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VERÃO
Praia isolada e de difícil acesso recebe 200 carros por dia na alta temporada, segundo a direção de parque estadual
Ilhabela quer restringir visitas a Castelhanos
JOSÉ ERNESTO CREDENDIO
ENVIADO ESPECIAL A ILHABELA
Vendedores ambulantes, guarda-sóis com propaganda de cartões de crédito, veículos na areia e
até um restaurante que já figura
em um guia de turismo, comuns
no costa brasileira, revelam: os 22
quilômetros de estrada precária
que separam Castelhanos do centro em Ilhabela (SP) não impediram que a praia de mais difícil
acesso por terra no litoral norte
paulista perdesse o charme do
isolamento.
O único bar ganhou sete concorrentes, três restaurantes disputam os turistas -a maioria, endinheirados com veículos off-road e
tração nas quatro rodas, quase
obrigatória para vencer a estrada,
que corta a serra, é perigosa e
cheia de curvas; ainda é preciso
cruzar um rio.
Quando a guarita da entrada do
Parque Estadual de Ilhabela começou a contar os veículos que
iam para lá, uma surpresa: são
cerca de 200 por dia na temporada, levando uma média de mil
pessoas a Castelhanos, que não
tem energia elétrica, água tratada,
esgoto nem banheiros públicos.
É uma faixa de areia com cerca
de 1.500 metros de águas claras livres de poluição cercada por uma
barreira de mata atlântica -não
há sinal de civilização por ali-, a
famosa cachoeira do Gato e sem
criminalidade.
Mas há uma desproporção entre as condições da praia e o salto
do público, diz Marilia Brito Rodrigues Moraes, que dirige o parque. Em fevereiro, o conselho que
gere o parque vai colocar em consulta pública a proposta de criar
cotas diárias de acesso a Castelhanos pela estrada, restringindo o
número de turistas. Seria inédito
no litoral norte paulista.
""Sabemos que é polêmico, mas
a visitação está além da capacidade de Castelhanos, que pode ser
descaracterizada", diz.
Para implementar a proposta,
que seria incluída em um pacote
de ações, o Parque Estadual de
Ilhabela conta com financiamento do BID (Banco Interamericano
de Desenvolvimento), que vai
bancar planos para seis unidades
de conservação no país.
Público novo
As atrações de Castelhanos conquistaram a família Coser -o casal Claudio, 47, e Ana, 41, e a filha
Gabriela, 19-, que conhece quase o país todo. ""Estivemos aqui há
12 ou 13 anos. Mudou tudo, há
muito mais gente", diz o empresário paulistano Claudio. ""Tem
um charme muito especial", avalia Ana, que faz uma crítica velada
ao excesso de gente na praia.
""Não havia esse pessoal."
Outro casal, o comerciante Carlos Eduardo Amaral Gurgel, 40, e
a pedagoga Mara Sanvidotti, 41,
donos de uma pick-up Land Rover, pela primeira vez na praia, se
encaixa entre os que foram para lá
em busca de isolamento. ""Aqui é
totalmente calmo, tem esse contato com a mata", diz Gurgel.
A superpopulação do lado ""civilizado" da ilha e a poluição das
praias do canal de São Sebastião
empurrou esse público para Castelhanos, resume o caiçara Ricardo Azevedo, 25, dono de restaurante na praia. O restaurante, diz,
recebe até 200 pessoas por dia.
""Hoje está fraco, o pessoal vem
mais no meio da semana", lamentava-se, no sábado.
É que o acesso a Ilhabela também ficou muito mais fácil e rápido. ""Eu cheguei a passar a noite
inteira na fila da balsa [que liga o
continente a Ilhabela]", lembra a
administradora paulistana Elisabeth Frias, que está lá com filha
Bluma Frias Varella, 21.
Os números da Dersa, que administra a balsa, mostram que o
acesso à ilha subiu de 95.489 veículos, em dezembro de 1999, para
114.612 em 2003, com queda para
107.612 no ano passado, que teve
o Réveillon em um sábado. O movimento deste mês já é 2,77% superior ao do ano passado.
Numa conta grosseira -há carros que vão e voltam-, esse salto
entre 99 e 2003 representaria, na
média de três ocupantes por veículo, cerca de 27 mil pessoas a
mais, quase a população de Ilhabela, de cerca de 24 mil habitantes. Uma das causas é que, enquanto antes havia demora de algumas horas na fila, hoje o tempo
é muito menor porque há seis balsas operando para carros. Além
disso, há mais duas lanchas para
passageiros, o que aumenta o número de visitantes.
""Acho que pode barrar pessoas,
sim", opina Elisabeth Frias, que é
dona de uma casa na ilha. E se
acontecer com você: "Volto outro
dia", responde.
Para o presidente da Associação
dos Jipeiros, Fernando Rodrigues
Mendes, criar cotas é bem-vindo,
mas deve ser discutido. ""Tem
gente que vai reclamar", prevê.
Risco
Mesmo para motoristas experientes e com veículos apropriados, a estrada é perigosa. A reportagem da Folha estava minutos
atrás de uma picape, com dez passageiros, sendo duas crianças, que
sofreu um acidente no sábado.
O veículo perdeu os freios na
serra, voltou dez metros de ré e,
por sorte e perícia do motorista,
parou no barranco. Em outro local, poderia ter despencado dezenas de metros, provocando uma
tragédia, já que o socorro médico
demoraria pelo menos uma hora.
O jipeiro Davi, que conduziu a
reportagem da Folha até a praia,
conta outras histórias. ""O motorista de uma Land Rover foi dar
passagem a um carro, mas a roda
caiu em um buraco. O carro virou
uma lata, e ele ficou tetraplégico."
No Carnaval do ano passado, as
condições da estrada ilharam 37
veículos na praia. Apesar do risco,
há carros de passeio na estrada.
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