São Paulo, segunda-feira, 16 de agosto de 2010

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Pais barram filho deficiente na escola

Principal razão para não incluir criança na rede comum é crença de que ela não conseguirá aprender, diz pesquisa

Levantamento do governo federal foi feito com famílias pobres que recebem ajuda para gastos com deficiente


Silvia Zamboni/Folha press
O garoto Kaio, que tem problemas de locomoção e de fala; após ser aceito em uma escola pública em SP, menino ficou "todo animado", conta seu pai

ANTÔNIO GOIS
DO RIO
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO

As barreiras que dificultam a inclusão de crianças com deficiência em escolas comuns não são apenas físicas. Muitas vezes, elas começam na própria casa.
Foi o que detectou pesquisa do Ministério do Desenvolvimento Social com 190 mil famílias que recebem o Benefício de Prestação Continuada, por terem em casa criança ou jovem com deficiência, física ou intelectual.
O estudo mostrou que a maioria (53%) das famílias cujas crianças não estavam na escola apontou como razão o fato de considerar que os filhos não tinham condições de aprender.
O benefício, previsto na Constituição, é pago apenas a famílias com renda per capita inferior a R$ 127,50 (um quarto do salário mínimo).
A coordenadora-geral de acompanhamento dos beneficiários, Elyria Credidio, diz que é preciso considerar que essas famílias investigadas na pesquisa vivem em situação de pobreza, antes de acusá-las de preconceito.
"São pessoas que, muitas vezes, já tentaram acesso ao posto de saúde ou a uma escola, mas não foram bem atendidas e não estão conscientes a respeito dos seus direitos. Ainda estamos em processo de transição para uma educação inclusiva para todos", afirma Elyria.
Para Teresa Costa d'Amaral, superintendente do IBDD (Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência), o sentimento de descrédito em relação aos filhos deficientes é retrato do que a sociedade acredita.
"Também tem em casa um sentimento de proteção, que é um fator de exclusão. Mas é explicável. A inoperância do Estado brasileiro com as pessoas com deficiência é grande. O Estado se omite em todos os níveis. É explicável que o pai prefira que o filho fique em casa, protegido."

AVANÇOS
A procuradora da República em São Paulo Eugênia Fávero destaca avanços recentes na política de inclusão, como aumento do financiamento federal a escolas que atendem deficientes em classes comuns. Ela diz, porém, que ainda não há entendimento geral de que é direito dessas crianças estudar com as demais na mesma sala.
No entender dela, o direito da criança se sobrepõe inclusive ao dos pais de escolher se preferem atendimento exclusivamente em escolas especiais, posicionamento com o qual nem todas as associações que representam deficientes concordam.
Eugênia lembra que as dificuldades para matricular essas crianças em escolas regulares não se restringem a famílias de baixa renda.
Dados do Censo Escolar do MEC reforçam o argumento. Enquanto em escolas públicas o percentual desses alunos na mesma sala que os demais chega a 70%, na rede privada, o percentual de incluídos é de apenas 8%.
"Ainda é comum as escolas, principalmente as particulares, quererem escolher a clientela que atenderão, usando o argumento de que não estão preparadas para receber alunos com deficiência", diz a procuradora.
Teresa, do IBDD, concorda: "O Brasil não aprendeu a acreditar no potencial das crianças com deficiência. Imagine se a nossa sociedade daria crédito a ensinar alguma coisa ao Stephen Hawking [físico inglês com esclerose lateral amiotrófica]?".


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