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Receita barra imposto maior para cigarro
Projeto de forte aumento no preço dos maços é defendido pelo Ministério da Saúde como forma de reduzir o consumo
No país, enquanto o Instituto Nacional de Câncer quer o maço a cerca de R$ 5, a Receita defende um valor bem menor -de R$ 1,74
MARIO CESAR CARVALHO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA
O projeto do Ministério da
Saúde de aumentar o preço do
cigarro para reduzir o consumo
bateu numa barreira. A Receita
Federal não quer abrir mão de
seu papel de criador da política
tributária. A Receita acredita
que um aumento forte de preços, da ordem de 100%, por
exemplo, elevaria ainda mais o
mercado ilícito de cigarros.
Há um abismo a separar os
preços que a Receita e a área de
saúde querem. Enquanto o Inca (Instituto Nacional de Câncer) quer o maço a R$ 4, R$ 5, a
Receita defende um valor bem
menor -R$ 1,74.
No ano passado, o Brasil consumiu cerca de 150 milhões de
cigarros. Cerca de 40% desse
volume não pagou impostos: 39
milhões foram cigarros contrabandeados e 20 milhões foram
produzidos por empresas brasileiras que não pagam impostos, segundo a Receita.
Aumento de preços é a forma
mais simples e eficaz de reduzir
o consumo, segundo a OMS
(Organização Mundial da Saúde). Uma elevação de 10% nos
preços provoca uma queda de
8% no consumo em países como o Brasil, segundo o órgão.
As doenças relacionadas ao
fumo matam cerca de 200 mil
pessoas por ano no Brasil, segundo o Ministério da Saúde. O
número equivale a quatro vezes
as vítimas de homicídio.
O preço de cigarro no Brasil é
um dos mais baratos do mundo. O preço do Marlboro brasileiro em 2001 era o segundo
mais barato do mundo num levantamento feito em 87 países
e territórios pela Economist
Intelligence Unit. Custava o
equivalente a US$ 1,23. Só perdia para a Indonésia: US$ 1,08.
Até no Mercosul o preço do
cigarro brasileiro está na rabeira da tabela, segundo estudo
feito pelo economista Roberto
Iglesias para o Banco Mundial.
Só Paraguai e Bolívia têm preços mais baixos. Em 2005, um
maço de uma marca popular no
Brasil custava o equivalente a
US$ 0,78. No Chile, valia US$
1,42. No Paraguai e na Bolívia,
custavam US$ 0,61 e US$ 0,33.
O preço baixo do cigarro é
conseqüência da redução de
impostos a partir de 2000, segundo Iglesias. A redução ocorreu no mesmo momento em
que o então ministro da Saúde,
José Serra, impunha restrições
ao fumo no país. Em 1999, o IPI
(Imposto sobre Produtos Industrializados) equivalia a
42,5% do preço do maço. Em
2007, representava de 20% a
25% desse valor.
A Receita reduziu o IPI do cigarro com o objetivo de combater o contrabando, que à época
correspondia a 37% do mercado. Atualmente, o contrabando
caiu para cerca de 25%, mas a
ilegalidade é até maior do que
em 1999. Cerca de 18% dos cigarros produzidos no país não
pagam impostos, diz a Receita.
Liminares
As fábricas funcionam com
liminares da Justiça. A soma do
contrabando e dos que são acusados de sonegação atinge 40%
-três pontos percentuais acima do índice que a Receita pretendia abaixar com a redução
dos impostos.
"O Brasil foi o único país do
mundo que conheço a baixar
impostos de cigarros e a redução não serviu para combater a
ilegalidade", diz Iglesias, professor de economia da PUC-RJ.
Estudo feito pela Fipecafi,
fundação formada por professores da USP de contabilidade,
estima que o país perdeu R$ 18
bilhões com a redução do IPI
entre 2000 e 2007. Nesse período, segundo Iglesias, o imposto foi corrigido sempre
abaixo da inflação.
A própria Receita defende
mudanças no atual sistema de
tributação. O principal problema hoje na visão da Receita são
as fábricas que não recolhem
impostos. São as que mais crescem. Elas respondem por 18%
da produção nacional.
São essas empresas que produzem marcas que são vendidas a R$ 0,68 -"uma confissão
de sonegação", diz Marcelo
Fisch, coordenador da Receita.
Saúde
Esse valor é visto com ceticismo na área da Saúde. "R$ 1,74
não faz nem cócegas no bolso
do consumidor. É um preço
muito baixo num cenário econômico em que o consumo está
aumentando. É preciso um preço que desestimule o consumo
de cigarro", diz Tânia Cavalcanti, chefe da divisão de controle de tabagismo do Inca.
Paula Johns, da ACT (Aliança de Controle ao Tabagismo),
diz que o argumento da Receita
de que o aumento de preço estimula o contrabando é um mito.
"Em nenhum país foi comprovada essa relação."
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