de assassinatos pelas forças oficiais
RAPHAEL GOMIDE
DA SUCURSAL DO RIO
Morre um policial do Rio para cada grupo de 41 pessoas
mortas pelas forças de segurança do Estado. A proporção é o
quádruplo da média internacional, segundo estudo do professor da Universidade de Nova
York, Paul Chevigny, adotado
internacionalmente.
Foram dez PMs e um civil
mortos em confronto em 2007
até abril, contra 449 supostos
criminosos que agentes mataram até o fim de abril, em ações
registradas como "autos de resistência". O número de policiais representa 2,4% do total
de baixas "adversas".
A Secretaria de Segurança
Pública do Rio diz reconhecer
que o número de mortos em
confrontos com policiais é alto
e que o saldo decorre de uma
postura "mais ativa" adotada
pelo governo.
Para especialistas consultados pela Folha, a proporção de
um policial morto para 41 autos de resistência, no governo
Sérgio Cabral, é demonstração
de uso excessivo de força e revela fortes indícios de assassinatos pelas forças oficiais.
"Quando passa da taxa de
dez civis mortos para um policial e, principalmente, acima
de 20 para um, não há dúvidas
de que há excesso de força e
execuções", diz José Vicente da
Silva Filho, coronel da reserva
da PM, ex-secretário nacional
de Segurança Pública e diretor
do Instituto Pró-Polícia.
Silva Filho observou que em
São Paulo a relação era de 11
mortos por policial, em 2005, e
de 14 para um, em 2006, ano
dos ataques da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da
Capital). Mesmo em 2006, a
proporção manteve-se inferior
à metade daquela do Rio.
Em 2006, o aparato policial
do Rio respondeu por 1.063
mortes, 14% do total de vítimas
de violência letal intencional
(homicídios dolosos, latrocínios e autos de resistência). "É
um escândalo. As mortes oficiais de policiais em ação correspondem a 14%. E policiais
matam mais em folga que em
serviço", disse Silvia Ramos, do
Cesec (Centro de Estudos de
Segurança e Cidadania, da Universidade Candido Mendes).
Segundo o Cesec, os índices
internacionalmente "tolerados" são de 1% a 3%, no máximo; ou seja, no máximo de um
quarto daqueles do Rio.
Para Silvia Ramos, "o caso
[de uso de força excessiva pela
polícia] do Rio é não apenas o
mais grave do Brasil, como o
mais grave do mundo. Só a polícia do Rio mata mais que a polícia dos EUA inteira, que matou 375 em 2006, em uma população de 300 milhões de pessoas. A polícia de Portugal, país
com população semelhante à
do Rio, matou só uma pessoa
em 2006, contra 1.063 do Rio."
A média de pessoas mortas
pela polícia no governo Sérgio
Cabral até abril é de 3,7 por dia
(449 em 120 dias).
Os autos de resistência em
2007 são, portanto, 36,4% superiores ao do ano passado, até
abril, quando 329 civis haviam
sido mortos em confronto.
Projeção feita pelo sociólogo
Ignácio Cano, a pedido da Folha, prevê que as polícias fluminenses devem matar 1.448 pessoas em 2007, tendo como base
a proporção dos primeiros quatro meses nos últimos nove
anos (31% do total).
O número seria 21% superior
ao mais alto até hoje: 1.195, em
2003, e 36% maior que os autos
de resistência do ano passado.
Um problema maior para Silva Filho é que "a autoridade
não toma medidas" contra isso.
Essa atitude oficial tem conseqüências, diz: criminosos
deixam de se render temendo
ser mortos -o que acirra os tiroteios e até assassinatos de policiais na rua, como vingança.
"Polícia não é para matar",
diz Silvia Ramos.
Próximo Texto: Frase Índice
|